A promulgação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) está sendo vendida como a solução para todos os males da tributação no Brasil: empresários recolherão menos impostos, apesar disso o governo arrecadará mais, o povo experimentará a chance de consumir mais e melhor, porque os salários terão maior poder de compra… Viva! Não se tem enfatizado, mas certamente em pouco tempo real e dólar americano chegarão à paridade um por um, sem necessidade de desvalorização, e a Petrobras será a maior empresa do mundo. Será a sopa no mel ou mais uma grande mentira que políticos nos estão impingindo num processo que já está em andamento com o beneplácito das maiores autoridades do país, aquelas em que o povo mais confia.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC 45) de que resultam as novas regras de tributação data de 2019, foram quatro anos de análises, pareceres, emendinhas, discussões, puxa a sardinha pra lá, puxa a sardinha pra cá, e eis que nasceu a esperada criança, segundo seus defensores, o governo federal à frente, perfeita, bonita e saudável. Não há que se negar a tentativa bem intencionada da mudança, cuja expectativa é que, com a reforma, o Brasil entre em novo ciclo de aumento da produtividade, do investimento e do Produto Interno Bruto (PIB).
Não se pode porém esconder que o ato de promulgação, presentes as mais altas autoridades dos três Poderes e outras nem tanto, não foi um mar de rosas. Já nas votações em primeiro e segundo turnos, na Câmara e no Senado, a Oposição demonstrou representatividade e força. Foram placares favoráveis à aprovação, superando com boa margem de segurança os 308 votos necessários, mas o número de contrários foi significativo e deve ser lembrado sempre que eles constituem elevado percentual da população do país, pois que tais votos foram dados pelos parlamentares que a representam. Na sessão solene, os contra revidavam a aclamação dos a favor com gritos ofensivos, a maioria dirigida ao presidente da República. Este, em êxtase, exalava felicidade e ria como se fosse surdo ou não entendesse o que se passava.
Há muito detalhe a ser regulamentado para que a reforma se efetive e entre em vigor. Mas não precisa pressa: a mudança, o descarte dos atuais impostos e o início da vigência dos novos, se estenderá de 2026 a 2033. Quando for passado um terço de século saberemos se a implantação do IVA não foi a troca de seis por meia dúzia. A melhor parte da reforma, a transição da tributação na origem (onde a mercadoria é produzida) para o destino (onde é consumida) durará 50 anos.
Repassemos o tal IVA (o imposto tem uma sigla terrível; ao digitá-la é preciso muito cuidado para evitar que apareça IVO, UVA, AVO, VOA, VAI, OVO, OVA), tema amplamente divulgado e comentado nos jornais, TV e sites especializados. Na verdade são dois IVAs, um referente aos impostos federais e outro relacionado aos dos estados e municípios. São criados o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), substituindo o ICMS dos Estados e o ISS dos municípios; a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que substitui PIS, Cofins e o IPI, que são federais e vão desparecer; e o Imposto Seletivo, que incidirá sobre produtos danosos à saúde e ao meio ambiente.
Muitos anos passaram até chegar a votação da PEC que provocaria a mudança do sistema tributário e ainda muitos passarão até que seus efeitos se tornem reais.
Há uma torcida fervorosa dos brasileiros para que as previsões incluídas na Constituição da República sob a forma de emenda se concretizem. Restam, porém, algumas perguntas que Suas Excelências que votaram e promulgaram, numa desmedida farra cívica, a alardeada maior reforma tributária desde a ditadura militar, deveriam vir a público responder: em que a mudança do processo de tributação alcançará o povo em suas maiores necessidades além da alimentação: saúde, educação, transporte, saneamento básico e lazer, por exemplo? Reaparece aí a velha amiga, que estava recolhida, mas não esquecida: a esperança, a esperança de que essa parafernália literária proclamada no plenário da Câmara dos Deputados não traga benefícios apenas para empresários e governos, mas também para o sofrido povo que tem bancado a festa sem direito a participar dela.