A Idade Moderna (1453-1789) foi uma época ainda marcada pela maneira cruel como as seitas cristãs tratavam o fiel ou adepto que sustentasse opiniões contrárias a dogmas do cristianismo. No calvinismo e no luteranismo era expulso. No catolicismo era perseguido, torturado, julgado em tribunais da chamada Santa Inquisição e condenado à prisão ou a morrer queimado na fogueira, em praça pública. Por sustentar opiniões contrárias a dogmas do cristianismo, o livre-pensador Giordano Bruno foi vítima de expulsão e de morte na fogueira.
Esse filósofo, teólogo, matemático, astrônomo, mestre em mnemônica, inventor, poeta e adepto da liberdade de pensamento não se chamava, até os 17 anos, Giordano Bruno, e sim Filippo Bruno, seu “nome de batismo”.
Filho único de pais da classe nobre, Filippo Bruno nasceu em 1548, na cidadezinha de Nola (Itália). Em 1563, aos 15 anos, seus pais, Fraulissa Savolino e Giovanni Bruno, considerando que o filho tinha vocação para a carreira eclesiástica, puseram Filippo no convento da Ordem de São Domingos, ou Ordem Dominicana, em Nápoles. Com os frades dominicanos estudou literatura clássica (grega e romana), lógica, dialética, teologia e filosofia, sobretudo a de Aristóteles e a de Tomás de Aquino, os dois filósofos que, então, mais que nenhum, predominavam na escolástica, corrente filosófica da Igreja.
Foi na cerimônia em que recebeu, em 1565, aos 17 anos, o hábito de frade no convento que Filippo optou por se chamar Giordano. Lá seria ordenado sacerdote em 1572 e terminaria seus estudos de teologia em 1575. Em 1576, porém, por manifestar que não aceitava mais imagens de santos, apenas o crucifixo, bem como outras “ideias diferentes do senso comum” ou contrárias a preceitos teológicos da Igreja, Giordano Bruno teve de deixar o convento e ser levado para Roma, por “irmãos“ conventuais mais antigos, a fim de ser julgado pela Inquisição Romana.
Em 1579 Giordano Bruno não só abandonou o hábito fradesco como também converteu-se, em Gênova, à seita calvinista (fato mais tarde negado por ele em julgamento). Mas, por sustentar opiniões contrárias a dogmas cristãos, isto é, por heresia, foi excomungado e expulso da cidade em 1582.
Bruno voltou para casa, mas não tardaria a se despedir de sua Itália, para dar continuidade à sua “fase de peregrinação e fugas” através dos países da Europa, ensinando filosofia e a arte da mnemônica. Também lutaria pela união e tolerância religiosa entre cristãos protestantes e católicos. Nesse giro pela Europa, permaneceu dois anos em Londres, de 1583 a 1585, tempo em que esteve sob a proteção do embaixador francês.
Bruno questionava preceitos teológicos do catolicismo, como, por exemplo, o da Santíssima Trindade (Pai, Filho e Espírito Santo). Não aceitava imagens de santos, apenas o crucifixo. Reprovava a violência por parte da Igreja contra os que discordavam dela, como prova, aliás, sua “tenaz e obstinada recusa a retratar-se diante dos tribunais inquisitoriais, o que resultou em sua condenação e morte.
Ademais, defendia ainda a infinitude do espaço sideral, o que também ia de encontro ao preceito da Igreja segundo o qual a Terra era o centro do Universo. Consequentemente admitia a teoria copernicana e a realidade de que a Terra é mais um dos infinitos planetas que rolam entre infinitas estrelas no infinito Universo.
Apesar dessa vida inquieta, de perseguição e de fugas, formulou, 19 anos antes de Galileu, o princípio de inércia. Elaborou uma cosmologia, em que fala da Alma do Universo, “presente em toda a natureza”, e admitiu que ambos, Alma e Universo, são eternos e infinitos. Ainda sobre o Universo, afirmava que está em permanente movimento e transformação. “Com essas ideias, Bruno haveria de influenciar a filosofia posterior”, observa um estudioso, “mas causou, na época, sérios problemas para si.”
Para Bruno, Cristo não era mediador entre o ser humano e Deus, como ensina a Igreja. “Essa suposta mediação de Cristo”, dizia ele, “é uma impostura, e a religião católica é falsa e socialmente nociva, sendo urgente sua reforma no plano civil e político, nos quais as religiões devem operar como instrumento de moralização.”
Após sua morte seus contemporâneos silenciaram completamente, chegando ao extremo de remover o nome de Frei Giordano dos registros da Ordem de São Domingos e das universidades e academias em que tinha ensinado. Suas ideias extravagantes para a época influenciaram o Iluminismo, movimento europeu que lutou pela liberdade, principalmente religiosa. Assim operou uma verdadeira revolução desconstruindo a imagem tradicional do mundo e da realidade física, desconsiderando o cosmo medieval que daria lugar a uma “ciência nova”.
Acusado de heresia e perseguido pela Inquisição, Bruno pôs-se em fuga pela Europa e acabaria sendo contratado como professor de mnemônica por um nobre chamado Giovanni Mocenigo. Mudou-se então para a casa do “nobre aluno”, em Veneza. Mas o “nobre aluno”, que, na verdade, era um falso amigo, o denunciou ao tribunal da Santa Inquisição.
Após sessões de torturas e prisão durante sete anos, Giordano Bruno teve de voltar a depor num tribunal da Inquisição. Para surpresa sua, foi-lhe proposto pelos inquisidores que, se aceitasse negar suas ideias e opiniões contrárias ou ofensivas à fé católica, ficaria livre da pena de morte. No entanto, o que Giordano Bruno fez, de pronto, foi se negar a aceitar a proposta dos inquisidores. Em consequência disso, seria proferida contra ele, pelo papa Clemente VIII, a inclemente sentença decretando sua morte na fogueira, em praça pública.
Em fiel cumprimento da sentença de sua morte, Giordano Bruno foi executado em 17 de fevereiro de 1600 no Campo de Fiori, uma praça pública de Roma.
Obras de Giordano Bruno: A Sombra das Ideias; A Causa, o Princípio e o Uno; Acerca do Infinito Universo e Mundos; Expulsão da Besta Triunfante; Os Heroicos Furores; Sobre o Tríplice Mínimo e a Tríplice Medida; A Mônada, o Número e a Figura; Sobre o Inumerável, Imenso e Não Configurável.