Não são poucas as pessoas que desenvolvem síndromes, distúrbios, depressão e outros quadros alimentados pelo medo quando se deparam com situações adversas e problemáticas em suas vidas. Contudo, ao se deixar penetrar pelas luzes auspiciosas da transcendência, o ser humano passa a compreender nitidamente que o confronto com a possibilidade de adoecer não necessita, absolutamente, ensejar um pavor nem um desespero doentio que venham a aniquilar o sentido da vida. Com certeza, a consciência da transitoriedade e da finitude da vida física pode ser um caminho para o despertar profundo do valor da vida e das oportunidades de crescimento moral que esta não cessa de oferecer.
Nossa reflexão sobre esse tema fugiria ao objetivo a que se há de propor se permanecesse, unicamente, no campo das abstrações e das especulações do senso comum. Defendemos a ideia de que os ensinamentos racionalistas cristãos devem ser aplicados no dia a dia da vida humana, como um veículo eficaz na manutenção da saúde física e na solução dos conflitos psíquicos relacionados ao medo e à ansiedade.
Entre os dramas vivenciados pelo ser humano na agitada sociedade em que nos vemos inseridos, o medo excessivo se destaca como um sentimento capaz de anular as manifestações de espontaneidade e criatividade e a possibilidade de construção de uma vida harmônica. É nesse contexto que o esclarecimento espiritual proporcionado pelo Racionalismo Cristão assume excepcional importância, incitando cada um a proceder com serenidade, no sentido de gerir seus sentimentos e aprimorar o senso crítico da realidade, evitando a superestimação dos problemas e desafios que compõem o viver neste planeta.
A serenidade que brota espontaneamente do esclarecimento espiritual funda-se na convicção de que todos os fatos e fenômenos redundam, em última análise, em benefício do gênero humano. Nessa perspectiva, a serenidade gera coragem e significa muito mais do que a ausência de angústia – representa, antes, uma virtude de tal importância que, sem ela, não é possível uma vida plena e fecunda. A serenidade, amigos, gera bem-estar, alegria, desprendimento, lucidez e, sobretudo, impede as arremetidas do medo avassalador.
A serenidade a que nos referimos é fundamental, visto que, uma vez desprezada, os valores da liberdade e espontaneidade excluir-se-iam reciprocamente. De fato, quando ponderadas racionalmente, as preocupações tendem a se reduzir, possibilitando o livre desenvolvimento da personalidade e a sustentabilidade das relações afetivas.
Serenos poderemos afrontar, sem medo, a imaginada ditadura do pânico e, assim, o desassossego não terá mais espaço em nossas mentes.
A quase totalidade das preocupações que atingem cotidianamente as pessoas orbitam o medo de algo que pode vir a acontecer. Os estados de ansiedade são entendidos como manifestações físicas e psíquicas de preocupações excessivas, que podem ou não estar diretamente atribuídas a um perigo real, podendo ocorrer nas formas de acometimento ou de um estado perturbativo persistente.
Será que serei vítima de alguma doença? Será que meus parentes e amigos serão infectados por uma pandemia? O que os exames revelarão acerca de minha saúde? E se eu perder o emprego? E se a decisão que tomei não foi a mais adequada? E se, e se, e se… Estas especulações, quando constantes, desviam as pessoas de seus objetivos, criando um quadro angustiante de ansiedade, que tende a agravar-se à medida que o ser humano busca fora de si a solução para o problema, recorrendo a fórmulas fáceis, como rituais improvisados e panaceias – recursos que, ao invés de resolver a questão, acabam por aumentá-la consideravelmente.
A sociedade deve encarar a ansiedade com a maior atenção e seriedade, pois quando exacerbada possui inúmeros pontos de contato com a depressão. Ambas causam enormes prejuízos psíquicos à humanidade, possuindo o medo como uma raiz comum. Este, por seu turno, reflete o desconhecimento da vida em sua expressão mais vasta.
A partir do momento em que o ser humano compreende que sua essência é única e eterna, experimenta uma profunda sensação de paz, afastando de si, naturalmente, a tensão e a ansiedade. Não há, portanto, nenhum segredo para a superação da angústia e do medo paralisante. O que há é a necessidade premente de autoconhecimento e abertura para o transcendente, a fim de que todos possam despertar a consciência sobre seus traços espirituais e suas múltiplas possibilidades de superação.
