Gratidão revela nobreza

A opção por ser grato, por sentir no âmago o valor de um bem recebido e ter por quem o proporcionou, em consequência mesmo da oportunidade de ter sido beneficiado, um sentimento de profunda gratidão, de reconhecimento, de respeito e de reverência, é ato espiritual que revela nobreza.

Falar de nobreza no mundo atual, em que grande parte da humanidade vive nos centros urbanos, onde a luta pela sobrevivência é muitas vezes árdua, pode até soar estranho, como ilusão, quimera, utopia ou devaneios de uma mente sonhadora.

Mas a nobreza a que nos referimos é de outro nível, mais elevado, pois há que se notar que, mesmo em circunstâncias em que os deveres da vida material se sobrepõem, por necessidade de sobrevivência, aos atos de delicadeza, de suavidade, de afeto, sempre há espaço para se cultivarem os valores da alma, as conquistas imperecíveis do espírito.

A nobreza a que nos referimos não se trata, é bom que se esclareça, daquela que se obtém por meio de títulos nobiliárquicos, muitas vezes conseguidos a peso de ouro e por estratagemas indignos dos que têm noção de moralidade e de honradez. Nobreza de fachada, de papel, de vaidade. Não é essa que pretendemos analisar.

A nobreza, objeto do nosso estudo, é aquela perene, duradoura, simples e espontânea. A que se obtém a partir da evolução, do aprendizado da condição humana em seus aspectos relevantes, sob a ótica da espiritualidade. A que revela alto grau de elevação espiritual: a nobreza de caráter.  Muitas são as oportunidades que se nos apresentam para aperfeiçoarmos em nossa estrutura espiritual essa característica.

Nas relações familiares, por exemplo, verifica-se a gratidão quando os filhos se enternecem pelo esforço contínuo dos pais para dar o melhor de si pela sua educação; quando descobrem e reconhecem a real necessidade do engrandecimento pessoal em prol de si mesmos e da coletividade e creditam esse mérito, em grande parte, aos pais.

A possibilidade de estudar, de obter educação formal, quando emparelhada com o aprimoramento dos sentimentos, do afeto, da amabilidade, possibilita grande progresso moral e espiritual. E merece toda gratidão dos filhos.

Nas salas de aula mesmo, do nível primário ao universitário, demonstra-se gratidão quando os alunos decidem homenagear um professor nos eventos de formatura, com pureza de sentimentos, objetivando deixar marcado o agradecimento pelos ensinamentos ministrados.

Outra oportunidade de se observar gratidão é quando se obtém ajuda de profissionais em suas atividades com objetivos de apelo material. Sentir-se grato e expressar esse sentimento, mesmo que seja nos assuntos de interesse estritamente material e remunerado, realça a nobreza em reconhecer o esforço do outro e o auxílio recebido.

A aridez de sentimento dos que pensam que, por estarem pagando pelo serviço prestado, não precisam agradecer, demonstra aspereza, secura, insuficiência de sentimentos superiores, falta de consideração pelo elemento humano nas relações de trabalho.

Entretanto é nos gestos mais simples que se nota esse aspecto da nobreza de caráter em sua característica mais pura, como, por exemplo, quando há o auxílio de um jovem que se oferece para carregar um pacote ou outro objeto cujo peso esteja fazendo padecer uma pessoa idosa, num auxílio espontâneo, nobre, desinteressado.

Quando essa ajuda, por sua vez, provoca naquele que a recebeu o impulso de retribuir, nem que seja por um sincero muito obrigado, um abraço ou um afago, observa-se a gratidão sem jaça, aquela que adorna o status de humanidade de quem fez o bem e de quem o recebeu, a nobreza reveladora de consideração recíproca da generosidade de quem auxilia e de quem é beneficiado.

A gratidão é mais uma qualidade do espírito que merece toda nossa atenção, ao par daquelas que proporcionam o engrandecimento do caráter: moderação, ponderação, justiça e valor.

Eis uma dimensão da vasta, eclética e profunda ciência que nos foi descortinada pelo Racionalismo Cristão e seus idealizadores – Antonio Vieira, Luiz de Mattos, Antonio Cottas, Maria de Oliveira e tantos outros que não nos é dado saber: a ciência da vida.

A eles e a nós mesmos devemos o preito de gratidão que consiste em honrar nosso compromisso de aperfeiçoamento pessoal, em bem da humanidade.