Os relacionamentos familiares afetivos e duradouros, embora comportem contradições e desafios consideráveis, representam, em termos abrangentes, a base das sociedades bem constituídas e estáveis – uma significativa conquista obtida pelas pessoas que se dedicam à estruturação de uma de vida feliz e harmônica.
Todos os relacionamentos têm, necessariamente, suas expressões características. Por vezes, compreende-se que eles se originam como um impulso para a satisfação pessoal, ou um simples recurso para atender a determinados padrões egoístas presentes na personalidade humana. Mas esse pensamento é deveras limitado: os verdadeiros relacionamentos consolidam-se por meio do respeito, da renúncia e sobretudo do amor; representam entrega, que traz consigo alegria, embora muitas vezes acompanhada de choques e dificuldades.
Esclarecida a dimensão superior dos relacionamentos fecundos e tendo presente seu horizonte espiritual, procuraremos abordar nesta reflexão os subsídios necessários para que os nossos leitores compreendam quais são os fundamentos para a edificação dos relacionamentos familiares longos e felizes.
Excluir a concepção espiritualista do campo das relações humanas não libera as pessoas para a vivência de um relacionamento sem limites ou critérios, mas as escraviza na esfera das paixões, do desrespeito e da leviandade. Em outras palavras, a pessoa que desconsidera a importância da espiritualidade, que vive preocupada exclusivamente com os fatores materiais que envolvem o convívio familiar, por exemplo, desvincula-se de suas raízes, acabando por sentir-se insegura, sem chão.
O ato de amar, sem o qual não se sustentam as relações familiares, também implica afabilidade, isto é, uma conduta terna e delicada.
Os comportamentos e expressões de quem ama são agradáveis, jamais ásperos e duros. Tal pessoa não se sente confortável em fazer seu semelhante sofrer; muito pelo contrário: canaliza suas energias de tal forma que a amabilidade não lhe seja um estilo de vida, mas uma obrigação moral.
A atitude de ternura constrói relacionamentos familiares saudáveis, vínculos positivos, fortes laços afetivos, beneficiando, portanto, toda a sociedade. É na ternura que a união conjugal, por exemplo, encontra estabilidade e consolidação reais. Os problemas individuais, a partilha das tarefas, a educação da prole criam problemas e conflitos, que só poderão ser ultrapassados se, além de existir responsabilidade por parte dos parceiros e respeito pela autonomia do outro, as partes estiverem dispostas a estabelecer uma conversa franca e terna. Com amor, carinho e diálogo, os cônjuges caminharão juntos, estreitando laços e desfrutando cumplicidades e esperanças cada vez mais crescentes.
Há muitas pessoas que acreditam que as crises familiares se dão por conta da imaturidade de seus membros; outras consideram que as adversidades sociais interpenetram o lar, desorganizando-o emocionalmente. Ambos os lados podem reunir argumentos em seu favor. É certo, porém, que mais significativos que os problemas familiares, sempre relativos e transitórios, são o caráter e a dignidade espiritual. É a estes que todos os membros do clã devem dar primazia. A única crise a ser por todos os meios evitada é a que ocorre interiormente: a crise dos valores espirituais.
Queremos deixar nítido, nesta conclusão, que a dimensão espiritual é um elemento-chave para o estabelecimento de relacionamentos saudáveis e consolidados, e que a maturidade espiritual de um ser humano se revela em sua capacidade de relacionar-se, sobretudo no âmbito familiar. Sabemos não existir relação familiar perfeita. Os relacionamentos familiares estão marcados por crises as mais variadas, que implicam em aprendizado e, não raro, intensificam o fluxo afetivo depois de superadas.
Desenvolver o hábito de dar verdadeira importância ao diálogo claro e bem articulado constitui um mecanismo fundamental para viver, exteriorizar e amadurecer o afeto que sustenta as relações, mas que exige um longo e perseverante aprendizado. No que diz respeito à vida a familiar, o modo de formular questões, o momento propício, o tom de voz, o tipo de abordagem são fatores determinantes para a eficácia da comunicação. “Lutar pelo amor é bom, mas alcançá-lo sem luta é melhor”, escreveu Shakespeare. Devemos admitir que, para que o diálogo seja profícuo, é importante que se tenha algo a comunicar, e isso requer um conteúdo interior que se obtém por meio de uma vivência fundamentada em princípios racionalistas cristãos, que enobrecem e dignificam todas as manifestações humanas.
Queremos reafirmar, enfim, a importância de se cultivar o amor, que não discrimina, que não faz juízo de valor e que tudo supera admiravelmente. Ensina-nos o grande poeta latino Virgílio: “O amor tudo vence; cedamos nós ao amor”. Cultivemos o amor cada vez mais intensamente, para o nosso próprio benefício e para o benefício daqueles com que convivemos em todos os momentos de nossas vidas.
Muito Obrigado!