Muito ao gosto de muitos, reacende a volúpia do homem em ampliar os horizontes além Terra, supostamente ameaçada por catástrofe ecológica. Há perspectivas de que, em 2050, o planeta estará três graus centígrados mais quente e menos habitável. E de que antes, em 2025, o Sol sofrerá uma pesada tempestade. Apresenta-se 2030 como o ano previsto para a construção das primeiras bases lunares, mas Marte não saiu dos planos, mesmo sendo visto como um possível habitat desconfortável.
Prestígio político-lucrativo move a conquista do espaço cósmico. Os “barões” tomam de assalto esta indústria marco do século XXI, Desde meados de 2000 afluíram uns poucos mais poderosos – Elon Musk e sua Space X, Jeff Bezos, Richard Branson, Paul Allen. Atreladas, pequenas empresas e start-ups. Baseada na ilha de Man, face a Blackpool, na costa inglesa, a Excalibur Almaz é destaque pelo pitoresco. Mesmo se a Grã-Bretanha está em quinto lugar na corrida à Lua, segundo o grupo de experts Ascend, oferece a ilha como “parking” de um montão de empresas engajadas na indústria dos satélites.
Fundada por Christopher Stott, um nativo, a Excalibur dedica-se ao turismo de ricaços aposentados, em viagens à Lua em naves tipo Saliut, adquiridas de segunda mão à então União Soviética. Local privilegiado, tarifa zero.
Disputando a liderança espacial, a China, desde março 2018, tornou pública a ideia de instalar uma base robótica de pesquisa lunar em 2025, precursora de voos tripulados. Também a Rússia avança rumo à Lua, e nisto lidera, com a vantagem de dispor da Estação Espacial Internacional, da qual os demais países dependem para seus voos. Novos projetos surgem, de antigas ideias, como as colônias espaciais dos anos 1970, do físico Gerard K. O’Neill, quando ensinava em Princeton. Seduzida pelas projetadas colônias de dez mil habitantes, em meio a uma paisagem lunar sem poluição e com energia solar, a Nasa encontrou dois artistas para simular a colônia no Arizona. Tornou-se a cúpula selada Biosfera 2, representando diferentes ecossistemas fechados.
Mais recente, em 2015, um programa da Agência Espacial Europeia introduz “Melissa”, sigla em inglês do Sistema Alternativo de Apoio à Vida Microecológica. São comunidades microbianas, como antídoto aos esgotados recursos terrestres, em mescla com as exigências de reciclagem dos dejetos, inclusive humanos. “Melissa” evoca a ecologia da cabina dos anos 1960 e 1970 – um teste sobre a vida humana em habitats fechados.
Há uma certa perseverança, sem certeza, na tese da humanidade à beira de extinção. O exílio seria a saída: embarcar numa arca espacial, em viagem ao desconhecido, em busca de um porto seguro. E, então, tornar-se uma civilização espacial e uma espécie multiplanetária. Mercúrio, Vênus e Lua são tidos como pouco acolhedores para os adeptos da tese. Ocupar Marte encontra advogados em Buzz Adison, o segundo astronauta a andar na Lua; Elon Musk, cuja SpaceX deve viajar ao planeta em 2026, pensa em ali criar colônias, com centenas de seres humanos, que o tornariam habitável. O fascínio por Marte vem de dois marcos. Em 1877, Giovanni Schiaparelli descobriu canais; em 2008, foram detectadas camadas de gelo de água, na região de Vastitas Borealis.
Dotado de tecnologia, será que o ser humano amealha, também, os dons físicos e psíquicos para povoar o espaço? Entram em cena agora as ciências, como a biologia, fisiologia, psicologia. Como gerir estresse, emoções, tolerância a confinamento, ausência de gravidade? Há anos, os laboratórios de psicopatologia e neuropsicologia aprofundam as pesquisas quanto à falta de gravidade e a consciência de cada um. Empregando inclusive a hipnose para “modificar” ou “ampliar” o estado de consciência, “criar” o real. Métodos parapsicológicos constituem outro instrumento de treinamento.
Faz parte da natureza humana o descobrir, desbravar, explorar, construir, destruir, reconstruir, arriscar, competir, guerrear, matar, morrer, salvar-se, enfim. Mas a Terra, que já não mais basta, irá renovar-se – quem sabe com outras espécies menos malditas. E o homem continuará buscando-se a si mesmo e à sua própria renovação.