Em uma época como a atual, em que o individualismo, por um lado, e o relativismo, por outro, são presença constante em nossa sociedade, ocasionando fortemente o distanciamento entre as pessoas, convém praticar as iniciativas fraternas como importante fator de união. Dentre elas, destacamos a prática da higiene mental dentro do lar, fundamental para o bom relacionamento em família.
Ao suscitar a presente reflexão, pretendemos, inicialmente, destacar que toda pessoa comprometida com seu aprimoramento espiritual e com o bem-estar próprio e coletivo se sente inevitavelmente impelida a religar-se com os campos superiores da espiritualidade, com o Transcendente. Essa sublime conexão se alcança com os mais auspiciosos resultados quando realizada em conjunto por pessoas que se amam, se respeitam e nutrem um forte sentimento de benquerer em relação ao gênero humano, daí a relevância desse hábito no lar.
Acreditamos que grande parte da sociedade, depois de vivenciar um período de entrega aos conteúdos do progresso estritamente material, começa a entrar num estágio de maior conscientização dos valores espirituais, bem como da vivência desses valores no seio da família, como destaca o Racionalismo Cristão.
Em que pesem as opiniões pessimistas tão facilmente corriqueiras na atualidade, percebemos um crescente número de pessoas sensíveis à dignidade da união familiar, que congrega e fortalece seus membros gerando solidariedade, fraternidade e empatia. Em verdade, o ser humano se realiza quando convive bem com seus parentes, quando se empenha em reforçar constantemente os laços afetivos presentes na família. Uma sociedade, por seu turno, se estabiliza quando tem a família como alicerce e referência.
A autorreflexão significa para o espírito abertura a novas perspectivas, que sejam incondicionadas e livres de preconceitos. É na intimidade que todos têm a possibilidade de se reconhecer, entendendo a essência e o sentido da vida. O tema desta reflexão ecoa, de certa forma, a necessidade humana de entender a si próprio para depois compreender seu semelhante, estabelecendo com ele um intercâmbio respeitoso e profícuo. Portanto, a autorreflexão enseja um caminho de vivência dos valores que devem nortear a vida do ser humano, despertando nele a magnitude da espiritualidade.
Sabemos que o dinamismo do Universo é uma realidade indiscutível. Nesse sentido, quando sugerimos uma pausa diária para reflexão, não pretendemos que a estagnação seja uma possibilidade admitida por nossa Filosofia. Estamos tão somente nos utilizando de uma figura de linguagem para transmitir um conhecimento importante.
Os preceitos filosófico-espiritualistas que o Racionalismo Cristão divulga e defende orientam a todos que mantenham o pensamento firme e elevado em todos os momentos da vida, pois são as verdadeiras convicções que impulsionam o ser humano e o fortalecem para superar as adversidades e os desafios que se apresentem no caminho. É importantíssimo, pois, que façamos diariamente uma introspecção, a fim de reavaliar a qualidade de nossos pensamentos e sentimentos, dos relacionamentos que estabelecemos e dos ambientes que frequentamos. É preciso revisitar regularmente nossas convicções, que devem se dirigir sempre para a prática do bem e para a valorização da família – o núcleo natural e fundamental da sociedade, conforme preceitua a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
É mesmo de notar que, dentre as famílias que conhecemos, as mais unidas se distinguem por cultivar de forma disciplinar, com particular zelo e perseverança, momentos de recolhimento e elevação espiritual.
Não há por que existir concorrência entre as atividades ditas materiais e as atividades espiritualistas: uma implica a outra, e cada uma tem seu espaço próprio de realização. Aponta nessa direção a síntese dos princípios racionalistas cristãos, na medida em que realça a virtude de comedimento, estimulando-nos a dividir o tempo de forma inteligente.
Ao ser humano não é producente esforçar-se por descobrir um critério discriminativo capaz de distinguir as dimensões material e espiritual, separando de tal modo suas atividades. Sendo o ser humano a fusão de dois elementos – quais sejam, espírito e corpo –, a dimensão espiritual abrange todo o círculo de suas atividades, não devendo, por conseguinte, ser negligenciada.