Uma vez que o futuro se constitui de elementos especulativos, dedutivos e abstratos e que tende a estabelecer-se de acordo com ações realizadas no presente, devemos cada vez mais concentrar nossa atenção nos fatos concretos que fazem parte do aqui e do agora, e não canalizar nossas energias para expectativas e elucubrações.
A percepção dos valores que realmente produzem bem-estar e tranquilidade, assim como o desenvolvimento da confiança em nós mesmos e nos processos que regulam a vida com vistas a seu aperfeiçoamento e plenitude, retira-nos de um estado paralisante de alerta que nos impede de entrar em contato com nós mesmos, de forma a rever posicionamentos e ajustar comportamentos.
A certeza de que existe uma realidade espiritual que tudo sustenta e interpenetra imprime um relevante impulso ao compromisso de cada ser humano com sua própria felicidade e com a construção de um mundo melhor, mais fraterno e solidário, menos intolerante e apreensivo, em que possamos perceber nossos semelhantes como uma extensão de nós mesmos, e não como concorrentes ou algozes. Trata-se de um apelo extremamente importante para dar à nossa presente reflexão um caráter não apenas formal, mas realmente espiritual.
Entendamos o seguinte: o desespero e o terror representam emoções, e estas ou se prestam a elevar e fortalecer a personalidade – quando naturais e benfazejas – ou, gerando anormalidades e tensões doentias, prejudicam-na – quando maléficas e inconvenientes. Na verdade, as emoções, sejam elas quais forem, devem subordinar-se sempre à razão, sem a qual não deixam de sobrevir a angústia e o mal-estar. A razão, portanto, é o instrumento eficaz para selecionarmos as emoções e, desta forma, eliminarmos o medo excessivo e doentio de nossas vidas.
Se, em vez de recear uma possível contaminação por determinado vírus, receássemos a perda de nosso equilíbrio emocional; se nos empenhássemos em desenvolver virtudes e viver com disciplina e consideração pelo próximo e canalizássemos melhor nossas energias em buscar soluções concretas e objetivas para nossos desafios; se, enfim, não divagássemos em elucubrações vazias e muitas vezes fantasiosas, não teríamos medo exagerado das situações que a vida muitas vezes nos impõe, que se traduzirão, a médio ou longo prazo – como, aliás, já o dissemos – em evolução para a humanidade.
Composto de corpo e alma, o ser humano é, por sua própria natureza, um ser complexo. Possui raciocínio, livre-arbítrio e inúmeras outros atributos e faculdades que lhe permitem o desenvolvimento. Seu maior valor, a nota singular que o distingue dos demais seres é precisamente a liberdade. Esta, contudo, necessita ser direcionada pela inteligência e pela razão, para que não seja dominada pelos mais variados instintos e, sobretudo, para que não se deixe envolver pelos grilhões do medo.
No ambiente muitas vezes inseguro em que vivemos, é preciso que aprendamos a nos controlar e a fixar nosso olhar nos aspectos positivos da vida, nas pessoas que amamos, em nossa saúde integral, em nossos atributos e faculdades; é preciso procurar absorver os estímulos mais importantes do atual momento que vivenciamos e incorporar as lições que ele traz consigo. Caso contrário, adoeceremos, asfixiados pela angústia e pela ansiedade antes que por qualquer vírus que seja.
O autocontrole é, sem sombra de dúvida, importante para avançarmos nessa questão, mas o principal objetivo a ser buscado é, reiteramos, o esclarecimento espiritual advindo dos ensinamentos do Racionalismo Cristão. É ele que liberta o ser humano das amarras situacionais, fortalecendo-o e auxiliando-o a encontrar ocasião de ruptura do ritmo acelerado e muitas vezes angustiante em que se encontra imerso, bem como a olhar dentro de si mesmo, respondendo de forma positiva e elevada aos questionamentos e expectativas mais profundas de sua alma, como nos ensina a nossa Filosofia de vida
Muito Obrigado!