O principal propósito desta reflexão é fornecer subsídios para que o estudioso do Racionalismo Cristão desenvolva uma visão mais ampliada do tema, fundada tanto na importância do desenvolvimento de hábitos sadios e no consequente aprimoramento da própria personalidade quanto no valor da atitude, exteriorizada em gestos probos, honestos e íntegros. Dessa maneira, será possível conciliar as demandas da vida prática com os elevados preceitos da espiritualidade.
O cultivo e a constância da conduta ética obtém-se por meio da absorção dos valores da espiritualidade. Quando o ser humano contempla a vida em seu aspecto mais amplo e pratica o bem, cumprindo os compromissos assumidos com fidelidade e diligência e, tendo se excedido em algo, logo afasta de si os impulsos contrários a seu desenvolvimento, retomando o domínio de si mesmo e aprendendo as lições com os eventuais reveses que experimenta. É mister que o ser humano reconheça que deve canalizar suas energias e seus talentos para o desenvolvimento de suas faculdades morais, visto que é através delas que terá uma melhor compreensão da realidade que o cerca.
A ética é, inegavelmente, um valor, mas também pode ser considerada um dever moral, tanto na defesa da dignidade humana quanto na promoção do respeito às diferenças e da solidariedade. Precisamente nesse ponto repousa seu fundamento espiritual, metafísico. A ética se constrói no desenrolar da história buscando sempre a promoção de valores substancialmente transcendentes, que só se podem realizar quando os seres humanos se libertam das amarras da materialidade e do egoísmo. Em todas as épocas, povos e culturas têm-se enaltecido a sinceridade, a honestidade, a coragem e a sabedoria – valores perenes, como sói ser a espiritualidade.
“Ética” e “moral” são conceitos que, à luz da espiritualidade difundida pelo Racionalismo Cristão, se confundem e se complementam. Assim, a conduta ético-moral não diz respeito somente ao cumprimento dos compromissos materiais, a seguir irrefletidamente um feixe de regras ditadas pelas leis e normas ou pelos formalismos prescritos pelas circunstâncias. Sendo um instrumento eficaz de cooperação e intercâmbio entre comunidades, sua exteriorização deve ser espontânea e desinteressada, harmônica e integradora.
Uma sociedade ética e justa só pode ser alcançada com o respeito às diferenças. Para a pessoa que tem senso ético e procura pautar nele suas ações, seu posicionamento respeitoso ante as diferenças não é considerado um impositivo politicamente correto ou um estilo de vida a ser seguido, e sim um fundamento e um estímulo para o aperfeiçoamento próprio. Somente quando o ser se abre para a diversidade é que pode reconhecer a si mesmo. É na diferença que surge a compreensão da identidade própria; aliás, é nesse momento de autoconsciência que a pessoas sai de seu universo egoístico para adentrar no campo do diálogo e da fraternidade.
É preciso reconhecer que ao estendermos a mão a nosso semelhante num gesto de afetividade e respeito, estima e consideração, além de estar concorrendo para a construção de um humanismo sadio e autêntico, também gozaremos de indescritível bem-estar. Felizes seremos ao agir com solicitude e benquerer, ética e consideração em relação às pessoas com que tivermos a oportunidade de conviver, em virtude da serenidade que espontaneamente preencherá nossa mente.
Aqueles que adotam a ética como um dos princípios norteadores da vida dão ao mundo uma poderosa demonstração de respeito à humanidade, inspirando outras pessoas a agir da mesma forma, ao mesmo tempo que bloqueiam em si os impulsos egoísticos que impedem a construção de sua própria felicidade. Efetivamente, não basta reconhecer a importância do auxílio; é preciso um passo a mais. É necessário estender a mão a quem necessita de apoio, isto é, ter atitudes que se traduzam objetivamente na conduta, em consonância com padrões éticos e de elevada moral, que se revelam na disposição de pôr-se no lugar do outro a fim de compreendê-lo e auxiliá-lo, sem jamais o julgar ou constranger.
Todas as iniciativas da pessoa espiritualizada, consciente de seu valor e de suas responsabilidades, que pauta sua vida nos sublimes preceitos da ética, estão impregnadas de benquerer e amor ao próximo; todas as suas obras estão marcadas de uma notável dignidade. Com paciência e tolerância, a pessoa ética é capaz de suscitar no meio em que transita sentimentos de enlevo e admiração. Além disso, sua atitude moral e a linha aprumada de seu caráter a tornam contrária a todo exibicionismo artificial, próprio, aliás, do materialismo antiético e obscurantista.
O ser humano é tão profundamente afetado pelas ideias com que se afina, pelos sentimentos que nutre, pelas emoções com que se apraz, que esse conjunto abstrato, cuja mola propulsora é o pensamento, deve ser considerado como um dos fatores que conferem à vida os traços que a distinguem. É efetivamente pelo pensamento que a pessoa estabelece os parâmetros que, no campo de suas interações, a tornam ética ou não. Há que se compreender o seguinte: para que as atitudes sejam nobres e elevadas, os pensamentos que as antecedem também o devem ser. Isso é de grande relevância.
Quanto mais o ser humano se dedicar à ampliação de suas qualidades e faculdades e ao desenvolvimento de seus atributos morais, tanto melhor saberá agir diante dos casos concretos que a vida proporciona a todo instante, pois suas atitudes espelharão os conteúdos retos ditados por sua consciência. A reflexão atenta, comedida e ativa que é alimentada pela seiva intuitiva do pensamento ético e vigoroso proporciona uma célere e acertada tomada de decisões, sendo o veículo privilegiado do discernimento e da prudência.
As análises suscitadas nesta reflexão nos levam a concluir que uma parte considerável da crise por que passa a sociedade atual, bem como seus desdobramentos, sobretudo em termos de relacionamentos, dá-se pela inobservância de uma premissa básica: a ética deve ser entendida enquanto capacidade de abertura a uma exigência absoluta de respeito ao ser humano, integralmente considerado. Assim sendo, o esclarecimento espiritual que nos proporciona o Racionalismo Cristão é capaz de transformar a mentalidade egoísta tão presente na contemporaneidade, e como instrumento eficaz nesse caminho de ampliação de horizontes destacamos novamente a ética. Ela permite o reconhecimento da interconexão e, mais do que isso, da interdependência entre os seres humanos, de modo que a partir dessa constatação podemos revalorizar o convívio respeitoso e fraterno, que é, por sua vez, o sustentáculo de uma paz verdadeira e sustentável.
Muito Obrigado!