“O mais virtuoso dos imperadores romanos”, Marco Aurélio, nascera vocacionado para as letras e a filosofia. Foi, porém, desviado de sua verdadeira vocação, uma vez que fora nomeado por seu pai, o imperador Antonino Pio, para sucedê-lo.
Agora, aos 40 anos, assumira o trono, pois seu pai morrera, e Marco Aurélio teria de governar o então maior e mais poderoso império do mundo e de viver em guerra contra os Bárbaros. Não lhe restaria tempo para a filosofia e as letras.
Com efeito, os originais de Meditações (pequena e única obra do imperador-filósofo, “grande, porém, em sua profunda autenticidade e encanto de estilo”) foram escritos a conta-gotas, durante dez anos, em momentos de descanso entre uma batalha e outra.
Livro inspirador. Para Edson Bini, historiador da filosofia, Meditações, em razão de seu caráter íntimo, é um dos escritos mais inspiradores e mais reveladores do pensamento de um grande homem e grande líder. Além de apresentar um conjunto de normas sobre como se comportar ou agir com os nossos semelhantes, para manter com todos um bom relacionamento, o livro enfeixa também ensinamentos sobre as virtudes, a felicidade, a morte, os sentimentos, as paixões e as emoções, bem como sobre a importância de viver em harmonia com a natureza. Vale dizer, sem transgredir suas leis.
Em sua obra, comenta Bini, o imperador sai de cena e entra o filósofo, “que instrui o aluno e dá conselhos ao amigo”.
Fiel a um dos princípios básicos do estoicismo de que não pode haver qualquer autoridade superior à razão, Meditações é obra isenta de quaisquer indícios de sentido religioso, místico ou mitológico.
Diálogo interior. É também um diálogo interior do autor tendo em vista identificar “verdades fundamentais, por meio da razão, sem, no entanto, deixar de lado a sensibilidade”.
Entre os conceitos de cunho moral ou de ordem transcendente da obra de Marco Aurélio, encontram-se, por exemplo, o que preconiza a harmonia do ser humano com a natureza, bem como a aceitação de suas leis; e o que ele denomina “Ordem Universal”, força lógica e benevolente que organiza o Universo.
Tal qual outras filosofias, entre as quais o Racionalismo Cristão, a do estoico imperador também afirma ser o homem composto de três elementos: o corpo físico, o corpo anímico (em latim, “anima ”, pronuncia-se “ânima”) e o espírito, “intimamente vinculados à Ordem Universal”. O homem, diz Marco Aurélio, é cidadão do Mundo e parcela da Natureza Eterna, à qual volta após a morte do corpo físico.
Segundo um estudioso, a obra Meditações, além de constituir uma demonstração de confiança na razão, é também uma fonte inspiradora de coragem ante os reveses, obstáculos e adversidades do viver terreno.
Pequeno e importante. “Nunca um pequeno livro terá sido, até hoje, tão importante na seara filosófica quanto as Meditações de Marco Aurélio” – disse-nos certo dia o então já idoso e venerando Ângelo Daversa, de saudosa memória, antigo professor de filosofia de um seminário, em Pernambuco, e caro mestre que temos citado aqui algumas vezes.
A filosofia estoica exerceria profunda influência sobre o cristianismo primitivo, que, tendo chegado a Roma ali pela metade do século I d.C., começava a difundir-se na época em que os três maiores representantes do estoicismo romano, Sêneca (4 a.C-65 d.C), Epicteto (50-135 d.C) e Marco Aurélio (121-180 d.C), tinham escrito suas obras.