Uma filosofia original e inovadora – IV

Conhecido também como “Doutor Invencível” e “Iniciador Venerável”, William de Ockham nasceu na vila de Ockham, nos arredores de Londres, em 1285 (ou 1288). Quanto ao ano de sua morte, há também duas hipóteses: 1347ou 1349.

Além de filósofo, William de Ockham foi teólogo e frade de uma das ordens religiosas fundadas por Francisco de Assis, mas por vocação mesmo, seria, acima de tudo, eminente filósofo, especializado em lógica, “parte da filosofia que trata das leis do pensamento e das regras que devem ser observadas na exposição da verdade”. É considerado o principal representante dos escolásticos nominalistas e o mais destacado concorrente da escola tomista (de Tomás de Aquino) e da escocesa (de Duns Scot), do qual foi aluno. 

 William de Ockham recebeu sua educação primária no Convento Franciscano Greyfriars, em Londres, e entrou para a ordem no ano de 1300. Completaria seus estudos na Universidade de Oxford, onde se revelaria brilhante aluno e, mais tarde, um dos mais ilustres professores de filosofia desse estabelecimento inglês de ensino.

Dois temas. A obra de Ockham, último grande filósofo da Idade Média, diz um estudioso, marcou a transição para o pensamento renascentista. Ainda segundo o especialista, seus escritos destacam dois temas: a defesa da “pobreza evangélica”, renegada pelo papa de então, João XXII (1249-1334), e as considerações de Ockham repudiando as pretensões de poder temporal por parte de João XXII e do clero em geral, atitude que, advertia o filósofo, “contrariava o exemplo deixado por Jesus”.

Ockham não poupava, em seus escritos contestatórios, os atos de autoridade abusiva do papa de seu tempo. Como é sabido, João XXII, a exemplo de papas anteriores e posteriores a ele, vinha extrapolando seus poderes de chefe supremo da fé católica com suas indevidas intromissões nas “questões terrenas” do poder laico.

 Suas discordâncias sobre conceitos dogmáticos de sua própria religião e os conflitos com o papa, somados às tantas adversidades enfrentadas, constituíram a razão precípua que levou Ockham a escrever textos polêmicos, “de cunho político-religioso”, imprimindo assim radical mudança em sua obra. Isso tornaria William de Ockham muito criticado e combatido pelos escolásticos, o que daria ao pontífice motivo para acusá-lo de heresia e até para excomungá-lo.

Em 1324, o filósofo teve de deixar a Inglaterra para defender-se da acusação, não em Roma, mas na cidade francesa de Avignon, que de 1309 a 1377 foi sede temporária do papado.

Porém, sem que se saiba por que, o julgamento de frei William de Ockham não resultou em grave punição, tendo se resumido a isto: durante determinado período foi impedido de voltar à Inglaterra e, enquanto permanecesse em Avignon, continuaria a fazer companhia a seus confrades no lúgubre e velho mosteiro da ordem franciscana. No entanto, dois anos depois, em 1326, lograria fugir para seu país e de lá, em 1328, para Munique, Alemanha.

Derradeiros anos. Nessa cidade, foi acolhido no convento de sua ordem, onde viveria seus derradeiros anos, ou seja, de 1328 a 1347. Seria um tempo de paz, de tranquilidade e intenso trabalho. Temas como a infalibilidade do papa e a defesa da tese de que a autoridade papal é limitada pelo direito natural e pela liberdade dos cristãos, “afirmada nos Evangelhos”, entre outros, foram abordados por ele.

O ockhamismo, esclarece um estudioso, caracteriza-se pelo empirismo, o nominalismo, o terminismo e pela não aceitação da pretensa certeza de que as chamadas “verdades da fé” podem ser demonstradas racionalmente. Ainda de acordo com o estudioso, a obra de Ockham “marcou a transição para o pensamento renascentista”.

Por sua vez, o já citado historiador do pensamento considera que, por dar destaque, acima de tudo, aos fatos e ao tipo de raciocínio utilizado no discurso racional, em detrimento de uma especulação metafísica sobre as essências, os conceitos filosóficos de Ockham são hoje considerados um prenúncio do empirismo inglês, da ciência moderna e da filosofia analítica contemporânea. 

Reza a tradição que nosso filósofo teria morrido vítima da peste bubônica, em Munique. Causada pela bactéria yersinia pestis, essa fatal epidemia, também conhecida popularmente como peste negra, matava o infectado em poucos dias (Ockham morreu em menos de cinco) e chegaria a ponto de dizimar grande parte da população da Europa no século XIV.

A título de curiosidade: também segundo a tradição, foi justamente durante os três anos de seu julgamento que William de Ockham teria escrito suas duas maiores obras – a Summa Logicae e o Tractatus de Sacramentis.