Ciências herméticas e educação pessoal
A grande civilização egípcia, após o apogeu, começava a declinar, minada pelas contínuas lutas contra os hicsos ou reis pastores. Esses povos tinham partido da Índia 3.200 anos antes de Cristo e, espalhando-se pelo Ocidente, formaram os grandes impérios de Babilônia e da Assíria, e estabeleceram numerosas colônias na Grécia, onde eram chamados Ionis ou Ionigas. Mais tarde, foram os fundadores da guerreira Cartago (na África). O governo teocrático dos faraós fizera a prosperidade até a época de que estamos falando (2.600 anos antes de Cristo).
A ciência e a filosofia tinham prosperado admiravelmente nesse país, e os conhecimentos recebidos dos atlantes tinham sido conservados com o maior carinho.
Todavia, desde a 13ª dinastia, o Egito estava em intensa luta contra uma horda de asiáticos ignóbeis como os chama Manethon, e aos quais deram o apelido injurioso de hicsos, isto é, reis pastores. Essa luta durou até quase 2.200 anos antes de Cristo, quando os asiáticos se apoderaram do Egito, onde, após uma grande carnificina, inauguraram, com o reinado de Xalif, a 15ª dinastia.
Prevendo que seriam vencidos, os sábios sacerdotes egípcios, entre 2.600 e 2.500 a.C., criaram os Grandes Mistérios, a fim de conservar com a maior pureza possível a tradição dos atlantes que, aliás, já estavam perdendo, devido à grande e renhida luta que sustentavam contra os invasores.
É nessa ocasião que se revela entre eles um adepto de gênio sublime: Hermes, denominado o Três vezes grande e o Mensageiro dos deuses.
Hermes adaptou às necessidades do seu tempo os mistérios do antigo simbolismo atlante e deu nova expressão aos símbolos então esquecidos. A revelação de Hermes teve tão profunda influência que, desde então, a Universidade do Egito tomou o seu nome.
Com efeito, as tradições recebidas, pelo Egito dos vermelhos (atlantes) e dos negros, já se iam tornando obscuras aos próprios iniciados, e necessitavam de uma nova adaptação, ao mesmo tempo que era necessário salvaguardar da profanação os mistérios, pela criação de um simbolismo novo.
Foi o que Hermes realizou do modo mais admirável. Sua influência foi tão grande que se prolongou muito no futuro, e ainda hoje os axiomas herméticos são citados pelos cientistas como sendo a expressão perfeita das leis que regem a matéria. A antiguidade tinha especial esmero na educação. O seu sistema de educação, porém, afastava-se muito do nosso. Enquanto nós desenvolvemos a memória, sobrecarregando o cérebro de numerosas matérias mal digeridas, os antigos procuravam desenvolver a inteligência e a vontade, paralelamente às mais nobres e elevadas qualidades morais.
A moralidade dos antigos sábios não se apoiava em preceito de ordem sobrenatural, nem em princípios irracionais, mas era essencialmente prática. Sua base era o bem comum, e ela podia ser contida inteiramente nestas palavras: não façais aos outros o que não quereis que vos façam.
Os antigos hermetistas não só eram homens de alto saber, mas também sabiam aplicar sua ciência na vida prática.
O sábio era, naquele tempo, também o mais forte e o mais enérgico dos homens. Para adquirir a ciência tinha de educar e desenvolver sua vontade, e o coroamento de sua sabedoria era o mais absoluto domínio próprio.
Hoje, que a iniciação intelectual pode ser obtida sem provas físicas e morais, cada classe da humanidade pode desenvolver as suas tendências sem empecilhos. Esta liberdade extrema levou cada classe ao exagero das suas tendências, dividiu e opôs os seus interesses entre si, aumentando cada vez mais o número de infelizes.
Os intelectuais e teóricos exageram muito a sua tendência, esquecendo-se que os que vivem na Terra precisam da atividade física. Também é nessa classe que encontramos o maior número de mal sucedidos na vida, por falta de senso prático. Sua inteligência é, às vezes, notável e capaz de voos sublimes pelas regiões do saber, mas faltam-lhes a ordem e a prática, únicas qualidades que permitem realizar no plano material as aspirações da inteligência.
