Duas pessoas observando uma determinada realidade a descreverão de formas distintas. Os estudiosos afirmam que somos seres dotados de racionalidade limitada, e nossa visão de mundo é afetada por fatores objetivos e subjetivos, envolvendo preferências e critérios, capacidade limitada de processar informações, do contexto de decisão, e de fatores inconscientes.
Desta forma, a realidade pura e absoluta, definitiva, não existe em nossa capacidade interpretativa. Na dimensão em que vivemos cada um de nós emana a sua realidade, e o somatório das visões como um todo é que permite construir os esboços das realidades comuns, mas não ainda a “definitiva”.
Platão, filósofo e matemático do período clássico da Grécia antiga (428 a.C. – 348 a.C.) foi o primeiro a considerar a realidade sob duas perspectivas, uma imanente e outra transcendente. A realidade imanente é material e sensível enquanto a transcendente é imaterial e suprassensível. Lá se vão mais de 2.400 anos e o estudo sobre essas duas realidades continua sendo uma constante entre os homens e, em virtude da complexidade do tema, não tem previsão de término.
Quando o espírito deixa seu mundo de estágio para encarnar neste planeta-escola, o faz segundo um plano que estabelece sua trajetória de desenvolvimento, na busca pela prática do bem. Uma vez encarnado, esse plano fica gravado em seu corpo fluídico, e pode ser acessado através do processo de autoconhecimento. Quanto mais o espírito se esclarece e entende a sua missão neste plano, que é composto de muito trabalho e estudo, maior é a possibilidade dele se conectar com sua essência.
Por que precisamos estudar? Qual o significado do estudo para as nossas vidas? Estudar consiste na aplicação das capacidades intelectuais que possuímos em prol da aquisição de novos conhecimentos e habilidades. Essa ação exige uso de métodos específicos, sejam eles racionais ou intuitivos, envolvendo a análise, a síntese e a prática da reflexão, para que algo possa ser compreendido. É através do estudo que nos esclarecemos sobre a vida e o que é viver.
Os sinais e rastros deixados pelas civilizações ao longo da história mostram que o homem trilha a jornada do conhecimento desde o seu aparecimento no planeta Terra. De forma empírica os humanos dedicam-se ao conhecimento da natureza, incluindo o conhecimento de si próprio. Esses estudos foram sendo desenvolvidos através do contato do homem com tudo aquilo que o cerca, experiências de vida construídas no exercício da luta pela sobrevivência.
O estudo organizado e desenvolvido por instituições nos moldes da escola que hoje conhecemos surgiu, na Europa, somente a partir do século XII. Uma instituição capaz de reproduzir a cultura vigente, organizar o conhecimento já existente de forma a facilitar a aprendizagem das crianças, jovens e adultos.
Dedico-me aqui a refletir sobre o tema “estudar” para além daquilo que consideremos ser inerente à instituição escola, trazendo para o centro da discussão a ação individual do estudar, o estudar como uma necessidade humana, capaz de proporcionar prazer, felicidade, por meio do enfrentamento que cada ser estabelece com a realidade à qual está submetido, tanto a imanente como a transcendente.
Sob a perspectiva da imanência a realidade para o homem consiste naquilo que tem em si próprio o seu princípio e o seu fim, e está ligada à realidade material, apreendida imediatamente pelos sentidos do corpo. Essa compreensão nos leva à percepção de que a existência não possui fim algum a ser alcançado e não depende de nada exterior. Ou seja, a realidade é o que é determinada por ela mesma e pelas forças que a atravessam, que dizem respeito à confirmação empírica do mundo real e da realidade em geral.
A compreensão do mundo material é importante para a existência e sobrevivência do ser em sua experiência humana no planeta Terra, na busca pelo entendimento das forças e leis que regem a natureza. Desta forma a ciência, como construção humana, dedica-se a desenvolver um corpo de conhecimentos sistematizados e adquiridos via observação, identificação, pesquisa e explicação de determinadas categorias de fenômenos e fatos, e formulados metódica e racionalmente.
Esse manancial de conhecimentos desenvolvido pela ciência, em seus diversos campos de atuação, tem propiciado a melhoria da qualidade de vida das diversas espécies do mundo animal e vegetal, obtida por intermédio da produção de novas teorias, tecnologias, práticas etc.
É preciso, porém, ter a compreensão de que o desenvolvimento humano não se sustenta, apenas com o crescimento do conhecimento sobre o mundo material do qual é parte integrante. Somos constituídos por um composto de Força e Matéria e, desta forma, há que se dedicar, sobretudo, ao estudo da realidade transcendente, imaterial que consiste no desenvolvimento da espiritualidade.
O estudo da espiritualidade baseia-se no princípio da evolução espiritual realizada através de múltiplas vidas, neste planeta-escola, que serve como oficina de aprendizagem e trabalho. O aperfeiçoamento do espírito deve ser a principal preocupação do ser humano em sua trajetória terrena, buscando alcançar um alto nível de integridade, disposto a contribuir para o bem geral com justiça, dignidade e lealdade.
A própria ciência começa a trabalhar de forma inclusiva, agregando em seus estudos aspectos relacionados à realidade transcendente. A medicina, por exemplo, distanciada ao longo da história das questões transcendentes, tem incluindo em seus estudos o que denominamos por “saúde integral”, que envolve a saúde do corpo, da mente e o papel da espiritualidade.
Segundo Débora Amado Scemi, neurocientista e professora associada do Departamento de Neurologia e Neurocirurgia da EPM/Unifesp, as abordagens integrativas e complementares em saúde reúnem concepções diferenciadas da medicina ocidental, com ênfase na integralidade do atendimento em que o corpo, a mente, o espírito e o meio em que vivemos formam uma entidade complexa e não separada: “o indivíduo que se entrega para ser cuidado carrega consigo crenças, valores pessoais, culturais e espirituais, e exige que o profissional que cuida esteja preparado para atuar com essa complexidade”.
Assim posto, o estudo não é apenas uma imposição feita pela sociedade ou meio onde estamos inseridos; é, antes de tudo, uma necessidade, uma obrigação, uma demanda que se movimenta de dentro para fora, é um requisito do espírito do ser encarnado. Funciona como alimento vital para o esclarecimento e ampliação do nível de desenvolvimento espiritual. É por isso que estudar importa. E como!