Racismo, princípio defendido e adotado pela escória humana

Ultimamente A Razão tem tratado de temas que fogem à limitação da espiritualidade, como bem poderia ocupar-se por se tratar de um órgão de divulgação do Racionalismo Cristão, mas essa ampliação de assuntos com um leque de temas que afetam o dia a dia do brasileiro e de seu país é um retorno às suas origens, conforme anunciou seu fundador, Luiz de Mattos, o que se revela no editorial da primeira edição, intitulado Nossa Razão de Ser, que ocupava toda a primeira página. O fundador do Racionalismo Cristão e de A Razão desafiava as publicações concorrentes e anunciava aos seus leitores: “A crise que atravessa a sociedade brasileira, demasiado séria para ser tratada e resolvida com paliativos e contemporizações, está a exigir remédios heróicos e enérgicos. Impõe-se a verdade, fira a quem ferir, dita ora com calma, com serenidade, com frieza, ora com violência, com impiedade, com escândalo mesmo. Mais que econômica ou financeira, é moral a crise nacional.”

 Essa volta nas abordagens chamou a atenção dos leitores e dividiu opiniões, conforme e-mails que a direção e a redação têm recebido. Estejam certos, senhores, A Razão se manterá firme aos propósitos de Luiz de Mattos, sem descuidar de seu compromisso com as propostas, discussões e soluções contidas nas informações que divulga sobre o Racionalismo Cristão e suas atividades nos quatro cantos do mundo.

É com base no exposto que A Razão aborda nesta edição uma questão que muito incomoda as pessoas de bom senso e sentimento humanitário, capazes de sempre ver seu semelhante como um igual, um irmão, sem identificar estranhezas entre os portadores de pele diferenciada pela cor. De pronto entendamos que essa cor de pele, além de uma opção do espírito, foi algo que a natureza nos impôs e que por isso devemos amar e respeitar, a nossa e a de nossos semelhantes. Racionalistas cristãos sabem que essa condição foi uma das escolhas do espírito em seu campo de estágio.

Este não é assunto que se esgote num artigo de quarenta e poucas linhas, nem essa é a pretensão deste jornal. Então, A Razão aborda aspectos mais flagrantes dessa odienda prática que alcança todas – todas – as camadas da sociedade, no Brasil e fora dele. Na verdade, bastariam quatro ou cinco linhas se o jornal fosse nomear os racistas apenas como cretinos, safados, imundos, ou em um nível menos agressivo e mais educado, como desumanos, covardes, desleais com suas origens e com as origens e formação do país. Não é, porém, do feitio de A Razão o linguajar chulo, daí por que se refere aos racistas como desumanos e espiritualmente cegos, porque não veem como irmãos pessoas de pele negra.

Negro, branco, mulato, cafuzo, sarará, chinês, japonês, coreano, malaio, indígena do Brasil ou dos Estados Unidos, aborígenes, habitantes dos trópicos, das calotas polares, das cidades ou das selvas são diferentes em que além da cor da pele e o entorno da cavidade ocular mais ou menos aberta? De uma maneira menos estudada, menos intelectualmente tratada, excluídos os aspectos antropológicos que poderiam levantar argumentos em favor de diferenças, conclui-se que todas as pessoas na Terra são iguais. Numa visão simplista se tem que todas são física e intelectualmente capazes. De que precisam, então, para igualar-se na capacitação para desempenho de tarefas de alta complexidade? Certamente da mesma base, de igual trato desde os primeiros anos, ou, de modo objetivo, de igualdade desde a origem. Os filhos de um casal de negros e de um casal de brancos são semelhantes e requerem iguais cuidados antes, durante e após o nascimento. Se crescerem juntos, frequentarem os mesmos colégios, com iguais recursos de material didático, e os mesmos clubes, tiverem amigos comuns, irão para a faculdade juntos, se aperfeiçoarão juntos e serão dois destacados membros da sociedade, cidadãos respeitados e admirados.