Sufocada a dimensão espiritual, fica o ser humano impossibilitado de levar a cabo seus objetivos, mergulhando numa formalização de atos de cunho meramente materializados e grosseiros, que o separa dos domínios da realidade e das esferas da razão e o faz entrar em conflito consigo mesmo, ou seja, com a órbita de sua própria finalidade.
Com certeza, a crise psíquica que atravessa a sociedade contemporânea, exteriorizada pelos índices alarmantes de pessoas que sofrem de depressão e patologias associadas, outra coisa não significa senão uma crise espiritual. Mostra-se então de máxima urgência o estímulo de uma higiene mental que revigore o espírito, clareando as ideias e restabelecendo o equilíbrio emocional. Melhor será, sem dúvida, se tal prática for replicada dentro do lar, onde é capaz de estreitar laços e fortalecer a família.
A ética, a conduta honesta e os momentos reservados para a sublimação dos pensamentos estão profundamente interligados, pois unem a espiritualidade e a vida prática, proporcionando ao ser humano uma experiência de autêntico e sustentável crescimento moral.
Quando os valores anteriormente mencionados são vividos em família, todos os envolvidos são convocados a desenvolver de maneira integral a soma dos atributos que compõem sua própria essência. Essa ampliação de perspectivas, que surge da compreensão transcendente da vida, está circunscrita a um processo, a um itinerário. Não se trata de um ato taxativo que se realize de uma só vez.
Quando um ser humano negligencia as demandas relacionadas a sua dimensão sutil, ressai o risco considerável de que descambe para a insensatez, e esta, por seu turno, é sempre uma ameaça à vida produtiva e fecunda e, sobretudo, ao bom relacionamento familiar.
À medida que o ser humano amplia seus conhecimentos no campo da espiritualidade, interessa-se cada vez mais pelas consequências de seus atos. Compreende sua responsabilidade e o valor de seus atributos, libertando-se dos impulsos materializados que reduzem seu campo de visão.
Não é fechando-se em si mesmo que a pessoa alcançará sua evolução, mas abrindo-se para as dimensões que a transcendem e obtendo sua liberdade. Vocês compreendem, amigos, a importância da higiene mental como prática fortalecedora?
Nessa visão, o espiritualista valoriza o exercício da higiene mental, mas não o superexalta: sabe, pois, que este é uma ferramenta, enquanto o artífice, aquele que comanda seu livre-arbítrio, é o espírito.
Mais do que metas, o estudioso da transcendência tem ideais, e refletindo sobre tudo o que foi dito, constata-se o quão profundamente se interpenetram a vontade de estabelecer um bom relacionamento familiar e a necessidade de refletir e elevar os pensamentos em momentos oportunos, inclusive no ambiente doméstico. Sabemos, pela nossa experiência, que por vezes será difícil reunir os membros do lar para o exercício da higiene mental. A força do hábito, entretanto, auxiliará significativamente nesses momentos.
Procuramos aqui enaltecer, acima de tudo, a legítima articulação entre a dimensão física e a espiritual, pois quando os preceitos da espiritualidade não são praticados na vida cotidiana, o discernimento ético do valor dos relacionamentos saudáveis, seja na família, seja em qualquer outro ambiente, corre o risco de descambar para um discurso superficial, ineficaz, vazio de sentido.
Da mesma forma, quando a prática da higiene mental no lar não se dá de maneira ordenada e metódica, elevada e sublime, quando assume características distintas daquelas preconizadas pelo Racionalismo Cristão – cuja nota suprema foi sempre a disciplina –, surgem ambiguidades e equívocos deploráveis, que dão ensejo a confusões as mais lamentáveis, porquanto a desordem e o misticismo empurram o ser humano a situações que conduzem ao descontrole emocional e ao desequilíbrio psíquico.
Muito Obrigado!