Vantagens competitivas na produção do etanol no Brasil
A intensa busca por energias alternativas para atender a crescente demanda no Brasil e no mundo faz com que determinados segmentos de fontes primárias de energias ganhem especial destaque. Com esse panorama, que nos parece inexorável e irreversível, sobretudo devido ao clamor dos organismos internacionais constituídos por pesquisadores de notório saber nas áreas atinentes às mudanças climáticas e que têm a colaboração de líderes de grande influência e da própria sociedade, nos coloca numa posição de grande relevância.
A natureza nos privilegiou com uma matriz energética predominantemente renovável. Procuramos nesse artigo, com a devida modéstia, fazer comentário sobre o álcool como um importante combustível, que, felizmente, está consolidado e perene nos dias de hoje.
O petróleo, uma das mais importantes commodities, é sujeito a flutuações no preço do barril, que é determinado pelo mercado spot de Rotterdã. Citemos o meado e os meses finais de 2007, quando o barril atingiu a marca histórica de US$ 100. Portanto, em virtude desse panorama, o álcool já adquiriu posição estratégica importante.
No contexto do mercado mundial, o Brasil é um dos atores principais, senão o mais importante. As vantagens da cana de açúcar para a produção de etanol no Brasil são inquestionáveis, quando comparado com os maiores produtores mundiais, em face de utilizarem alimentos do cardápio humano, como acontece nos Estados Unidos, que fazem uso do milho como a maior fonte para a produção do etanol, e na Europa, onde se recorre ao trigo e à beterraba.
Segundo a visão de especialistas e estudiosos, a agroenergia no Brasil não tem um perfil de produção que possa concorrer com a de alimentos, representando inquestionável vantagem competitiva, evitando, desta forma, reações de outros setores do estrato social, os quais teriam motivos indefensáveis para criar barreiras complicadoras para a expansão da produção do etanol. Essa vantagem estratégica se reproduz com relação a outras regiões do mundo, como Sudeste Asiático e Oceania, sendo que a demanda por alimentos e energia estão em ritmo crescente, muito embora a produção de etanol possa ser obtida por meio de outras culturas, por exemplo mandioca, sorgo e outras matérias primas.
Outra vantagem competitiva, que também ajuda a consolidar a posição privilegiada do Brasil, é que no nosso território a situação atual da produção de etanol a partir da cana de açúcar é muito superior a qualquer outra tecnologia comercial para a produção de bioetanol em larga escala no mundo e também em virtude do altíssimo coeficiente de redução das emissões de gases de efeito estufa.
A título de comparação, a tabela ao lado mostra a relação de energia produzida por energia consumida no caso do etanol de milho nos Estados Unidos, e do etanol derivado do trigo e da beterraba na União Europeia, onde se verifica que é muito inferior ao resultado energético da produção de etanol de cana de açúcar no Brasil.
Para reforçar ainda mais o lugar especial que o etanol pode ocupar, citamos que tanto os Estados Unidos quanto a União Europa decidiram aumentar em duas a três vezes a produção de biocombustíveis, nos próximos anos, sinalizando que esses produtos têm importância estratégica para os maiores consumidores de combustível do mundo.
Colaborando com esse panorama, mencionamos que o etanol é uma excelente alternativa principalmente como carburante, que existe basicamente sob a forma de álcool etílico anidro carburante (AEAC), que é utilizado como um aditivo que aumenta a octanagem da gasolina, e o álcool hidratado carburante (AEHC), que, por conter um teor d’água em sua composição, tem a sua utilização exclusiva nos automóveis conhecidos como “carros 100% a álcool ou dedicados”.
O álcool combustível pode ser misturado também ao óleo diesel, biodiesel ou utilizado em outras rotas tecnológicas, como na célula combustível e na aviação, embora seu uso nesse caso ainda, respectivamente, tem que superar obstáculos técnicos e econômicos, de modo que possa adquirir uma escala comercialmente viável. Não constitui redundância frisar a importante relevância do etanol para a diminuição dos impactos ambientais, o que lhe concede uma posição de realce no cenário nacional e mundial, pelas vantagens que possui quanto à redução de emissão de monóxido de carbono (CO), quando confrontado com os combustíveis de origem fóssil, contribuindo para a mitigação dos gases que aumentam o efeito estufa, estando, portanto, em consonância com os intensos movimentos que, hoje, envolvem todas as nações, como aconteceu na convenção em Bali, há dez anos, que tentou construir uma agenda para a sobrevivência, com qualidade ambiental, para o planeta.