Não é possível negar que o desenvolvimento intelectual não depende apenas das origens, dos ambientes e dos relacionamentos, mas está condicionado ao interesse de cada um desde que superam a fase de bebês e as seguintes até tornarem-se adultos, e nesse percurso vão fazendo suas escolhas: as crianças brancas assumindo os costumes dos pais; as negras, o que viam entre os personagens que enfeitaram sua origem, sua adolescência, a preguiça, o desinteresse, as facilidades. De onde vêm essas opções? Há quem sustente que é da falta de atenção e cuidados das autoridades, e nós entendemos que vêm desde a vida intrauterina, quando não recebiam sequer alimentação apropriada, assistência médica…

Engraçado, essa carga discriminatória está calcada nos negros e seus descendentes, nunca sobre outros tipos cuja aparência física difere consideravelmente da chamada raça branca. Esses são até benquistos, tratados com respeito e amabilidade. Parece que entra aí uma parcela de dependência econômica. Autoridades estimulam o desconforto ao estabelecer “vantagens” altamente discriminatórias para índios e principalmente afrodescendentes. Ora, somos iguais ou não? Todos podem disputar em igualdade de condições as oportunidades, não são doentes, mutilados ou lesados. São inteligentes, capazes, só precisam da base que sustenta os brancos. Ainda há poucos, mas eles estão por aí igualando-se em brilhantismo aos que se julgam superiores, ainda que sem buscar ofuscá-los, e sem essa pretensão, mas confirmando a indiscutível igualdade.

Aí estão esses afrodescendentes em destaque principalmente nas letras, nas artes e nos esportes, na força de trabalho, desde os primeiros tempos nestas terras que ajudaram a firmar-se e a crescer, quando eram alvo da chibata e outros castigos, e fizeram a fortuna de tantos que hoje os rejeitam. A muito custo e após muita maldade foi-se a chibata, mas outros castigos se mantiveram e novos sugiram e se desenvolveram, como o maior de todos: a discriminação racial. A negritude tem seu espaço e seu momento, cor de pele não determina raça entre membros da verdadeira raça, a raça humana.

Não nos apegamos, neste momento, aos altos estudos intelectualizados desenvolvidos com base em pesquisas sobre o regime escravagista, as lutas pela abolição e o ato decisivo da Princesa, porque geralmente eles nascem da parte da sociedade que pensa, que decide, que tem posses, que manda… a classe dominante política, econômica e financeira, ainda que sem a total conotação marxista. Interessaria, se os intelectuais desenvolvessem seu exaustivo trabalho de campo nas favelas, menos que isso, para não os sacrificar, nos trens e metrôs lotados em que os trabalhadores (maioria negra e mestiça) se acotovelam para chegar ao emprego que lhes rende pouco mais que o feijão com arroz da cada dia.

É de se perguntar, prezado leitor: você é negro ou branco? Não responda, por favor. Lembre-se apenas de que você é uma pessoa, e pessoas não trazem bandeirinhas coloridas nem etiquetas a lhes enfeitar a testa ou escondidas nas axilas. De outra forma poderíamos ter pessoas tachadas de azuis, verdes, cinzentas… Se fosse possível uma escala de valores entre os humanos, certamente o racista estaria abaixo do nível mínimo.

Todos conhecem a história, quer em profundidade, quer de terem ouvido falar, e sabem que a tal abolição da escravidão foi uma das mais sensacionais mentiras históricas que nos impingiram quando frequentávamos as primeiras séries dos bancos escolares, porque atirou no nada quem ainda tinha casa e comida. Não houve a necessária preparação, suporte para a mudança tão radical de situação, daí a formação de favelas e a acomodação à subserviência e condição social inferior. Negro liberto não sabia o que fazer porque não conhecia o que era liberdade. Não tinha estudo nem profissão, só sabia cortar cana, nas épocas apropriadas, colher café, debulhar milho e, quando domésticos, carregar barricas de cocô dos senhores e senhoras para lançar na praia e manter a cidade limpa. A lei lhe deu liberdade. Que liberdade!

De repente voltamos ao velho e distante, mas não esquecido, mote: a esperança. A Razão tem esperança de um dia publicar extensa e robusta reportagem sobre, finalmente, se estabelecer igualdade entre as pessoas, com relação à cor de sua pele. Outras diferenças talvez levem mais tempo para desaparecer, mas nenhuma é mais agressiva que o racismo. É importante que todos tenham os mesmos direitos – e obrigações, é claro – respeito, dignidade. E demonstrem essas virtudes, e apliquem-nas quando oportuno. Esse fortalecimento moral afastará as injustiças no trato pessoal, eliminará as ofensas e xingamentos, valorizará a qualidade dos relacionamentos, fará desaparecer os olhares de banda, os cochichos maldosos e tudo mais que possa indicar falsidade e desprezo com relação aos afrodescendentes.