Continuamos nosso itinerário reflexivo acerca do suicídio, procurando preencher as lacunas deixadas pelas ciências que tradicionalmente se ocupam do estudo dos sentimentos, emoções, distúrbios mentais e comportamentos incomuns. A nosso ver, tais lacunas existem porque essas áreas do conhecimento não levam em conta em seus estudos o elemento que dá origem a todas as manifestações e fenômenos, que é o espírito.
Desprezando o fundamento da vida e dos fenômenos a ele associados, a psiquiatria e a psicologia deixam de prestar imenso contributo no que concerne ao estabelecimento da normalidade psíquica e do equilíbrio emocional dos seres humanos, haja vista que, nada obstante o desenvolvimento de tais setores do conhecimento, é crescente o número de casos de distúrbios emocionais e de suicídios em todo o mundo.
Com essas observações preliminares, de modo algum pretendemos insinuar que o desenvolvimento da ciência tem relação com o aumento exponencial de casos de suicídio. Desejamos, sim, suscitar reflexões e sobretudo enfatizar que estudar os desequilíbrios emocionais sem considerar o espírito, com suas necessidades e seus atributos, constitui, por pior que isto possa soar, perda de tempo e energia.
Superficialismo. Temos nos dedicado ao estudo do suicídio e nos estendido nesse assunto propositadamente, pois entendemos que poucos temas na história do pensamento humano têm sido alvo de tamanho superficialismo como o tema do suicídio. A psicologia e a psiquiatria, como já o dissemos, desconsiderando a essência do ser humano, buscam causas onde só é possível encontrar efeitos. A filosofia, desde a Antiguidade até à Idade Moderna, tem relacionado a questão do suicídio com a moral ou com a ética.
Historicamente, no que se refere ao suicídio, os filósofos exteriorizaram, na grande maioria das vezes, juízos de reprovabilidade, sem, contudo, aprofundar-se na causa do fenômeno. No campo do idealismo alemão, sobressaem as enfáticas críticas de Kant e de Schopenhauer ao suicídio.
Esclarecimento espiritual. Muitos são os argumentos que apontam para as causas do autocídio. Tampouco é menor o número de indicações e propostas, na maioria das vezes bem-intencionadas, que buscam combatê-lo. Contudo, no conjunto de propostas e sugestões de combate ao suicídio, reiteramos que uma emerge como plenamente satisfatória e eficaz: o esclarecimento espiritual.
Não é difícil para o leitor concordar conosco: está claro que o indivíduo consciente da continuidade da vida e da indestrutibilidade de sua essência jamais atenta contra o que é imorredouro e indestrutível; antes, procura contornar racionalmente as situações desagradáveis e transpor os desafios que o frustraram ou que o fazem sofrer. É nessa tecla que continuaremos a bater, pois estamos convictos de que o esclarecimento espiritual é a solução.
Sob tal prisma, torna-se indiscutível o valor da abertura à espiritualidade. Ampliar a percepção da vida e analisá-la sempre pela perspectiva espiritual constitui princípio nuclear e verdadeiro alicerce da vida equilibrada, produtiva e saudável. O esclarecimento espiritual transmite sua influência a todas as atividades humanas, de tal modo que não é possível que coexistam ideias e impulsos sabotadores e suicidas na mente de quem percebe a vida como uma oportunidade de crescimento ético-moral, e não como um fardo ou castigo.
Espírito e matéria. Esclarecer-se espiritualmente significa ampliar o horizonte existencial, alargar a percepção das coisas e do mundo, conhecer-se como uma unidade formada por espírito e matéria e, sobretudo, cultivar a arte de bem pensar. Ao fazê-lo, o ser humano compreende que o pensamento não é algo exterior a si, mas algo que integra sua personalidade e tem relação direta não apenas com sua maneira de ser, mas também com a realidade que se estabelece a sua volta.
A arte de bem pensar – corolário do esclarecimento espiritual e sustentáculo de uma vida produtiva e feliz – é uma sublime e nobre arma contra o suicídio e todas as formas de instabilidade emocional, como nos assevera o Racionalismo Cristão. Voltaremos a falar sobre ela no próximo artigo.