A prudência é uma virtude? Representa uma atitude desejável? Nem sempre. É uma virtude e uma atitude desejável quando utilizada para reter impulsos inadequados, sabotadores e egoísticos, que produzem consequências prejudiciais ao aprimoramento do espírito. Deixa, contudo, de ser virtude quando é manejada de maneira artificial com vistas à obtenção de benefícios próprios, quando o indivíduo, calculada e estudadamente, se vale de um comportamento calmo e comedido com fins ilícitos e segundas intenções. Procuraremos desdobrar essa interessante questão, no transcurso da presente reflexão, à luz dos ensinamentos do Racionalismo Cristão.
Ao afirmar que a prudência nem sempre é uma virtude, não pretendemos negar-lhe de algum modo o valor, mas ressaltar que este só alcança a plenitude quando se reveste de espiritualidade. Prestar a atenção no teor dos pensamentos acalentados e nas palavras mencionadas e não se entregar a diálogos improdutivos, filtrando os interesses e as curiosidades com o crivo do bom senso e da racionalidade, são atitudes objetivas que impregnam a prudência de valor e energia.
Uma vez reconhecido o autêntico sentido em que se deve cultivar a prudência, torna-se necessário, a nosso ver, abordar uma questão pungente em nossos dias: a curiosidade exagerada. Claro está que a vontade de conhecer fatos novos e absorver conhecimentos múltiplos é saudável e meritória; contudo, a angústia de querer saber de tudo, a curiosidade de não deixar nada escapar e a avidez por absorver os mais diversos assuntos – atitudes que a muitos podem parecer sem consequências negativas – são, portanto, elementos aniquiladores da concentração, do estudo autêntico e do amadurecimento espiritual. Sem a prudência, o ser humano dissipa suas melhores energias, desgastando-se constantemente, mas não sai, por assim dizer, do mesmo lugar.
A prudência vivenciada a partir de diretrizes espiritualistas divulgadas pelo Racionalismo Cristão conduz os seres humanos à escolha dos meios mais eficazes para o autoaprimoramento e o cultivo das qualidades que lhe elevam e dignificam a existência. Quando espiritualmente considerada, a prudência ensina a maneira correta de exteriorizar talentos e atributos segundo as circunstâncias e o momento; não apenas isso: ela aponta o momento certo em que se deve agir ou deixar de agir, o momento adequado para avançar ou estrategicamente recuar.
O estudioso da espiritualidade autêntica, esta difundida pela nossa filosofia de vida, o Racionalismo Cristão, por dispor de todos os subsídios necessários para agir com equilíbrio no trato com o próprio corpo e com a própria saúde, age com discrição e racionalidade, dispensa o excesso de zelo e não aceita o rigor de certas práticas. Jamais se abstém das atitudes necessárias; recusa, todavia, o que é supérfluo, excessivo e demasiado.
Há estudiosos de filosofia que argumentam que a prudência é uma virtude de proteção, pois enseja a necessária cautela para o enfrentamento de situações desafiadoras, livrando, muitas vezes, a pessoa de embaraços. Não discordamos de tal entendimento, mas achamo-lo demasiadamente restrito. No âmbito de nossos estudos racionalistas cristãos, a prudência é, igualmente, uma virtude de proteção, mas constitui, acima de tudo, uma virtude de crescimento espiritual, pois conduz os seres humanos à conquista de seus objetivos mais importantes e legítimos.
Viver com prudência e reserva não é viver sem entusiasmo e espontaneidade, mas com inteligência e racionalidade. Eis a síntese do que almejamos comunicar na presente reflexão.
A prudência nos é útil nas mais variadas situações da vida, mas sobretudo quando estamos divididos, inseguros ou receosos em tomar uma decisão. Isso se dá porque a prudência equilibra tensões interiores e ilumina o raciocínio, impedindo a distração, a precipitação, a negligência e a inconstância.
A inclinação e a disposição em adotar, na vida cotidiana, uma postura de prudência não é a mesma em todos os seres humanos; sabemos disso. A ponderação e o discernimento não se encontram igual e proporcionalmente distribuídos entre as pessoas. Há quem tenha extrema vivacidade e inteligência, talentos verdadeiramente extraordinários, mas pouco apreço pela sensatez; outros há que não dispõem de um brilhantismo incomum ou de uma argúcia penetrante, mas exteriorizam singular equilíbrio e bom senso em suas ações. Logo, estamos convictos de que, para além das peculiaridades de cada um, todos, indistintamente, têm atributos e capacidades que lhe permitem vivenciar a prudência nas mais diversas situações da vida.
A prudência que manifestamos em nossa vida será tão mais vigorosa quanto mais acompanhada for de esclarecimento espiritual que nos proporciona o Racionalismo Cristão.