Ponderação, moderação, valor e justiça

A sequência de palavras que dá título a este artigo foi criada e aplicada por Luiz de Mattos, fundador da filosofia Racionalismo Cristão, em seus artigos publicados pelo Jornal A Razão em diversas ocasiões na coluna Notas. Igualmente, assim o foi em obras editadas pela instituição depois de seu falecimento, em 1926. E, após sua desencarnação, nas suas orientações espirituais, por muitas vezes quando alçado à condição de Presidente Astral do Racionalismo Cristão. Tal é a importância dos conceitos e utilidade que cada um desses termos subentende que nos motivou a escrever esse artigo desenvolvendo mais amplamente o real sentido dessas palavras.

Ponderação. O termo ponderação é aplicado com o sentido de precaução, sensatez de julgamentos, cautela e seriedade na avaliação de juízos e fatos. Em contradição, temos as palavras insensatez e leviandade. Ponderar é adotar uma linha de equilíbrio entre os extremos, entre o excesso e a escassez, tanto na atividade pensante e racional como nas atitudes da vida humana. É uma palavra que justifica o dito popular “a virtude está no meio”. Daí porque, devemos sempre nos alinhar com o bom senso que supera o senso comum.

Moderação. Moderação tem um sinônimo quase perfeito que é prudência, também uma verdadeira virtude. Quem tem prudência demonstra moderação e vice-versa. Essa palavra subentende um conteúdo bem mais simples do que ponderação. É a atitude de quem não comete excessos, da pessoa que não usa exageros em suas manifestações e reações. Continuando nessa peroração, as pessoas que têm esse atributo são tranquilas, comedidas e, sobretudo, prudentes. É uma condição que guia as pessoas a errar menos e acertar mais por não agirem intempestivamente às contingências da vida. Em contrapartida, elas cumprem melhor os seus deveres em todas as circunstâncias.

Valor. O vocábulo valor tem origem latina na palavra valere e nos remete tanto para a ideia do merecimento moral como à da ética que se impõe, primordialmente, à consciência do todos nós, como também à ideia de força e poder de sermos influenciados por fatos e objetos de ordem material.

Na vida, a palavra valor tem diferentes acepções, tanto materialmente como filosoficamente. Do ponto de vista meramente material, ela é quase sempre utilizada junto com um adjetivo qualificativo como, por exemplo, valor econômico, valor financeiro, valor venal etc. Há, também, não devemos nos esquecer, os assim-chamados valores sociais, que podem ser enquadrados como políticos, estéticos, ecológicos, religiosos etc. Vejam a hierarquização dos valores numa escala apresentada no parágrafo seguinte.

De acordo com Max Scheler (1874-1928), filósofo alemão, os valores de nossa realidade material são objetivos e se organizam na seguinte escala de importância: ético é o juízo sobre o bem e o mal e refere-se ao que é vital no convívio humano; moral abrange a ação normativa do comportamento, costumes, hábitos, normas e leis e refere-se ao convívio humano em sociedade;  material é o juízo sobre o que é necessário para a sobrevivência humana; religioso é o juízo  sobre o que é bom para o espírito e diz das coisas da alma; estético, que opera um  juízo  sobre o belo e o feio e refere-se às coisas do mundo sensível, da natureza; e, finalmente, valor de utilidade, que se refere ao juízo do que é melhor e pior e diz respeito às coisas e aos objetos. Observamos que o autor  dessa escala colocou o valor espiritual como valor religioso. Ainda, de acordo com o autor dessa escala, “atribuir valor a uma coisa é não ficar indiferente a ela. Isto é a principal característica do valor”.

Todavia, interessa-nos aqui examinar o seu sentido moral e ético ou, mais extensivamente, o seu sentido teórico-filosófico-espiritualista, precisamente, com destaque para o sentido espiritual que fala diretamente à nossa consciência.

