Muita tristeza quando A Razão teve que fechar

Foi há muito tempo. Vítima de um mau administrador, A Razão, jornal fundado por Luiz de Mattos e Luiz Thomaz para divulgar os princípios do Racionalismo Cristão e que chegou a disputar espaço entre congêneres, teve que parar de circular. As circunstâncias desse desagradável episódio são detalhados pelo escritor Galdino de Andrade, no capítulo 22 de seu livro Antonio Cottas, uma lição de vida.

Aqui vai um resumo do capítulo: Conquanto Luiz de Mattos tenha sido versado em psicologia se deixou enganar pela falsa aparência de pessoas sem escrúpulo. Por causa disso, teve prejuízos e sofreu desilusões, padeceu injustiças e foi vítima de traições, defrontando-se com sérias dificuldades, que lhe causaram inenarráveis sofrimentos; não por si, mas pela causa que defendia.

Exemplo disso é o que se deu com ele, em consequência da infeliz contratação de um jornalista para gerir os negócios de A Razão, periódico recém-criado. Terrível o engano em que Luiz de Mattos laborou, lastimável o engodo em que caiu.

Entretanto, o publicista recomendado não passava de um patife a quem não se podia confiar um centavo; investido na gerência de A Razão, acabou levando este prestigioso matutino à falência, em razão das falcatruas praticadas pela incontida ganância que o biltre tinha do bem alheio.

Apesar de estarem sendo roubados, os diretores de A Razão só vieram a tomar tento disso mais tarde, quando a folha já se encontrava em ruína econômico-financeira, posto que estivesse, por paradoxal que parecesse, em franca prosperidade.

E não poderia ser diferente, já que o jornal tinha grande rendimento, pois faturava as melhores publicidades que os veículos de comunicação poderiam captar naquela época. Isso, sem falar da renda auferida com a vendagem do jornal, cuja edição se esgotava todos os dias, não obstante a sua grande tiragem. Isso porque, assim que começou a circular, A Razão, adquiriu nomeada pelo jornalismo escolar que fazia.

A inusitada insolvência da empresa foi facilmente explicada: o rendimento dela era excelente, mas vinha sendo surrupiado pelo espertalhão, que, pouco tempo depois tornou-se fazendeiro no estado do Rio de Janeiro e titular de polpudas contas bancárias, além de figurar nos livros contábeis de A Razão como credor de significativa importância por “fornecimento de dinheiro” à folha que gerenciava.

Como se tudo isso não bastasse para arruinar o patrimônio do jornal, a diretoria descobriu que A Razão estava devendo a outros credores mais de 150 contos, e que a sua receita era diminuída, astuciosamente. A falcatrua foi descoberta serodiamente, quando Inês já era morta, no dizer camoniano.

Ao tomar tento da verdadeira situação econômico-financeira do jornal, e depois de averiguar bem as coisas, a sua diretoria não teve alternativa senão suspender a circulação do periódico. Isso, para evitar-se um mal maior, o que foi muito doloroso para todos, inclusive para Antonio Cottas, cuja vontade era o querer de Luiz de Mattos, a quem ele não tinha como sogro, mas como pai, tal a afeição que lhes marcava o relacionamento.

Naquele fatídico dia para o periodismo nacional, Luiz de Mattos, Luiz Thomaz e Antonio Cottas viram esvaírem-se as esperanças que os alentavam em seus projetos doutrinários, visto que perdiam o veículo mais eficiente com que contavam para o esclarecimento da humanidade. A falência do jornal causou grandes danos à saúde de Luiz de Mattos, podendo-se dizer que o óbito dele se deu, efetivamente, na manhã de 15 de janeiro de 1926, mas ele começou a morrer com o falimento de seu jornal em 1922.

Naquela hora difícil para os empreendedores do jornalismo educativo e esclarecedor, as lágrimas de Antonio Cottas se agregaram às de Luiz de Mattos, com uma identidade só explicável pelo sentimento afim de duas almas irmanadas pelo bem-querer.

E não poderia ser de outro modo, uma vez que os seus ideais eram convergentes; as vontades deles se conformavam uma com a outra, num só querer; a proximidade deles era grande, de modo a confluírem na amizade, pois eram animados pelo mesmo propósito.

Seja como for, a verdade é que, naquele desditoso momento, o genro e o sogro não contiveram o pranto, e num abraço solidário Luiz de Mattos banhava de lágrimas o rosto de Antonio Cottas, e as deste, que era de menor estatura, rolavam no peito do infortunado fundador de A Razão.

Para esses desprendidos homens de ideias convergentes, os prejuízos materiais causados pelo fechamento do jornal eram menores do que a falta que ele faria para a divulgação da Filosofia, em virtude da qual A Razão foi fundada por recomendação astral, da qual fora porta-voz o padre Fonseca (espírito superior), para ser mais preciso. Com efeito, o hábil comunicador de massa chorava porque não tinha mais como levar suas esclarecedoras palavras aos rincões do Norte, às plagas do Sul e às serranias do Centro, no dizer de Antonio Cottas, um dos paladinos da grande causa.

A descontinuidade de A Razão frustrou as mais risonhas esperanças jornalísticas de seus fundadores, mas ainda assim agiram com exemplar correção, cumprindo as obrigações decorrentes da ação desonesta do indigno preposto… Assim, a inesperada e doída paralisação do iluminado matutino não causou prejuízo a ninguém. Isso, porque seus diretores honraram os compromissos financeiros firmados pelo tal, no “interesse do jornal”, pagando tudo, até o último tostão devido.

Ao cabo de tudo restou aos pósteros a leitura de um mensário, que vem dando o recado dos Luízes e de Antonio, mas de maneira limitada: tanto na periodicidade, quanto na tiragem. Contudo, a circulação diária de A Razão é uma questão de tempo, até porque os lastros morais e históricos do matutino ficaram intactos, aguardando oportunidade para ele voltar a ser o que foi no passado. E para que este paciente exercício de futurologia se torne exitoso, imperativo é que se atente para o magistral ensinamento deixado pelo sofrido Luiz de Mattos, quando disse que: “Saber esperar é encarar as dificuldades com a calma de quem tem a certeza de que a maturidade não dá saltos e de que o ser humano [principalmente do tipo ingrato do jornalista que provocou o fechamento de A Razão] é causa de todos os males, não se remodela, nem mesmo em séculos de existência.

Saber esperar é o indivíduo contar consigo próprio, com a sua vontade fortemente educada para o bem, e estar preparado para todas as lutas a que é obrigado na Terra, onde tem de viver rodeado de seres remodeláveis somente em muitas existências físicas.