O ceticismo, de Pirro a Sexto Empírico

O ceticismo sistemático, ou pirronismo, doutrina fundada pelo filósofo grego Pirro de Élis (365-275 a.C.), prescreve o cultivo da dúvida permanente, refratária a dogmas e a certezas inquestionáveis, pois o ser humano não pode atingir certeza alguma a respeito da verdade. Assim sendo, não lhe resta senão abdicar, por inata incapacidade, de uma certa compreensão metafísica ou absoluta de uma certa essência das coisas.

Muitos séculos depois, Descartes (1596-1650), ao invés da dúvida permanente prescrita por Pirro, vai recomendar a dúvida provisória, que faz do exame, segundo ele, a pedra de toque de nossas impressões.

A filosofia estoica desenvolveu-se ao longo de três períodos, historicamente localizados entre o século quarto antes de Cristo e o segundo depois de Cristo.

No primeiro, anterior à fundação da Academia platônica, destacaram-se o próprio fundador da doutrina, Pirro, e Tímon de Fliunte (320-230 a.C.).

No segundo, desenvolvido na própria Academia, após a morte de Platão, tiveram papel preponderante Arcesilau de Pitane (316-241 a.C.) e Carnéades de Cirene (213-129 a.C.).

O terceiro, pós-acadêmico, teve como destaques Enesidemo de Cnossos (80-40 a.C.) e Sexto Empírico (c. 200 d.C.) – autor das obras Hipotiposes Pirrônicas e Contra os Lógicos, consideradas “a mais completa fonte para o estudo do ceticismo antigo”.

Antilogia. A exemplo dos sofistas, o ceticismo também estabelece como um de seus princípios básicos a antilogia – contradição não resolúvel entre discursos, julgamentos, argumentos opostos e de igual valor -, que “desmistifica a ideia de verdade absoluta”.

No plano moral, afirma a doutrina estoica, a antilogia conduz o ser humano à desejada ataraxia (completa ausência de perturbações ou inquietações da mente), atitude que concretiza o ideal da tranquila e serena felicidade.

A antilogia, porém, segundo os céticos, não constitui o único meio de atingir a ataraxia. O outro caminho que leva o indivíduo a ela, dizem eles, é viver em conformidade com as instituições, as leis, os costumes e seus próprios modos de sentir.

O que um cético deve saber, para fazer ou para não fazer:

Evitar a busca da verdade ou afirmá-la ou negá-la, por ser tal procedimento causa de intranquilidade e também por ser impossível julgar a verdade ou a falsidade de alguma coisa.

Não negar nem afirmar nada, porque, ao comparar fenômenos e conclusões intelectuais, depara com a equipolência dos raciocínios. Ou seja, nenhum deles pode ser considerado menos ou mais confiável do que outros.

Não pode afirmar que existe uma essência das coisas, pois o que se tem a fazer é aceitá-las como elas se apresentam aos nossos sentidos, sem questionar se existe algo além disso.

Não deve afirmar “isto é assim”, pois cada indivíduo percebe a natureza, o mundo, os objetos “de um modo próprio, pessoal”.

Se cada experiência é única, deve dizer “isto me parece assim”, pois pode “não parecer assim a outro”.

Enfim, eis o que diz a respeito do ceticismo o estudioso Jean-Paul Dumont: “O racionalismo não pode fazer outra coisa senão afastá-lo como errôneo e estéril”.