Impõe-se grande cautela ao tratar de uma questão tão complexa e delicada como a do respeito ao ser humano. Em sentido mais amplo, o respeito representa o ato de voltar o olhar para algo ou alguém e nos permitir percebê-lo como um sentimento que se dirige a algo ou a alguém que merece um olhar atento, que seja digno de apreço, de consideração, de deferência.
À luz de uma concepção abrangente e consciente apoiada em valores ético-morais, procuraremos aqui estabelecer um referencial seguro para as reflexões acerca da importância do respeito e do diálogo, que é o principal fundamento das relações humanas.
Há no ser humano uma propensão natural à transcendência. O elemento transcendente não se manifesta apenas nas expressões religiosas ou filosóficas, mas também no tocante à cultura e à realidade social, quando o ser humano, utilizando-se de ponderação, assume um comportamento reflexivo e respeitoso perante as situações humanas.
A ponderação a que nos referimos é fundamental, visto que, uma vez negligenciada, os valores da liberdade e da espontaneidade excluem-se reciprocamente. Porém, quando ponderadas racionalmente, as preocupações e tensões porventura existentes tendem a reduzir-se, possibilitando o livre desenvolvimento da personalidade e a sustentabilidade das relações afetivas.
Uma sociedade justa só pode ser alcançada com o respeito às diferenças. Para a pessoa honesta e esclarecida espiritualmente, seu posicionamento respeitoso ante as diferenças não é considerado um estilo de vida, e sim um fundamento e um estímulo para o aperfeiçoamento próprio e daqueles com que convive.
Somente quando o ser humano se abre para a diversidade é que pode reconhecer a si próprio. É na diferença que surge a compreensão da identidade própria; aliás, é nesse momento de autoconsciência que a pessoa sai de seu universo egoístico para adentrar no campo do diálogo e do convívio fraterno.
O quadro sintético que acabamos de traçar ficaria incompleto sem referência aos valores racionalistas cristãos, que legitimam toda e qualquer abertura desinteressada ao próximo, com o único intuito de auxiliar e acolher.
O termo “respeito” tem assumido contemporaneamente um caráter polivalente. Pode significar a atitude educada, atenciosa, reverente em relação a uma pessoa ou a grupo de pessoas; trata-se, portanto, de um respeito de matriz comportamental. Mas também há o respeito que se dirige a uma cultura, a uma nação ou a uma etnia. Em verdade, esses dois aspectos não existem separados nem jamais existirão contrapostos, porque o respeito, analisado à luz da espiritualidade, é sempre integral. Não se trata de uma qualidade para ser usada em momentos específicos, e sim de maneira globalizante, mormente quando se trata do gênero humano.
O respeito autêntico é acima de tudo diferente da atitude artificial, protocolar, estudada, relacionada a boas maneiras ou coisa semelhante, comum no meio social, que clama por reconhecimento e visibilidade, quando não é estritamente interesseira e falsa. O respeito espiritualmente considerado representa, antes, a certeza do valor do ser humano, da dignidade de sua essência; fundamenta-se em princípios que transcendem às imposições e às tensões sociais. Para fazê-lo crescer em si, o ser humano deve cultivar-lhe as raízes, que se encontram em sua própria estrutura espiritual, na forma de faculdades e atributos. Ao desenvolver a capacidade de escuta, a empatia, a inteligência, a consciência de si mesmo, enfim, o autodomínio, o ser humano não permite que a noção de respeito próprio e coletivo se atrofie por falta de estímulo ou se degenere em aparências de consideração e apreço.
No que diz respeito ao exercício do respeito, há três linhas de ação que indicam contextos cada vez mais amplos e que devem ser meditados com especial atenção pelo estudioso da espiritualidade proposta pelo Racionalismo Cristão. O primeiro contexto, mais estrito, é a interioridade do ser humano e de sua consciência; nele, ocupa papel de destaque o respeito próprio, sem o qual a alteridade fica seriamente comprometida. O contexto seguinte é o da ação na comunidade; nele, dão-se as relações intersubjetivas, que só se podem realizar plenamente com o concurso do respeito e da tolerância mútuos. Por fim, o contexto mais amplo é o do respeito por todos os seres.
