Nada mais verdadeiro do que a aplicação dessa expressão de Simone de Beauvoir, ativista feminista francesa, para entender o tema imediatismo na vida moderna e lidar com as frustações dele decorrentes. Na verdade, vamos discorrer sobre as dificuldades das pessoas, principalmente as que nasceram na primeira metade do século XX, em se habituarem à problemática do imediatismo, com essa nova e inusitada realidade social, que tem suas raízes no aceleramento das atividades cotidianas. Esse aceleramento está, por sua vez, atrelado ao aparecimento de novas tecnologias.
Vários fatores concorrem para aprofundar o imediatismo na vida das pessoas, entre eles, o despreparo na educação sobre o que é emocional e o materialismo obsedante.
O filósofo e ensaísta sul-coreano Byung-Chul Han (1959 – 62 anos), em seu livro Sociedade do Cansaço, afirma que a sociedade pós-moderna exige muita produtividade das pessoas o que vem causando aumento muito grande dos casos de depressão, atualmente estimados em 300 milhões (cerca de 3,8%) de pessoas no mundo e cerca de 12 milhões (5,8% da população) de casos no Brasil. Isso é 50% maior que a média mundial.
Existe um quadro de 1931 do pintor surrealista espanhol Salvador Dali (1904-1989), A Persistência da Memória, em que ele trata da subjetividade do tempo. O referido quadro, contendo imagens insólitas de relógios, segundo interpretação psicanalítica, representa a temporalidade inconsciente. Ou seja, o genial Dali explora o relativismo temporal que certamente se relaciona à percepção mutável da velocidade dos eventos cotidianos. Estes, por sua vez, estão associados a uma interpretação imediatista do nosso mundo atual. Em consequência dessa situação, sobrevém um crescimento exagerado da sensação de frustração que afeta sobremaneira os males de nossa sociedade atual. Contribui para essa situação o uso indiscriminado das redes sociais associado ao consumismo desenfreado.
Imediatismo / consumismo. Do exposto, é certo constatar a associação biunívoca que existe entre o imediatismo e o consumismo, uma espécie de “modernidade líquida”, no dizer do sociólogo polonês Zygmunt Bauman (1925 – 2017) em seu livro Modernidade líquida que afirma, também, que as “relações sociais e de produção são frágeis e maleáveis”. Para confirmar as ideias desse filósofo constatamos que a produção de bens de consumo tem baixa durabilidade, construídos para serem trocados anualmente e propositalmente alavancados pelas campanhas de marketing com foco na inovação e na aparência. É esse consumismo exagerado que influencia o imediatismo das pessoas no seu “modus vivendi” e nas relações interpessoais.
Fica claro, portanto, que o capitalismo atual, que surgiu após a Guerra Fria entre os Estados Unidos e a União Soviética, possui um viés de durabilidade dos produtos bem menor do que o existente durante a maior parte do século XX. Isso influenciou o comportamento intersubjetivo não duradouro no cotidiano das pessoas, surgindo personalidades mais individualistas e impacientes. Em consequência, as pessoas se colocam em disputa incessante contra o passar do tempo, acreditando que o certo é obter e conseguir consumir tudo o mais rapidamente possível. A duração entre o presente e o passado se encurtou e quase desapareceu, e a duração do tempo entre o presente e o futuro quase não existe mais por tornar-se imediata. As pessoas entendem que essa é a melhor forma de viver no presente imediato, através da realização acelerada de seus desejos. Essa problemática vem trazendo sérios danos à saúde e arruinando as relações interpessoais. Como corrigir essa situação alarmante e danosa? Como atenuar os meios e efeitos que violam a integridade psicológica dos indivíduos, causando a aceleração da ocorrência da depressão e muitas outras doenças psicossomáticas?
Os impactos da cultura do imediatismo aceleraram-se há cerca de duas décadas com a difusão da Internet e da criação das mídias sociais, atualmente tão presentes no nosso dia a dia. Não é fácil sair do círculo imediatista porque seu cotidiano é um verdadeiro caos. Essa cultura midiática nos envolve por inteiro paralisando nossos esforços nesse sentido. Levará décadas para que isso aconteça! Isso acontece porque perdemos a capacidade de raciocinar e usamos demasiadamente nossos desejos em lugar da vontade realizadora. Imitando e seguindo o “rebanho”, caímos nas malhas obsedantes do imediatismo capitalista. Na verdade, a grande maioria das pessoas nunca teve a capacidade de planejar e priorizar suas necessidades para viver com simplicidade, sem ostentação, transformando, assim, seu cotidiano em um verdadeiro caos.
Muitas pessoas desavisadas tomam decisões apressadas, considerando apenas o momento, sem fazerem uma autorreflexão sobre os efeitos e consequências futuras tanto em sua saúde física como financeira, endividando-se até o pescoço, sem condições de saírem das enrascadas em que se meteram. Assim, resultam distorcidos seus pensamentos e sentimentos a respeito da economia, da política, da ecologia e dos relacionamentos afetivos e sociais. Caímos, então, na superficialidade das relações sociais, facilmente desfeitas, tudo para alimentar nosso ritmo acelerado de vida, criando e mantendo o tipo de cultura hoje prevalecente, a do imediatismo.
Crescem as mazelas. Torna-se fácil, após essa longa exposição de fatores, entender os resultados catastróficos com que nos deparamos no mundo atual em que vivemos, com ressonância explícita em quase todos os países. Basta lançar nosso olhar para o que ocorre ao nosso redor para constatarmos o crescimento das maiores mazelas da humanidade em termos de angustia, ansiedade, irritabilidade, estresse, impaciência, intolerância, com as situações que não nos agradam, transtornos psicológicos e tantas outras doenças psicológicas, além dos impactos sociais e ecológicos. Tudo isso enfraquece espiritualmente as pessoas, deixando-as a mercê de espíritos obsessores.
São tantas as frustrações que o cansaço delas decorrente nos turva a razão e nos habituamos a elas. Essa incapacidade de reagir a situações tão danosas para a nossa evolução só pode ser corrigida a médio ou longo prazo. Mas urge começar desde já, pois estamos bastante atrasados. Cumpre aos pais dar partida nesse processo na educação das crianças. Elas sofrem a influência de seus hábitos com muita facilidade e reproduzem os comportamentos do que veem e sentem. Além disso, estão constantemente expostas aos estímulos da mídia televisiva, do incessante marketing viciante e da tecnologia digital.
Finalmente, é preciso despertar hábitos simples e salutares na mente dessas crianças durante todo o tempo e despertá-las para uma visão mais abrangente da vida.