O benfazejo hábito da escrita

Historicamente em nossas reflexões procuramos sempre incentivar a prática da leitura, mormente de textos filosófico-espiritualistas e de essência moral, que suscitem sérias reflexões e aprendizados frutuosos capazes de promover, por seu turno, o aperfeiçoamento humano. Todavia, houvemos por bem, na presente reflexão, na esteira do itinerário de aperfeiçoamento intelectual que marca os estudos que empreendemos, valorizar e estimular o benfazejo hábito da escrita e analisá-lo à luz da espiritualidade que nos proporciona o Racionalismo Cristão.

Escrever e registrar impressões e experiências é, muitas vezes, uma atitude de salutar recolhimento e de silêncio interior, que auxilia eficazmente na absorção e na retenção de conteúdos práticos e úteis ao espírito. Mais do que isso, o ato de escrever leva a pessoa a meditar os assuntos que estuda por uma perspectiva muito diferente daquela de quando apenas passivamente lê uma obra de interesse. A consequência que o pensamento particular tem sobre a mente de quem escreve é incrivelmente diverso do efeito que caracteriza uma leitura convencional e automática.

Na escrita instrutiva, esclarecedora e prazerosa a que fazemos referência na presente reflexão, não deve o estudioso do Racionalismo Cristão nutrir preocupações excessivas com o estilo ou com as singularidades das regras gramaticais, tendo em vista que se trata de um processo espontâneo e não profissional, que busca enraizar na mente de quem escreve princípios e conceitos de alto valor ético, moral e espiritual. Assim, ao ler e ao escrever, ou seja, ao sintetizar e gravar as palavras com as quais se identifica, a pessoa avança de maneira considerável e segura no conhecimento dos fatos e no conhecimento de si mesma – nisso consiste, em última análise, o objetivo do estudo da espiritualidade.

Pela escrita, é possível fixar cenas inesquecíveis e momentos únicos da vida, situações que, por trazer importantes aprendizados e carregar uma alta significação na existência pessoal, merecem ficar registradas como fonte de estímulo e fortalecimento. A autoridade de um registro de elevada moral sempre há de chamar positivamente a atenção das novas gerações; trata-se, portanto, de uma atividade que prolonga seus efeitos no tempo. Há pessoas que passam por superações tão importantes apoiadas nos ideais positivos que nutrem, que devem se perguntar: “Por que não registrar tais eventos?” Sem dúvida, é muito melhor escrever a história pessoal, com veracidade e sem exageros, que andar à cata de histórias alheias, esquecendo-se das alegrias dos próprios triunfos.

Mergulhar na dinâmica da palavra escrita favorece o amadurecimento espiritual. Igualmente, deve-se ter em mente que, além de saber falar de forma adequada e pausada, é preciso saber ouvir o semelhante com atenção e respeito, a fim de alimentarmos uma sã sabedoria. Registrar por escrito sínteses e trechos de textos e de experiências também traduz uma iniciativa saudável. Para bem escrever, é preciso discernimento, e para ter discernimento, é preciso ler e compreender a essência de obras de alto valor espiritual. A leitura e a escrita, portanto, constituem um excelente círculo virtuoso que acelera a trajetória evolutiva do ser humano.

A vontade de escrever deve ser acompanhada de disciplina, organização do ambiente e método. Esse conjunto harmonioso de circunstâncias permitem o desenvolvimento da criatividade, destacado atributo espiritual sem o qual a escrita se ressente de espontaneidade, cor e beleza. Não há dúvida de que a erudição advém da leitura de importantes e clássicas obras, mas erudição não é sinônimo de espiritualidade. Desenvolve mui eficazmente a espiritualidade a pessoa que aprende a ler diretamente no livro da vida as magníficas lições que esta não cessa de oferecer, desenvolvendo pensamentos autênticos baseados em sua interpretação dos fatos.

Procuramos desdobrar, ao longo desta reflexão, inúmeros aspectos a respeito da escrita, aqui analisada à luz da espiritualidade que nos proporciona o Racionalismo Cristão e como instrumento de desenvolvimento espiritual e de consolidação de conceitos. Registrar as relevantes interpretações que brotam da experiência de aprendizado contínuo a que todos estão sujeitos, no contexto das múltiplas situações diárias, é gravar os elementos vivos oriundos do sistema dos pensamentos que acalentamos, estabelecendo com eles uma conexão que reforça ideias, convicções e princípios. Não nos esqueçamos: ler boas obras e escrever sínteses e experiências estimulantes é um eficaz e prazeroso instrumento de ampliação dos atributos e faculdades espirituais, que fornece à vida um tom de originalidade e de autenticidade, capaz de fortalecer substancialmente o espírito.