A felicidade, segundo Aristóteles

(Em honra das mulheres, antes de tudo um aviso: quando o filósofo usa aqui o termo “homem”, está referindo-se ao ser humano. Portanto, às mulheres também.)

 

“O homem nasce com um único fim – ser feliz”, afirma Aristóteles. Mas em que consiste a felicidade? É o estado agradável de espírito decorrente de um viver virtuoso, do exercício habitual de boas obras. Essencialmente, consiste nisso, sustenta ele.

Contudo, outros requisitos, “de ordem secundária”, também concorrem para completar a felicidade do homem. Por exemplo, “ser dotado de certo número de bens” – boa origem, boa aparência, boa sorte, bons amigos, “uma dose suficiente de harmonia” e uma vida longa e com saúde.

Mas essas condições de “segunda ordem”, que também podem concorrer para a felicidade do ser humano têm, na verdade, mais valia para o cidadão comum. A um homem de maior nobreza de espírito, é possível ser feliz mesmo numa vida breve e enfrentando pobreza e outras situações adversas. Ou seja, ele “pode ser feliz renunciando à própria felicidade”.

Nenhum indivíduo que trilha o “difícil caminho” da virtude pode ser chamado infeliz, porque “jamais fará algo odioso ou mesquinho”, pois, de fato, reafirma o mestre, a felicidade é consequência de um viver virtuoso.

 

O que é a virtude.No entanto, se a felicidade é um estado de alma decorrente da virtude, o que é então a virtude? – indaga, socraticamente, Aristóteles.

O vocábulo grego para virtude é “arete”, termo que deriva de “Ares”, que, na antiguidade grega, era o deus da guerra. Por sua vez, nosso termo “virtude” procede da palavra latina “virtus”, que significa “qualidade de varão”, “varonil”, “viril”. De sorte que, para os antigos gregos e romanos, virtuoso era aquele que possuísse, principalmente (além de competência técnica e bom QI), coragem física.

No entanto, a essas três qualidades do virtuoso antigo acrescenta Aristóteles uma quarta – a nobreza moral, ou excelência moral, como ele também a chama. Essa “excelência completa”, ou seja, a posse dessas quatro qualidades, é arma valiosa para o “guerreiro feliz” de Aristóteles nas batalhas da vida.

 

O cavalheiro aristotélico. Uma pessoa virtuosa e, portanto, feliz, diz o filósofo, adota sempre o “meio racional” de vida, isto é, a regra áurea do meio termo. Em outras palavras, nada faz de menos ou de mais, não sendo, pois, nem supernormal nem subnormal, e sim “justa e sabiamente normal”. “Age nos momentos certos, em relação aos objetos certos e às pessoas certas, com o motivo certo e da maneira certa.”

Assim, temos aí a real descrição do cavalheiro aristotélico, o homem ideal, digno de ser feliz. Esse homem ideal “não se expõe desnecessariamente ao perigo, mas está preparado, por ocasião das grandes crises, para dar a própria vida, se preciso for”.

 

Sinal de superioridade. O cavalheiro aristotélico sente prazer em fazer favores, mas envergonha-se de recebê-los. Pois, se, por um lado, fazer obséquios é sinal de superioridade, por outro, recebê-los é indício de inferioridade.

Para o homem ideal, uma boa ação não é um ato de autossacrifício, e sim de autopreservação, posto que o ser humano não é uma criatura individual, mas uma criatura social. Além do mais, qualquer boa ação “é sempre um rendoso emprego de capital”. O bem que hoje fazemos há de ser, com certeza, retribuído, com juros, mais cedo ou mais tarde.

O cavalheiro aristotélico, é, portanto, um espírito altruísta. Assim é, acentua Aristóteles, porque é sábio, virtuoso e feliz. Enumerar aqui seus atributos demandaria muito espaço e tempo. Assinalem-se, porém, alguns: não fala mal de ninguém, nem mesmo dos inimigos, “a não ser que o faça diretamente a eles”; não guarda nunca rancor e sempre esquece as injúrias; “em suma, é um bom amigo para os outros, porque é o melhor amigo de si mesmo”.