Embora muitas das características da criatividade mencionadas nessa reflexão descrevam seu alcance e a importância de seu desenvolvimento, a ênfase específica recai na criatividade responsável e direcionada ao bem-estar humano.
Procuramos acentuar a relação entre a criatividade e a espiritualidade, a fim de que o leitor que busca o aprimoramento de seu caráter identifique na primeira a alegria em aprender cada vez mais e sinta a necessidade de um maior e mais profundo conhecimento dessa poderosa dimensão humana.
Há que reconhecer que a criatividade, ou seja, a disposição de criar, existe potencialmente em todos os seres humanos, independentemente de sua idade ou condição social, sendo, portanto, inerente a sua natureza.
Muitos defendem que, para que a criatividade se manifeste em plenitude, há dependência de um meio sociocultural estruturado e de condições favoráveis, na medida em que os preconceitos, as desigualdades e as pressões econômicas constituem impeditivos a sua realização. De fato, sem liberdade e sem estímulo, o processo criativo se ressente consideravelmente. Contudo, a experiência demonstra que, mesmo nos ambientes menos favoráveis, onde a dignidade pessoal é desconsiderada e o ser humano oprimido, surgem demonstrações de criatividade tão originais quanto expressivas. Daí resulta o entendimento de que, apesar das condições materiais adversas, a criatividade e o gênio inventivo sobressaem como realidades espirituais.
No que diz respeito à criatividade, é certo que não se deve limitar seu significado às expressões artísticas, que são, sem dúvida, de grande importância e valor, mas que não a traduzem em sua globalidade e inteireza, visto que ela, em alguns casos, transcende aos apelos psicológicos da arte, da emoção e do apurado gosto estético, alcançando outras formas de conhecimento. Como exemplo, mencionamos que a criatividade realçada no empenho de quem procura ajudar a coletividade por meio de sua capacidade inventiva, seja em um laboratório ou em uma oficina, não possui uma figuração simplificada, mas representa uma lição de heroísmo que, embora não ficcional, afirma e prestigia uma realidade do espírito.
Todas as iniciativas que promovem o aperfeiçoamento moral e ético do ser humano são de cunho espiritual, e tenha-se presente que tais movimentos inspiram e desenvolvem a criatividade nas pessoas responsáveis e conscientes de seus deveres, isto é, aquelas que têm consciência de que se encontram inseridas no dinamismo do mundo e de que devem contribuir, com seus talentos e potencialidades, para a melhoria da qualidade de vida de toda a comunidade. A criatividade requer diálogo e boa vontade; que ninguém presuma ser possível desenvolvê-la sem contemplar esses aspectos.
Não nos parece recomendável falar de criatividade sem falar de arte, importantíssima dimensão do espírito humano – como, aliás, já o dissemos. Em contraponto às vigorosas concentrações de poder econômico, de preconceitos de toda ordem e de intolerância injustificada, facilmente vericáveis na contemporaneidade, surgem as manifestações artísticas e culturais, que são, na realidade, instrumentos de equilíbrio, intercâmbio e aproximação entre pessoas de diferentes países, uma vez que estimulam e difundem a criatividade para o enfrentamento da realidade, facilitando o avanço da solidariedade e a superação das desigualdades.
Cumpre ressaltar que o artista não atinge seus objetivos ao se afastar da disciplina, da dedicação, do profissionalismo, do respeito ao ser humano e da dedicação ao estudo. A pessoa que pretende desenvolver sua criatividade não pode romper com esses valores. Daí resulta o entendimento de que arte, criatividade e espiritualidade são realidades conexas, como nos enfatiza o Racionalismo Cristão.
Há na atualidade uma grande procura por oficinas de arte, escrita criativa, artesanato, entre outras. Muitas dessas instituições são dirigidas por profissionais respeitados, que sempre buscam despertar a sensibilidade para a música, a pintura, a escultura, a literatura, oferecendo subsídios e técnicas para que o iniciante exercite sua criatividade e a desenvolva de acordo com seus talentos. Contudo, nunca é demais ressaltar que se tornar músico, pintor, escultor ou escritor não é algo fácil, tampouco simples; o sucesso nessas atividades criativas requer o casamento com a ordem, a leitura, a coragem e o gosto pelo trabalho. A fruição estética, semelhantemente ao sentido poético, não é um dom ou privilégio, mas está relacionada ao estudo e à admiração criteriosa.
O autêntico artista, indivíduo criativo por excelência, não é apenas uma pessoa original ou inspirada, mas uma pessoa dedicada e aberta à compreensão de que a criatividade e a arte, para além das manifestações opulentas e luxuosas, se exteriorizam na simplicidade dos atos cotidianos, no diálogo, na franqueza e mesmo no silêncio de uma profunda reflexão. Interioridade e criatividade, liberdade e criatividade, espiritualidade e criatividade… onde termina uma e começa a outra? Boa pergunta.
De fato, a formação de uma personalidade capaz de enriquecer a existência exige o desenvolvimento da inteligência, do conhecimento do mundo e das pessoas, do autodomínio e da disposição sincera em promover o bem comum, mas também da inventividade.
Para ser criativo, é necessário empreender uma luta com dois adversários: a preguiça e o comodismo. Aqui emerge um aspecto curioso da criatividade: como ultrapassar sem a coragem os condicionalismos e as imposições? Como superar a indiferença e a desatenção à realidade à volta?
Criar é um ato de aperfeiçoamento interior, por meio do qual a pessoa passa conhecer melhor a si mesma e a seus recursos. O conhecimento que um ser humano pode ter de si mesmo é muito maior do que aquele que uma outra pessoa pode ter a respeito dele. Conquanto o conhecimento de outrem procede de uma quantidade limitada de observações, o conhecimento próprio se fundamenta em uma experiência constante, que tende a ser dilatada à medida que cada um desenvolve sua criatividade.
Para cuidar de si mesmo e de sua família com bom senso e valor, integrando harmonicamente os aspectos físico, mental, social e espiritual, o ser humano necessita de criatividade para elaborar sua própria filosofia de vida, seu modus vivendi, partindo de valores transcendentes. Assim, conseguirá com êxito desenvolver não somente a capacidade de criar, mas sobretudo o próprio caráter.
Muito Obrigado!