Para o Brasil se vislumbrou uma oportunidade para conquistar grande fatia do mercado internacional com a possível exportação de biocombustível. O desafio é criar, desenvolver e manter uma matriz produtiva, economicamente viável, sustentável e competitiva no ambiente interno e externo.
A permanente criação de condições mínimas necessárias para que não se corra o risco de a cana de açúcar tornar-se uma monocultura, exige atuação conjunta dos setores públicos privado. É uma alternativa a mais para fomentar o emprego e a renda nacionais, sobretudo para as pequenas comunidades rurais, como na sua maioria é a do setor sucroalcooleiro, que tem um perfil adequado para se associar, por exemplo, em cooperativas.
As oportunidades estão criadas e o momento é bastante auspicioso para o etanol, e o Brasil não pode deixar de aproveitar essa oportunidade e não voltar a cometer erros que provocaram a descontinuidade do Programa Nacional do Álcool (Proálcool), lançado em 14 de novembro de 1975, por meio do Decreto presidencial nº 76.593, com o objetivo de estimular a produção de álcool para atender os mercados interno e externo, e evitar, mesmo de forma parcial, a dependência da política de preços praticada pela Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP). Desde essa época, os avanços tecnológicos continuaram até os dias de hoje, e o Brasil detém a supremacia na geração e difusão de toda a cadeia produtiva de açúcar e do álcool da cana. Outro desafio é consolidar o etanol como uma commodity energética na área dos combustíveis. Há obstáculos grandes a serem removidos no ambiente da Organização Mundial do Comércio (OMC), ocorrendo protecionismo das nações consideradas mais desenvolvidas técnica e economicamente.
Outro obstáculo para a expansão do consumo do etanol no mundo é que o mercado dos combustíveis fósseis é totalmente liberado e o de combustíveis renováveis sofre restrições mercadológicas, principalmente, das nações mais desenvolvidas, as quais têm enorme poder de barganha e de veto.
Contrapondo as dificuldades acima registradas no mercado internacional foi o fato de que o Brasil desenvolveu o carro flex, colaborando para incentivar o aumento da produção do etanol, e garantiu escoamento para o mercado interno. Citamos também como um aspecto interessante para incentivar a indústria da cana de açúcar, e, por conseguinte, a do etanol, a produção de energia elétrica a partir da biomassa vegetal, em uma escala maior do que é normalmente produzida. Esse setor conta com centenas de milhões de toneladas de bagaço, palha e pontas que ainda são desperdiçados nos processos de queima no campo e na utilização em equipamentos ultrapassados e de baixo rendimento operacional para gerar energia elétrica, como são, na sua grande maioria, as caldeiras.
O grande clamor é: energia gerada de fonte limpa e totalmente renovável, de baixo impacto ambiental, com o tempo de construção pequeno, quando comparado aos empreendimentos hidroelétricos de grande porte, frisando-se que pequenas usinas termelétricas podem ser construídas mais próximas dos centros consumidores, com o conceito de geração distribuída, que é bastante difundido na América do Norte e Europa.
Mais um aspecto importante da bioeletricidade é a complementariedade à sazonalidade da energia elétrica de origem hidráulica, podendo ser conectada à rede de transmissão do Sistema Nacional de Energia Elétrica, ou seja, os industriais do setor sucroalcooleiro, atuando como autoprodutores, gerando parte de suas necessidades ou tornando-se autossuficientes, possibilitando a venda do excedente gerado, auferindo uma renda que pode ajudar a alavancar o investimento no setor, melhorando o seu retorno. Enfim, as condições necessárias e suficientes estão postas e à nossa disposição.
Hilton Ferreira Magalhães
Engenheiro, professor, assistente do Racionalismo Cristão