Assim, valor é uma palavra de sentido amplo que expressa a qualidade atribuída a quem tem certas virtudes de ordem moral e espiritual, como mérito ou merecimento intrínseco. No sentido figurado, o vocábulo valor consubstancia apreço, afeto, estima, consideração, talento etc. Mas também, ainda no sentido figurado, valor denota coragem, valentia e bravura para enfrentar as vicissitudes da vida. Enfim, valor se impõe à nossa consciência de uma maneira peremptória e obrigatória à nossa natureza de Homo sapiens em evolução na qualidade de seres humanos que somos.

Não temos aqui espaço para discorrer sobre a Teoria dos Valores, algo mais profundo cujo estudo cabe à Axiologia, capítulo especial da Filosofia. A propósito, axiologia é uma palavra cuja origem etimológica vem da língua grega, onde “axi” significa “valor” e “logos” significa “estudo ou tratado” – ciência do valor ou tratado dos valores. Mas devido ao processo evolutivo da Força que no homem tornou-se espírito individualizado, cabe à intuição, aos sentimentos e às emoções o conhecimento direto dos valores que repercutem em nossa mente e em nossa consciência como balizamento de nossa espiritualidade.

Esse é o apanágio que nos leva a praticar o bem como dever espiritual sintetizado nas palavras moral e ética. Sobre o significado desses dois termos já cuidamos no livro de nossa autoria Virtudes eternas com os títulos Ética, moral e moralidade (página 43) e Moral e moralidade à luz do espiritualismo (página  26).

Seria possível vivermos à margem dos valores em nossa sociedade? Com certeza a resposta é não. A evolução não se concretizaria e a humanidade não teria chegado à posição civilizatória a que chegou até os dias atuais indicando um futuro brilhante para o viver humano neste nosso planeta Terra.

Justiça. Sob o crivo da moral espiritual, o sentimento de justiça é natural por derivar das leis naturais e imutáveis. E sendo natural, a justiça faz parte dos atributos do homem, lhe é inata. Como as pessoas não são perfeitas, suas interpretações sobre o que é ou não justo são díspares, o que as leva a julgamentos equivocados sobre o que é correto e o que é incorreto. Toda criança, mesmo em tenra idade, sabe muito bem o que é certo e o que é errado no âmbito dos fatos e das coisas que já conhece no ambiente em que vive.

Mas, afinal, em que consiste a justiça? A justiça consiste em dar a cada um o que lhe é próprio, o que lhe pertence por respeito aos seus direitos.

Primordialmente, os direitos decorrem das leis naturais, em seguida, das leis humanas que variam em função da cultura de cada sociedade constituída e estruturada segundo cada país, levando-se em conta os costumes e crenças pré-estabelecidas. São essas leis que consagram os direitos e deveres dos homens e regulam os relacionamentos em sociedade.

A base da justiça ensejada pela lei natural decorre da regra de ouro de Jesus Cristo: “não querer aos outros aquilo que não quer para si mesmo”. É sempre necessário perguntar-se como desejaria que as pessoas agissem com você nas mesmas circunstâncias, tomando mentalmente a posição de seu semelhante. No fundo, é preciso estar em paz com sua própria consciência.

É claro que viver em sociedade não é fácil, pois precisamos respeitar os direitos conferidos aos nossos semelhantes individualmente ou decorrentes das leis humanas vigentes, pois assim estaremos sendo justos e praticando a justiça. Reforçando, é sabido que a vida em sociedade confere-nos direitos, mas também exige o cumprimento de deveres. Fora dos limites da lei impõe-se um freio, salvaguardas aos direitos de cada um, aplicando-se sanções em função do desvio legal que tenha ocorrido.

Praticar o bem sem olhar a quem ou o amor ao próximo assegura a prática da justiça em toda sua inteireza e confere ao homem um viver tranquilo de acordo com sua consciência, resguardando-o de todo o mal. Então, ele será um verdadeiro justo.