O vínculo que liga o ser humano espiritualmente esclarecido ao sentimento de amor ao próximo e ao respeito à amizade é tão forte que, mesmo nas atitudes mais simples da vida cotidiana, esse elo não se deixa de reforçar, à medida que a pessoa exterioriza no meio em que convive uma conduta generosa, receptiva e fraterna.
Assim, queremos fazer uma eloquente exaltação da amizade sincera, aquela que se fundamenta no amor. As informações e subsídios que aqui reunimos sinteticamente têm por objetivo auxiliar os estudiosos do Racionalismo Cristão em sua abertura à amplitude da convivência fraterna, a fim de que esta seja mais valorizada entre nós como um fator que habilita o amadurecimento espiritual, permitindo a construção de uma sociedade livre, forte e menos egoísta.
Uma das expressões mais marcantes da atualidade é a forte tendência ao individualismo. Tal caracterização da sociedade atual não deixa de impressionar: representa uma retorção total do sentimento de amizade – ideal de virtude e elevação –, cuja beleza atrai aqueles que se abrem para a espiritualidade.
Ao deixar de reconhecer o semelhante como uma extensão de si mesmo, o ser humano egoísta não percebe a necessidade do auxílio mútuo e da solidariedade no campo das relações humanas. Ao afastar-se do outro, negando-lhe auxílio e amparo, a pessoa compromete o metabolismo da alma, experimentando um duplo prejuízo: em primeiro lugar, priva-se de desenvolver a enriquecedora virtude da abnegação; em segundo lugar, vivencia uma perda angustiante de sentido da vida, pois age em posição contrária à razão, à moral e à ética, que a impelem constantemente a relacionar-se, socializar-se e criar vínculos de cooperação e amizade. Sem dúvida, há uma reserva de afeto em todo ser humano, e este sente-se frustrado e infeliz ao bloqueá-la.
Desenvolver o hábito de dar importância ao diálogo constitui um mecanismo fundamental para consolidar laços de amizade e consideração. No que diz respeito a relacionamentos mais próximos, o modo de formular questões, a sinceridade, o momento propício, o tom de voz e o tipo de abordagem são fatores determinantes para a eficácia da comunicação e para a conservação de uma relação feliz. Devemos admitir que, para que o diálogo seja frutífero, é importante que se tenha algo a comunicar, e isso requer um conteúdo interior que se obtém por meio de uma vivência fundamentada em princípios racionalistas cristãos, que enobrecem e dignificam todas as manifestações humanas.
Não permitamos que nada nos impeça, enquanto estudiosos do Racionalismo Cristão, de viver e crescer na amizade com nossos semelhantes. A amizade entre duas pessoas que se consideram permite, não raro, que cada uma possa entender melhor a si própria. Não somos limitados nos mesmos pontos; assim, na relação de amizade, cada um poderá, espontaneamente, suprir e completar o outro. Nesse sentido, Kant afirma: “A amizade é a união de duas pessoas por amor e respeito igualmente recíprocos… é uma união puramente moral que não visa vantagens recíprocas.”
Há que ressaltar também que nem sempre aquele que é dócil e compreensivo conosco é nosso amigo, nem o que nos machuca, nosso inimigo. Diz Agostinho de Hipona: “São melhores as feridas causadas por um amigo que os falsos beijos de um inimigo. É melhor amar com severidade a enganar com suavidade.”
Sem dúvida, em todo relacionamento humano podem surgir rupturas, donde sobrevém o distanciamento, mas a tendência é que tudo volte à normalidade, ao equilíbrio. A amizade verdadeira suplanta os desentendimentos e as divergências; cria elos, e não barreiras.
A amizade é uma experiência sublime; sua existência na vida de um ser humano é uma necessidade imperiosa. Por isso disse Cícero que a amizade é a ação que melhor distingue o ser humano dos outros seres. O amigo é um companheiro, cuja presença nos impulsiona e torna qualquer dificuldade mais possível de ser superada. Com bons amigos ao nosso lado tudo, se torna mais suave.
Com certeza, uma verdadeira amizade se constrói fundamentada em muita confiança, consideração e lealdade, e por isso mesmo é imenso o número de notáveis autores – clássicos e contemporâneos – que a distinguem como uma das mais expressivas formas de amor. Não haja dúvida de que se trata de um valor extremamente necessário à vida. Mesmo que o ser humano possua grande número de propriedades, fortuna, saúde, poder, ainda assim tal conjunto de fatores não será suficiente para sua realização integral se lhe faltar a primordial, imprescindível e transcendente amizade. Ter amigos, portanto, é essencial, meus amigos!
Muito Obrigado!