O fanatismo, conceito que surge no final do século XVIII, mas cujas manifestações são bem anteriores, deve ser considerado um dos maiores flagelos da humanidade. O termo é usado para indicar zelo excessivo, irrefletido e pouco racional de pessoas em relação a um grupo, conceito ou sistema de crenças. O fanático é, em geral, um indivíduo arrogante que desconhece a autocrítica, possuidor de uma mentalidade imatura e um intelecto embotado.
Preservar a primazia da racionalidade em meio às turbulências da sociedade contemporânea é um desafio que se impõe ao ser humano que valoriza a espiritualidade e que pretende se afastar do fanatismo. Procuraremos demonstrar nesta reflexão que é imperioso realimentar constantemente a chama dos ideais elevados e entender que o raciocínio possui as credenciais necessárias para efetuar o exame das incontáveis ideologias que permeiam o pensamento humano, de modo a verificar o que nelas é consistente e inconsistente.
Sendo o problema do fanatismo complexo e estando interligado com nossos estudos filosófico-espiritualistas, é imprescindível ampliar o olhar sobre a questão, a fim de compreendê-la de forma mais abrangente. Nessa perspectiva, vários são os fatores a ser analisados e os horizontes a ser superados.
Quaisquer que sejam as faces do fanatismo – política, ecológica, religiosa, étnica, esportiva –, importa conhecer o processo subtendido que fomenta tal movimento. O que faz uma pessoa se fanatizar? Muitas são as respostas possíveis. Alguns dirão que o fanático passa por um processo de lavagem cerebral; outros poderão objetar dizendo que se trata de uma questão individual, ou seja, que cada pessoa tem uma motivação diferente. Porém, o que, indiscutivelmente, chama a atenção são os traços inflexíveis de personalidade comuns a todos os fanáticos. Eis o principal fator do fanatismo: a rigidez de pensamento. Todas as manifestações de fanatismo, afinal, são efeitos de um mesmo e gravíssimo problema: a incapacidade de considerar corretas outras visões de mundo que não a própria.
O fanatismo assume com frequência outros rótulos, como o fundamentalismo e o extremismo. O primeiro se firma em uma visão maniqueísta do mundo, através da qual tudo que não se afina com o que o grupo defende é considerado mau e deletério. Para os fundamentalistas, o bem é apenas a afirmação categórica de certos princípios ditados pelo grupo. O segundo, como o próprio nome indica, significa a polarização radical de uma crença. No campo político, os extremistas não respeitam as contradições próprias da democracia, rejeitam o diálogo, desprezam a tolerância e desqualificam a reflexão.
Muitos seres humanos, ao lerem nossa reflexão, poderão presumir-se livres do fanatismo ou considerá-lo uma realidade muito distante de si. Contudo, a questão não é tão simples assim: há que ter vigilância constante quanto aos pensamentos e sentimentos em nós acalentados para não cedermos aos impulsos do radicalismo. De fato, esse é um perigo que nos ronda muito concretamente, sobretudo se considerarmos o período de incertezas, inseguranças e colapsos em que vivemos. A adesão cega a encontros realizados entre pessoas egocêntricas leva à desintegração do senso crítico. Questões espinhosas, polêmicas e controvertidas, quando eivadas de injustificável preconceito, são indefensáveis à luz de uma pesquisa criteriosa e séria, devendo ser evitadas energicamente.
É imperioso destacar que todos aqueles que se apegam demasiadamente às próprias ideias e pareceres, sem aceitar o diálogo e o confronto de ideias, sofrerão, hoje ou amanhã, as consequências perniciosas de suas posturas inflexíveis.
O cultivo da espiritualidade divulgada e defendida pelo Racionalismo Cristão, ou seja, das virtudes, reveste-se de um significado ainda mais iluminador no tempo presente. A abertura para a espiritualidade insufla na alma energia moral e apurada sensibilidade, que permitem compreender que o fanatismo não tem sentido. Com certeza, a primeira vítima dele é o próprio fanático, que se priva do diálogo e do intercâmbio – fatores essenciais para uma existência digna e fecunda.
A solução espiritualista em relação ao fanatismo não é a simples renúncia ao convívio com os radicais para assegurar bem-estar e tranquilidade. A maneira concreta de combater essa perturbação psíquica é demonstrar na vida prática o valor do diálogo e do respeito ao ponto de vista alheio; é irradiar positividade e estender a mão; é dissolver, com a seiva do amor ao próximo e do respeito às diferenças, os vínculos fundamentalistas que escravizam as pessoas. Um traço característico do ser humano que se deixou penetrar pelas luzes da espiritualidade é a atitude reiterada de generosidade para quem sofre. Não tenham dúvida: aquele que se detém demasiadamente a uma ideia sofre com a indigência de seu raciocínio e de suas fragmentadas perspectivas e, não raro, é visitado pela desolação e pela angústia.
O estudioso da transcendência deve conscientizar-se de que o processo de esclarecimento não resulta apenas de uma conexão com campos mais sutis da existência, mas também com o contato fraterno com o semelhante. O crescimento moral é fruto de uma sequência positiva de encontros e reencontros com o próximo, de gestos de humildade e bondade. Apontar erros é fácil; estender a mão, nem tanto. Este, porém, é o único caminho para o aperfeiçoamento de nossa personalidade.
Libertos de preconceitos e ideias radicais, olharemos para o próximo com olhos renovados, livres de tolos preconceitos. Cada vez mais esperançosos em relação ao gênero humano, avançaremos certos de que aquele que hoje age com fanatismo pode rever seu posicionamento à medida que encontra na sociedade exemplos de solidariedade e fraternidade. Empenhemo-nos, pois, em ser mais humanos, conciliadores e benevolentes. Não é pequena nossa responsabilidade, amigos!
Muito Obrigado!