Os instintivos e materiais, abandonando-se aos excessos das suas tendências, só pensam em entregar-se à preguiça e ao prazer. Portanto, não são também homens talhados para o êxito, pois, como a borboleta que vai de flor em flor, continuamente atrás das coisas, mas efêmeras.
Os ativos ou anímicos têm bastante energia e poderiam progredir, mas desperdiçam suas forças pela demasiada atividade em todo gênero de prazeres e divertimentos.
Enfim, os voluntários e ambiciosos são os que adquirem melhores posições na vida, porém raramente alcançam a felicidade, porque o excesso de ambição produz o orgulho e o despotismo, que são incompatíveis com a alegria do coração.
Nenhuma destas classes é perfeita, nenhuma delas pode aspirar a reunir estas três coisas: saber, felicidade e bem-estar, que são apanágio do homem perfeito. Concebe-se, pois, a necessidade de um sistema de educação que venha a equilibrar no mesmo homem suas tendências naturais pelas que lhe são contrárias.
O equilíbrio é a grande lei do Universo e tudo caminha para ele. O homem perfeitamente equilibrado contém em si as qualidades de cada uma das classes precedentes, sem ter os seus defeitos. Vamos descrever cada um desses temperamentos em que os hermetistas dividiam a humanidade: o tranquilo ou linfático, o ativo ou sanguíneo, o nervoso ou bilioso, o voluntário ou atrabiliário.
O conhecimento de si mesmo já é meio caminho andado para o progresso. Conhece-te a ti mesmo, é o primeiro conselho que dá o sábio ao homem que deseja entrar no Templo do Saber. Não há fracasso para quem conhece perfeitamente a si mesmo; seu destino está em suas mãos e depende da sua vontade.
O homem superior é aquele que realizou o equilíbrio perfeito. Ele não tem os defeitos do tranquilo, nem as paixões do ativo, nem o impulso do nervoso, porém possui todas as suas virtudes: é calmo como o primeiro, ágil como o segundo, enérgico como o terceiro.
Como o tranquilo, sabe economizar suas forças e descansar quando é necessário. Como o ativo, é capaz de um grande esforço, não teme as lutas e procura o movimento. Como o nervoso, estuda bem o caminho antes de entrar por ele e dá à sua inteligência o impulso conveniente. Esta síntese humana que mostra a energia, o domínio próprio, a bondade, a felicidade, este ente diante de quem todos se inclinam, é uma harmonia maravilhosa.
Esta harmonia se manifesta em todo o seu corpo. Sua força transparece através do seu harmonioso organismo, apesar da sua modesta aparência e de seus gestos sóbrios. Deixa-nos a impressão de uma calma soberana. É uma força em descanso – diz Vitor Morgan.
Sua calma modelou os traços do seu rosto; é belo, atrativo, nobre, cheio de paz e de harmonia. Seus olhos exprimem a felicidade, a energia, a calma absoluta, a bondade de sua alma. Senhor absoluto das suas paixões, pode impor sua vontade aos outros. Sua voz é uma força, cujos efeitos conhece e que dirige a vontade… Sua atividade é enorme e dirigida para um só fim… Tem confiança ilimitada em si, porém é modesto e não tem orgulho. Seu amor por tudo o que é bom, pela humanidade, se exprime por um trabalho contínuo, a fim de melhorar a sorte dos outros.
Nenhuma das suas ações está em desacordo com seus sentimentos e suas ideias. Onde ele vai, leva a felicidade e o prazer; Sua irradiação é balsâmica, acalma e regenera; seus pensamentos são puros e nobres como sua alma.
Que o discípulo estude e medite, e, sobretudo, procure verificar na sua roda a exatidão das nossas afirmações. Assim aprenderá a conhecer o lado fraco dos seus amigos, podendo tirar proveito deles honestamente, bem entendido, para o seu progresso e prosperidade.
Para alcançar bons resultados nos estudos e na prática do hermetismo, é mister começar com sua própria educação. O discípulo deverá conhecer-se a si mesmo, corrigir seus defeitos e desenvolver as suas faculdades no sentido de tornar-se sadio, forte, inteligente e próspero, espiritualizando cada vez mais os seus ideais.
Alberto Barros
Militante da Filial Porto (Portugal)