A humanidade, apesar de sua heterogeneidade, tende a repetir padrões comportamentais que, muitas vezes irrefletidos e imponderados, dificultam consideravelmente a concepção abrangente e, sobretudo, transcendente da existência. Nesse sentido, tornam-se importantíssimos o estabelecimento e a promoção de uma reflexão espiritualizada sobre a conciliação, que deve ter início na intimidade de cada um, para dali irradiar-se pelos relacionamentos em todos os níveis e por todos os setores da vida.
É nítida a percepção de que a sociedade contemporânea carece de referenciais. A ausência de um sentido na vida é experimentada por um número crescente de pessoas de todos os níveis culturais, sociais e econômicos, bem como dos mais distintos matizes ideológicos.
No sentido espiritual, conciliação e maturidade psíquica são conceitos estreitamente relacionados. A consonância, a concórdia e a coerência se fundamentam no encontro da pessoa consigo mesma, com sua autêntica e original essência. A consciência de sua natureza espiritual torna claros os princípios ético-morais, que representam a base da estabilidade emocional.
A maturidade psíquica, tão relevante para o enfrentamento dos desafios cotidianos, reflete invariavelmente uma condição de harmonia interior, de conciliação íntima, de reconhecimento dos próprios valores e limitações. Nesse estado, o ser humano, ora amadurecido e sereno, deixa registrado na família, na sociedade e em quaisquer meios por que transite, com seu exemplo de vida, uma marca de originalidade e dignidade. Em vez de orientar-se por trapaças e equívocos ou combater as particularidades, ideologias ou posturas de quem quer que seja, consumindo, assim, sua energia anímica, a pessoa tem sua autoestima e seus laços afetivos reforçados.
Fazemos as pazes com nós mesmos – e, por extensão, com nossos semelhantes – quando nos permitimos a abertura para a transcendência, quando nos tornamos permeáveis à espiritualidade que tudo sustenta e a que tudo dá sentido. Nessa trajetória rumo à conquista da paz interior, deparamo-nos com inúmeras inquietações e desafios que, em certa medida, são inevitáveis e mesmo necessários.
O ser humano, contudo, conta com seus atributos, sua força de vontade e sua capacidade de superação para que essas inquietações não se tornem doentias, afastando-o do convívio enriquecedor com amigos e familiares ou mesmo bloqueando-lhe a criatividade, a afetividade e a generosidade, fatores indispensáveis para a estruturação de uma personalidade ética e íntegra.
A reflexão honesta e profunda, espiritualizada e abrangente – repitamos – é condição indispensável para o apaziguamento de pensamentos e sentimentos porventura inadequados, sem a qual a pessoa, no dinamismo da vida, facilmente se deixará manipular, em flagrante anulação de sua própria personalidade.
Na verdade, a saúde psíquica do ser humano se revela em sua capacidade de relacionar-se, primeiramente consigo mesmo, depois com seu próximo. Se uma pessoa não tem amigos, se não é capaz de estabelecer vínculos sadios e afetivos com seus semelhantes, surge, então, um indicativo preocupante. A fim de contorná-lo, deverá articular melhor seus pontos de vista, rever seus posicionamentos e atitudes, buscar uma nova orientação e permitir que as situações que vivencia lhe ofereçam outra compreensão de si mesmo. A paz interior, decorrente da conciliação pessoal, interpessoal e circunstancial, convida ao reexame das angústias, dos sentimentos aflitivos e dos pensamentos inoportunos.
A compreensão da espiritualidade, na visão racionalista cristã, não está ligada a rituais ou a gurus, a sistemas ou modelos, tem como principal objetivo que as pessoas se tornem íntegras e saudáveis, felizes e realizadas. O conhecimento da espiritualidade tem o excelso valor de mostrar que o ser humano não deve se enfraquecer diante das dificuldades de relacionamento, precisamente porque sua essência, que ultrapassa as perspectivas temporais e históricas, permite-lhe a superação desse desafio. Tal realidade se impõe sustentada pela força incontestável do sentimento de amor ao próximo, que é, por sua vez, o fundamento de uma experiência de vida produtiva e próspera.
Assim sendo, todos devem dar o importante passo que consiste, sem dúvida, na reconciliação com a vida, no abandono das hostilidades internas e externas e na abertura para a espiritualidade. Com essa atitude nobre e engrandecedora de humildade e consciência de conjunto, o ser humano se desprende das amarras da fragilidade excessiva, do saudosismo inveterado, do excesso de autocomplacência, assumindo o protagonismo de sua própria vida.
Muito Obrigado!