Elemento propiciador de dignidade

Não há elemento propiciador de dignidade mais importante do que o trabalho. Essa primeira afirmativa denota o valor que assume, o presente tema, no contexto de nossos estudos filosófico-espiritualistas. No campo da espiritualidade, o trabalho não representa mera atividade humana, mas fundamenta o salutar desenvolvimento do ser humano e da coletividade, o que amplia sua importância entre nós. Nessa perspectiva e com muita satisfação, passamos a tecer breves comentários sobre o trabalho à luz da espiritualidade divulgada e defendida pelo Racionalismo Cristão.

Analisado pela perspectiva etimológica e em sua realidade histórica, o vocábulo “trabalho” vincula-se à ideia de sofrimento, dor, castigo. O termo latino que lhe dá origem, tripalium, era uma espécie de instrumento de tortura. No entanto, durante a Antiguidade e a Idade Média, a nobreza, os vencedores das batalhas e os chefes dos feudos jamais trabalhavam, uma vez que consideravam o trabalho como um castigo. Contudo, se no passado o trabalho tinha uma conotação pejorativa, nos dias atuais, graças à evolução do pensamento humano e do Direito, ele significa energia física ou intelectual empregada em benefício próprio e da coletividade. Tal mudança de paradigma é uma marca notória da evolução humana.

É natural que de tempos em tempos voltemos ao tema do trabalho, procurando ampliá-lo através das lentes da espiritualidade proporcionadas pelo Racionalismo Cristão, dada a notória filiação da prática laboral ao aprimoramento espiritual do ser humano e a íntima relação existente entre as atividades laborais e o desenvolvimento das faculdades e talentos inerentes ao espírito. É por meio do trabalho que a pessoa desenvolve a criatividade, o raciocínio, a responsabilidade e a sociabilidade, entre outros valiosíssimos predicados.

Está fora de questão que os seres humanos que atualmente se iniciam na vida de trabalho colhem as benéficas consequências de sua evolução multifacetária. Assim sendo, hoje, mais do que nunca, devemos valorizar o trabalho e a operosidade, pois quando bem conduzidos, representam para o ser humano uma eficaz via de espiritualização. Abrindo-nos ao sentido transcendente do trabalho humano, tornar-nos-emos, dia após dia, pessoas cada vez mais espiritualizadas, conscientes das responsabilidades que temos para com nós mesmos, com a família que integramos e com o conjunto dos demais seres.

A ociosidade produz conflitos que angustiam as pessoas e desestabilizam grupos sociais. Tal constatação afirma o intenso coeficiente moral, ético e espiritual que orbita o trabalho, especialmente aquele realizado com esmero, consciência e dedicação, que exprime, por seu turno, o compromisso com o bem-estar individual e social. Não existe prioridade maior para a pessoa esclarecida espiritualmente do que esta: eliminar de sua estrutura psíquica todo impulso à ociosidade, pois ela sabe que somente assim poderá exteriorizar plenamente suas qualidades e talentos, possibilitando um intercâmbio produtivo com seus semelhantes.

Todas as teorias ou ideologias que pretendem diminuir a dignidade do trabalho devem ser afastadas de plano pelo ser humano que busca com sinceridade o autoaprimoramento. Sabemos que as novas tecnologias provocaram, ao longo dos últimos anos, uma profunda mudança na visão humana sobre o trabalho. A exploração do universo eletrônico colocou a sociedade em contato com uma diferente e inesperada realidade. Entretanto, no que se refere à essência do trabalho, isto é, ao aspecto espiritual, continua ele a ser um importantíssimo instrumento do desenvolvimento humano em todas as suas dimensões.

Com vistas ao bem-estar de nossos semelhantes, houvemos por bem abordar o tema do trabalho nesta reflexão, pois estamos convictos de que a forma adequada de reação aos inúmeros desafios da atualidade passa pela concepção ampliada e espiritualizada do conceito de trabalho. Trabalhando norteados por princípios espiritualistas propostos pelo Racionalismo Cristão, sobretudo o da dignidade da pessoa humana, os seres e a sociedade como um todo desenvolvem a criatividade e a capacidade de resposta aos desafios. Nessa visão, torna-se imperioso afirmar que não apenas entre as pessoas, mas também entre os agentes sociais que influenciam as relações de trabalho deve haver nítido senso de solidariedade. Solidariedade, diligência, disposição para se reinventar, disciplina e trabalho são instrumentos que, quando bem manejados, deitam por terra inúmeros problemas e crises e, ao mesmo tempo, enchem o ser humano de valor, coragem e dignidade. Viva o trabalho!