A Amazônia é uma floresta tropical da América do Sul, a maior do mundo. Com aproximadamente 7,8 milhões de quilômetros quadrados, abrange nove países: Brasil, com 64% da floresta, Peru, Colômbia, Bolívia, Venezuela, Equador, França (Guiana Francesa), Guiana e Suriname. Concentra cerca de 10% da biodiversidade do planeta e pelo menos 15% da água potável disponível no mundo.
Por muitos anos, a Amazônia foi erroneamente apelidada de “pulmões do mundo”. Sabe-se que, na verdade, nossa grande fonte de oxigênio é a fotossíntese processada pelos fitoplânctons presentes nos oceanos. O ecossistema amazônico regula o regime de chuvas no continente, especialmente no Brasil, e afeta o clima mundial: a floresta é um grande absorvedor de CO2, um dos gases causadores das mudanças climáticas no mundo. Existe, portanto, um justificado interesse de diversos setores da sociedade em manter e conservar a floresta amazônica.
A implementação de políticas de ocupação e desenvolvimento econômico iniciados em 1964-1985 iniciou um período de enormes desafios para a sobrevivência da floresta e dos povos ligados a ela.
O principal projeto dos militares foi a implantação da rodovia transamazônica, em conjunto com hidrelétricas e a distribuição de 14 milhões de hectares sob critérios ainda hoje duvidosos. O resultado da ocupação desordenada se sentiu de imediato: as disputas de terras com indígenas se intensificaram. O número de grileiros (assentamentos em terras públicas criminosamente legalizados) se multiplicou com vista grossa dos governos e até mesmo com o seu franco incentivo e proteção.
Quando se fala de ditadura civil-militar no Brasil, em geral são lembrados os cerca 430 opositores do regime que perderam a vida, esquecendo-se que o processo de ocupação amazônica com incentivo do Estado foi responsável pela perda de cerca de 8400 vidas indígenas (adultos e crianças) de diversas tribos, seja em conflitos diretos, seja em decorrência de contágio proposital de doenças. Não é por acaso que a Constituição brasileira pós-ditadura reserva grandes áreas de terra para tribos indígenas: não apenas para preservar a floresta, mas também a vida dessas tribos contra o extermínio.
É urgente repensar um modelo econômico para a Amazônia que integre pequenos agricultores, extrativistas e os povos da floresta com a natureza. O modelo de grande latifúndio e de intensa extração de minério é incompatível com as necessidades da floresta e do planeta, mas nada disso é novidade. Um dos grandes defensores dessas ideias foi Chico Mendes (1944-1988), que se tornou um dos ambientalistas mais famosos do mundo. Nascido e criado na floresta amazônica, foi assassinado por defender seus ideais.
Nas últimas décadas, o Estado brasileiro criou diversos mecanismos de controle do desmatamento, conseguindo respeito internacional, mas ainda precisa prestar contas do seu pequeno holocausto amazônico dos anos de ditadura. Paradoxalmente, hoje o governo volta a discutir as mesmas estratégias de outrora para o desenvolvimento econômico da região.
Muito antes de ser eleito presidente da República, Jair Bolsonaro já prometia avanço zero na demarcação de terras indígenas, prevista na Constituição. Apesar de declarar, em sua posse, que obedeceria a Constituição, está seguindo estritamente o que havia prometido antes.
Diversas atitudes sinalizam seu projeto para o meio ambiente. Primeiro, com a nomeação de um ministro do meio ambiente condenado na justiça por fraude em um plano de manejo ambiental no estado de São Paulo. O presidente, através desse ministro, extinguiu a Secretaria de Mudanças Climáticas e Florestas e criou regras que enfraquecem a fiscalização de crimes ambientais, como a necessidade imposta ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) de avisar previamente os locais de fiscalização e criar um órgão regulatório com poder de revisar e anular multas ambientais.
Em julho de 2019, os resultados já estavam aparentes. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), uma das instituições científicas brasileiras mais respeitadas no mundo, divulgou dados que davam conta do aumento de 88% nas queimadas florestais. Bolsonaro acusou o Inpe de mentir sobre os dados. Ricardo Galvão, então diretor do Inpe, defendeu publicamente a instituição das acusações e foi exonerado. Com o inegável aumento das queimadas ao longo dos meses, o presidente passou a acusar sem provas e genericamente ONGs. Com a pressão internacional, medidas de proteção finalmente voltaram a ser adotadas, ao menos parcialmente, mas o recado já havia sido entendido. Hoje, o número de assassinatos de indígenas cresce de forma muito preocupante. Não há medidas para proteger essas populações e suas terras, ações que deveriam envolver até mesmo o Exército. Ao contrário, o Estado brasileiro parece trabalhar majoritariamente em detrimento dessas populações, com louváveis exceções.
A preservação da floresta amazônica é atravessada também por interesses econômicos externos. Agricultores franceses e norte-americanos se preocupam com uma possível competição com a agropecuária brasileira, com produtos mais baratos, que não levam em conta o custo real do desmatamento. Para eles, a defesa da floresta cai como uma luva na defesa dos seus próprios interesses comerciais. Entretanto, não é possível afirmar que a defesa do meio ambiente é indigna por essa congruência de agendas. O mundo será cada vez mais afetado pelas mudanças climáticas num futuro não muito distante e é premente encontrar soluções inteligentes para criação de riqueza associada à preservação ambiental.
A revista Nature, uma das publicações científicas mais respeitadas do mundo, escolheu Ricardo Galvão, o ex-diretor exonerado do Inpe, como um dos dez cientistas de maior destaque em 2019. O Brasil está carente de referências, mas não é porque elas não existam. Ao que parece, há momentos que nos tornamos cegos a elas. 2020 guarda um grande desafio que é o de desmitificar as fontes de notícias falsas que tomou a internet, instaladas às vezes no próprio governo. Neste ano, que saibamos separar o joio do trigo, sem idolatrias nem demonizações, e realmente dar valor ao que tem valor.