Como fazer bom uso do livre-arbítrio?

O tema desta reflexão tem um propósito mais abrangente do que, simplesmente, o de relembrar os limites e as consequências das escolhas cotidianas. É importante ir além, identificar a motivação de cada uma delas, compreendendo o autoconhecimento como uma possibilidade de entender o porquê das reações e comportamentos, e não como o simples ato de comparar defeitos e qualidades. 

Por que tantas pessoas fazem mau uso de sua capacidade de escolha? Procuraremos responder a essa questão e também analisar a crise contemporânea como uma real possibilidade de crescimento espiritual. 

A busca da felicidade é para o ser humano uma vocação e uma necessidade, fato ao qual não se pode subtrair em tempo algum da vida. À medida que amadurece espiritualmente, o ser humano passa a entender que a autêntica felicidade exprime uma consciência leve, realizada e plena, proporcionada pelo cumprimento dos compromissos e deveres. Nessa trajetória, o uso que fará de seu livre-arbítrio assume excepcional importância. 

Falar sobre oportunidades de engrandecimento da vida aos homens e mulheres da sociedade atual significa convidá-los a meditar sobre as faculdades espirituais que todos possuem, das quais a mais importante é, sem dúvida, o livre-arbítrio. Ora, essas potencialidades impelem-nos a viver buscando o desenvolvimento e estão na base de todo o dinamismo existencial. Na verdade, só possuiremos uma vida harmônica na medida em que expandirmos e realizarmos em nós essa vocação espiritual de aprimoramento e religação com a espiritualidade, orienta-nos o Racionalismo Cristão. Eis a razão pela qual é importantíssima a atitude de tirar grandes lições de erros ou quaisquer experiências passadas, das corriqueiras às extraordinárias, das felizes às menos felizes. Assim, ampliaremos de forma consistente o raciocínio, a inteligência, a sensibilidade e os demais atributos do espírito. 

A verdadeira esperança de que oportunidades melhores surgirão desde que nos esforcemos em criá-las e a convicção de que gestos e compromissos do cotidiano, por menores que possam parecer, promovem a valorização da vida são faróis que iluminam nossos passos e representam o sustentáculo da tranquilidade e da estabilidade emocional. 

Ao buscar superar os desafios que a todo instante a vida lhe apresenta, o ser humano está, naturalmente, suscetível a cometer erros e falhas. É preciso considerar, entretanto, que tudo isso faz parte de um processo e que melhores resultados serão alcançados sempre que houver disposição em aprender com os insucessos, sejam eles pequenos ou grandes. Dessa forma, os erros e equívocos – que todos cometem em maior ou menor grau – revelam incontestavelmente uma oportunidade de aprimoramento e revisão de paradigmas.  

Por que tantos seres fazem mau uso de sua capacidade de escolha? Ora, porque não submetem seus impulsos e desejos, temores e angústias ao império da razão. Esta é a causa. A exaltação, amigos, controla e domina o ser humano em todas as suas más ações, de modo que estas se tornam más precisamente por isto. 

A liberdade de ação e de movimento consiste no exercício livre da vontade. No entanto, a autêntica liberdade, espiritualmente considerada, só emerge nos espíritos moderados, e mesmo nestes ela só é possível se há disciplina dos pensamentos e ordenação das ideias, as quais evitam o arroubo das emoções inadequadas e conduzem a virtude da moderação, alicerce das boas escolhas.  

O ser humano esclarecido compreende perfeitamente que viver bem é fazer boas escolhas, e essa lúcida consciência impõe-lhe um compromisso constante com a prática do bem.  

A chave para a avaliação do valor contido nos gestos comuns e correntes tendo por foco o desenvolvimento da própria personalidade não é um enigma a ser descoberto, nem um conhecimento que possa ser adquirido exclusivamente por meio do estudo teórico. Ela está, antes, na disposição prática e concreta em reconhecer a importância dos detalhes, dos sinais, em agir abnegadamente, em apreciar com sinceridade os atos praticados. 

Importa aceitar as circunstâncias desagradáveis, as contrariedades e obstáculos, absorvendo sempre as lições ali contidas com a vontade férrea de tornar-se uma pessoa melhor, mais humana, mais preocupada com o bem-estar de seus semelhantes e, sobretudo, com o bom uso que faz de seu livre-arbítrio. 

Prestem atenção, amigos: está fora de questão que a característica mais marcante da pessoa que toma consciência das lições por trás dos fatos menos felizes é sua capacidade de abandonar antigos hábitos, desbravar novos caminhos e engrandecer espiritualmente sua própria existência.  

Como estamos tratando de livre-arbítrio, é oportuno que destacar que os erros cometidos pelos seres humanos – por mais contraditória que esta análise possa parecer – provém da mais nobre de suas faculdades: a liberdade, a virtude de ser livre. A liberdade de que somos dotados e que nos distingue dos demais seres permite-nos exercer nossa capacidade de escolha, e esta é inseparável da possibilidade de errar. Com certeza, o ser humano pode escolher bem ou mal; caso uma das possibilidades deixe de existir, cessa igualmente a liberdade. Quando o ser humano aprende com o erro, tende a acertar cada vez mais e, à medida que acerta, sente-se cada vez mais livre e feliz. 

A angústia, a dificuldade de pôr em prática os propósitos acalentados e a aridez emocional que muitas pessoas infelizmente vivenciam têm por fundamento o orgulho, a autocompaixão e a incapacidade de perceber nos gestos mais simples oportunidades autênticas de aprimoramento da personalidade. Aproveitemos o presente momento histórico para eliminar de nossos hábitos o vírus da materialidade, que permite o desenvolvimento das mais diversas enfermidades espirituais, tais como a preguiça, a maledicência, o egoísmo, a desonestidade e a raiva. 

O entendimento acerca da necessidade de empregar bem o livre-arbítrio é condição fundamental para a edificação de uma vida produtiva e feliz. A apreciação criteriosa dos problemas e das situações diárias diante da tomada de decisões permitirão tornar compreensível os inúmeros erros, bem como o dissipar de diversas ilusões e fantasias. 

A partir de um sério empenho de reflexão, todos estarão em condições de olhar para os desacertos cometidos com os óculos da espiritualidade fornecidos pelo Racionalismo Cristão, que ensejam uma visão ampliada, sincera e consistente a ser traduzida em ação concreta e efetiva, através de escolhas bem-feitas e acertadas. Dessa forma, aquele que se abre para a espiritualidade ilumina sua razão. Sabemos que uma vida saudável e produtiva é a que decorre da liberdade consciente, capaz de compreender que o livre-arbítrio não é, por si mesmo, nem bom nem mau, mas uma faculdade do espírito. Suas consequências repercutirão sempre a qualidade dos pensamentos e sentimentos que animaram seu uso. Assim, buscando conhecer-se cada vez mais, opondo-se a tudo que impede o crescimento moral e concentrando sua ação na prática do bem, todos estarão fazendo o melhor uso de suas capacidades de escolha.  

Muito Obrigado!