Realidade essencial

Encontrar a realidade essencial inserida no fluxo das ações cotidianas para fortalecer cada vez mais seu propósito de autoaperfeiçoamento é o principal desafio da pessoa espiritualizada, que procura meditar antes de agir e de forma alguma atua irresponsável e impetuosamente. Em sentido contrário, está o materialista contumaz, para quem o que conta não é a necessidade de reflexão profunda e aprimoramento do caráter, mas a ânsia em buscar a satisfação dos sentidos e a acumulação de bens. Procuraremos, nesta reflexão, analisar esse tema.

O materialista considera a vida não como a atuação conjunta entre o espírito e a matéria, mas como o desenrolar de fatos desconexos, improvisados e sem uma finalidade sublime e superior. Embora o reconhecimento da vida não tenha para ele espaço na verdadeira racionalidade, mas na superficialidade própria do campo sensorial, há determinados momentos de sua trajetória em que ele se depara com um vazio existencial que nenhuma sensação ou conquista é capaz de preencher: eis uma contradição para a qual a sociedade do consumo não encontra resposta.

Opondo o raciocínio à imaginação, a força de vontade à emoção fugaz e a arte de governar a própria vida à teoria do acaso ou do destino, procuramos, em todos os nossos trabalhos – e não apenas na presente reflexão –, tornar claras as insuficiências e carências resultantes de um estilo de vida que despreza os valores espirituais. Quer se trate da pessoa erudita, quer se trate daquela que possui um conhecimento padrão, quer se trate, ainda, da pessoa que não teve acesso aos bens da cultura, todos devem se abstrair, por meio da abertura à espiritualidade, das limitações impostas pelo pensamento materialista tão em voga nos dias que correm.

As marcas do discurso contemporâneo, que insuflam a vaidade, o desejo de posse, o fascínio pelo poder e o preconceito – mesmo que velado – tão presentes nas mídias em geral, autorizam-nos a considerar que a atitude de considerável parte da humanidade ante os fatos cotidianos é não apenas despojada de transcendência, mas sobretudo contrária aos valores do espírito, o que é muito grave, indevido e injustificável.

Embora o conhecimento humano tenha se projetado nos últimos séculos de maneira admirável e surpreendente, resultando, na atualidade, em uma proliferação de universidades e de espaços de pesquisa em todo o mundo, os filósofos, cientistas e acadêmicos de forma geral não se têm dedicado ao estudo sério da espiritualidade, da realidade essencial que interpenetra todas as coisas. As consequências de tal descaso têm custado muito caro à sociedade. Na contramão desse estado de coisas, a pessoa espiritualizada trabalha, pesquisa e elabora conteúdos – como fazem os autênticos estudiosos dos ensinamentos do Racionalismo Cristão – a fim de libertar o gênero humano das amarras da angústia, da depressão e das mais diversas formas de dependência.

A nosso ver, o que motiva as melhores escolhas e as decisões mais acertadas no caminho do esclarecimento espiritual é a identificação do ser humano com princípios absolutos que gerem segurança e estabilidade. Não há dúvidas de que a relatividade deve ter espaço em muitos setores da vida humana, mas há também determinados valores que só existem de forma absoluta. Dir-se-ia que a relatividade se liga a opiniões e envolve questões aceitáveis, mas a verdade autenticamente considerada não pode ser relativizada, pois está no campo da imutabilidade, ou seja, do absoluto. Tal entendimento é condição sine qua non para a paz e a harmonia interior.

Em nossa introdução, falamos sobre o principal desafio da pessoa espiritualizada e de como ela reage ante as circunstâncias com as quais se depara, desdobrando o assunto no decurso desta reflexão. Não temos, contudo, razões para limitar nossos estudos a um tema fechado. Falamos de espiritualidade difundida pelo Racionalismo Cristão e, dessa forma, tratamos de uma realidade globalizante que tudo sustenta e interpenetra. O objetivo da presente reflexão é, acima de tudo, fortalecer os seres humanos e fazê-los olhar para dentro de si mesmos, a fim de reconhecerem o manancial energético que transportam em seu íntimo e a perda de tempo em que consiste o apego às sensações materiais.