Inteligência artificial

Inteligência Artificial (IA) é um tema presente no imaginário popular há décadas, geralmente retratado em filmes de ficção científica como um futuro apocalíptico dominado por máquinas. Por mais exageradamente distópico que essas imagens representem, IA também é motivo de preocupação de grandes personalidades, como o físico Stephen Hawking (1942-2018) e o bilionário Elon Musk, para quem o desenvolvimento desenfreado de IA é a “maior ameaça existencial” para a espécie humana.

O entusiasmo com o tema é antigo e remonta às primeiras gerações de cientistas da computação, em especial Alan Turing (1912-1954). Em um artigo seu datado de 1950, Computing machinery and intelligence, Turing propõe uma forma de definir se uma máquina é inteligente, o que chamamos hoje de Teste de Turing. Até hoje, nenhuma máquina passou no teste.

O século XX foi marcado pelo estudo e produção de inteligência artificial para resolver tarefas muito específicas e limitadas. A descoberta das redes neurais artificiais multicamadas mudou este o cenário, possibilitando não uma mera programação de máquinas, mas que elas aprendessem por si mesmas, desde que exposta a dados. No século XXI, com a grande capacidade computacional, a grande capacidade de armazenamento de dados e o grande volume de dados disponíveis, especialmente através da internet, no setor de IA tem passado por uma revolução.

Essa revolução tornou possível o treinamento de redes neurais artificiais para o reconhecimento de tumores em imagens de tomografia, por exemplo. Outras aplicações envolvem a possibilidade de deficientes visuais fazerem uso de algoritmos de reconhecimento facial e interpretação de emoções instalados em seus celulares para caminhar com mais segurança nas ruas. Escritórios de advocacia estão utilizando aprendizado de máquina em volumes históricos de casos jurídicos para auxiliar na tomada de decisão de casos futuros.

Técnicas de IA também tem auxiliado empresas na gestão de seus negócios: na otimização de processos, minimização de custos e maximização de receita. A IA tem sido usada, por exemplo, para indicação de produtos ao cliente de acordo com seus hábitos de consumo e até no atendimento personalizado em chats de redes sociais. No agronegócio, imagens captadas por drones podem auxiliar no monitoramento e reconhecimento de áreas atingidas por seca ou por doenças.

Desafios

Os avanços são grandes e podem, de fato, tomar proporções arriscadas. Apesar das preocupações originais a respeito de um suposto crescimento descontrolado de IA, os maiores desafios que se apresentam de imediato e para os próximos 30 anos anos são de natureza ética e social: o impacto no mercado de trabalho, no direito à privacidade e na política.

O impacto no mercado de trabalho preocupa pela taxa de empregabilidade dos modelos de negócio da área de tecnologia. A Google, uma das maiores empresas de tecnologia do mundo, emprega menos do que a General Motors empregava no auge da crise de 1929.

Outro exemplo é a eventual adoção de caminhões autônomos nos próximos anos, como vem sendo projetado pela Uber para os Estados Unidos. Naquele país, 3% da população economicamente ativa trabalha como motorista de frete: é o emprego mais comum na maioria dos estados, o que também cria empregos indiretos como em hotéis, restaurantes e postos de parada. O ganho salarial de motoristas de carga soma até US$ 300 bilhões por ano e ajuda a movimentar essa economia. Ao criar uma plataforma de entrega de frete por caminhões autônomos, a Uber começa, ainda que de maneira tímida, a ameçar milhões de empregos. O mesmo pode ser dito a respeito de carros autônomos e o impacto em taxistas e motoristas de aplicativo. Talvez por essas tecnologias ainda se encontrarem em fase experimental ou funcionando em pequena escala, não há um debate público amplo a respeito dos limites, das consequências ou mesmo sobre a implementação de políticas que contornem os problemas que já estão surgindo. O estado da Califórnia, conhecido como o Vale do Silício por abrigar muitas das maiores empresas de tecnologia do mundo, enfrenta problemas sérios de aumento do desemprego e de moradores de rua. Com baixos salários em subempregos, uma parte da população não tem remuneração suficiente para moradia digna e passa a viver em trailers ou mesmo dormir dentro de seus carros.

As técnicas de AI de reconhecimento facial impõem outro desafio quando utilizado por entidades como a polícia. Nestes casos, a acurácia é fundamental, para não violar o direito à privacidade nem a presunção de inocência. Três cidades dos EUA já proibiram sua utilização por órgãos governamentais, questionando exatamente sua eficiência. A polícia do Rio de Janeiro começou a utilizar este ano câmeras de reconhecimento facial para monitoramento e identificação de suspeitos e foragidos e já apresentou falhas.

China

Em democracias consolidadas, espera-se que a população tenha maior autonomia sobre essas tecnologias. Parece não ser o caso, por exemplo, da China. Lá, câmeras de reconhecimento facial têm sido amplamente empregadas, de forma associada a uma plataforma de pontuação individual, que registra os hábitos de consumo e abre (ou fecha) a disponibilidade de crédito baseado no comportamento de cada cidadão. Denúncias dão conta de que este sistema esteja sendo usado também para perseguição política contra jornalistas e dissidentes.

Ainda no campo da privacidade, o vazamento de informações governamentais em 2013 por Edward Snowden, ex-agente da CIA, e o escândalo da Cambridge Analytica, em 2018, deixaram muito claro o papel de grandes corporações como o Facebook, a respeito do uso de dados pessoais de suas plataformas. A ampla vigilância governamental e o marketing político direcionado, baseado em dados pessoais de milhões de eleitores, afetam a própria estrutura da democracia.

No Brasil, o caso da Cambridge Analytica resultou na formulação da Lei Geral de Proteção de Dados, sancionada em 2018 para entrar em vigor em 2020. É um grande avanço, mas muito ainda precisa ser feito para adaptar as sociedades para novos tempos de uma economia base.