Em praticamente todas as esferas de ação em que se deve exercer o respeito, há um elemento estruturante que, devido a sua imensa significação, deve ser destacado: o diálogo. Este representa a substância que sustenta todas as relações dignas e é a solução para considerável parte dos problemas humanos.
A ampla interação dos seres humanos permite que eles se complementem e cresçam coletivamente. A participação de tantas vozes exprime verdadeiramente a harmônica sinfonia da espiritualidade.
Buscando desenvolver a compreensão sincera dos dramas vivenciados por nossos semelhantes com um olhar empático, todos poderemos dar um passo significativo para que, coletivamente, não experimentemos situações supressoras; para que, unidos e esclarecidos acerca da importância do respeito mútuo, possamos construir uma cultura de interação e solidariedade.
A noção de colaboração está diretamente associada à ideia de que todos as pessoas possuem capacidade de receber novos conhecimentos, produzindo, a partir destes, outros conhecimentos que, por seu turno, irão contribuir para o enriquecimento da sociedade e para a ampliação dos atributos espirituais latentes de todas as envolvidas. Nesse processo colaborativo, livre de preconceitos e distinções fúteis, há um esforço de confiança e a abertura do ser humano para novas possibilidades, circunstância na qual as influências globalizadas que penetram a vida cotidiana por todos os meios podem ser mais bem administradas, retendo a pessoa unicamente os conteúdos que respeitam e elevam a dignidade humana.
Uma vez que o futuro se constitui de elementos especulativos, dedutivos e abstratos e que este tende a se estabelecer de acordo com ações realizadas no presente, devemos cada vez mais concentrar nossa atenção nos fatos concretos que fazem parte do aqui e do agora, e não canalizar nossas energias para expectativas e cogitações. Respeitemo-nos uns aos outros desde já; dos mais simples atos até as mais importantes decisões não nos esqueçamos de tratar os outros da mesma maneira que pretendemos ser tratados.
A percepção dos valores que realmente produzem bem-estar e tranquilidade, como o respeito e a tolerância, assim como o desenvolvimento da confiança em nós mesmos e nos processos que regulam a vida com vistas a seu aperfeiçoamento e plenitude, retira-nos de um estado paralisante de alerta que nos impede de entrar em contato com nós mesmos, de forma a rever posicionamentos e ajustar comportamentos.
A certeza de que existe uma realidade espiritual que tudo sustenta e interpenetra imprime um relevante impulso ao compromisso de cada ser com sua própria felicidade e com a construção de um mundo melhor, mais fraterno e solidário, em que possamos perceber cada vez mais a magnitude do respeito e, por conseguinte, olhar nossos semelhantes como uma extensão de nós mesmos, e não como concorrentes ou algozes, como nos ensina o Racionalismo Cristão.
As sociedades modernas estão fundamentadas em complexos processos organizacionais que não nos cabe aqui mencionar, mas cuja nota principal é a rapidez das transformações. O ritmo acelerado passou a ser uma característica tão normal da vida, que a grande maioria das pessoas não se dá conta de sua relevância na estruturação de suas próprias personalidades. Uma sociedade que não tem tempo para o intercâmbio de ideias, para uma conversa amena e respeitosa, enfim, que não valoriza o diálogo tende a adoecer, a desequilibrar-se psiquicamente.
Há duas maneiras de esvaziar realmente o valor do respeito: não acreditar em sua eficácia e presumir desenvolver-se espiritualmente sem ele. Estão aí a indiferença e a presunção. Demonstra-se, pois, a necessidade de mantermos juntas a atenção e a humildade para a consolidação do respeito próprio e do respeito ao próximo.
Muito Obrigado!