Positividade em meio à crise: perspectivas para um mundo melhor

O título dessa reflexão evidencia uma relação entre causa e consequência. A adoção de uma atitude proativa, diligente e otimista diante de uma realidade convulsionada, desorganizada e crítica enseja, certamente, a abertura a novas e alvissareiras perspectivas.

Alguns poderão presumir que este tema esteja de tal forma explorado, que abordá-lo atualmente significaria transitar, uma vez mais, no assim denominado lugar-comum onde abundam clichês e frases de efeito, próprios, aliás, dos discursos redundantes, tão frequentes na atualidade.

Ora, defendemos a ideia de que no campo da espiritualidade deve imperar o senso amplificador, que permite uma autêntica e sustentável compreensão da vida. Nesse processo, faz-se necessária uma releitura de determinados conceitos, à luz de uma concepção abrangente e compromissada com o desenvolvimento humano.           

No momento em que se analisam as distorções estabelecidas sobre as concepções de positividade e crise, verifica-se, paradoxalmente, que os responsáveis por elas são aqueles que muitas vezes se intitulam portadores de uma mensagem otimista e reveladora. Contudo, suas iniciativas tendem a estabelecer-se ora com um realismo exacerbado e rude, ora com enlevo místico e fantasioso.

Nas mais diversas publicações sobre positividade e crise que superlotam as prateleiras de inúmeras livrarias, a ênfase transferiu-se da questão central para o bem-estar material, ou seja, para o estudo de como é possível melhorar as condições socioeconômicas das pessoas a partir de uma atitude positiva; por outro lado, no estudo sério da espiritualidade, como propõe o Racionalismo Cristão, cuja nota principal é a ampliação dos sentidos, a atenção volta-se para uma vivência ética e elevada.

Sem dúvida, é de absoluta esterilidade pensar no desenvolvimento de uma personalidade positiva com o propósito de auferir benefícios pessoais. Da mesma forma, é inadequado o pensamento de que as crises se estabelecem em moldes punitivos. No que diz respeito à positividade – que em si mesma não representa nada em termos espirituais quando desligada da atitude ética e moral –, bastará notar que ela conhece períodos de maior e menor robustez, com oscilações mais ou menos frequentes, sempre que dissociada da espiritualidade. Isso porque somente por meio do esclarecimento espiritual ela poderá incorporar seu verdadeiro sentido e, por conseguinte, estabelecer-se de modo constante.

Qualquer menção ao papel da positividade em meio à crise para o estabelecimento de novas perspectivas que corroborem na edificação de uma sociedade mais equânime e fraterna é incompleta quando não se evidencia o fato de que toda mudança começa no ser humano. Na perspectiva, o primeiro aspecto a destacar – e seguramente o mais óbvio – é que, partindo da ótica da mudança individual e coletiva como realidades separadas, dificilmente se poderá contemplar a espiritualidade, onde esses dois conceitos estão intrinsicamente relacionados.

O segundo aspecto, e esse representa a coluna vertebral dessa reflexão, é que ser positivo não é título que se deva ostentar por satisfação pessoal. afirmamos que a pessoa positiva age com o olhar voltado para o conjunto, e precisamente neste propósito, garantimos que a positividade melhora o mundo. Agir sem mesquinhez e sem intencionar prestígio é avançar na direção da positividade em sentido amplo.

Sustentamos, enfim, que ser positivo é estar engajado na grande missão de encarar as adversidades e crises como oportunidades de aperfeiçoamento, de praticar o bem de forma constante e independentemente das circunstâncias, de olhar o semelhante como uma extensão de si mesmo, e não como um algoz ou concorrente.

A aparente simplicidade dessa sentença impediu, durante muito tempo, o reconhecimento de seu valor. A separação entre os conteúdos internos, subjetivos e a realidade social é a principal razão por que o ser humano moderno pensa que as consequências da utilização de seu livre-arbítrio não ecoarão também na coletividade.

Esse ilusório distanciamento da atividade individual em relação ao todo foi se consolidando ao longo das últimas décadas, originando uma mentalidade egoísta que se espalhou culturalmente em grande parte do tecido social, cujas deploráveis consequências ressentimos atualmente. A pessoa egoísta, ao pretender sentir-se cada vez mais livre e plena, abstém-se de um pensamento solidário, globalizante, universalista, integrador, mergulhando em uma profunda crise.

A grave crise política por que passa grande parte da humanidade reflete, em certa medida, essa realidade. A eclosão de grandes escândalos expõe um mecanismo sórdido e egoísta, onde um pequeno grupo absorve os recursos que deveriam ser distribuídos entre a coletividade.

Para reverter esse quadro, fazemos uma nova alusão à necessidade premente de esclarecimento espiritual. Entender que o mundo exterior reflete, em última análise, os sentimentos e pensamentos elaborados na subjetividade é condição sine qua non para uma consistente mudança de paradigma, onde positividade e espiritualidade se encontrem em profunda associação.

A atitude que deve caracterizar o ser humano perante as situações de crise é, essencialmente, a positividade. Ademais, as situações difíceis devem conduzir a repensar a vida e a reavaliar seus objetivos e, por isso mesmo, trazem em si a semente da positividade. Se a crise for confundida com punição, castigo, esvazia-se seu significado mais profundo, perde-se sua dimensão de oportunidade. Mas se for enxergada como um momento passível de reversão desde que as pessoas se disponham, individual e coletivamente, a melhorar sua atitude, seus pensamentos e sentimentos, é possível estabelecer com ela uma relação pedagógica e colher magníficos ensinamentos que concorrerão para o seu aperfeiçoamento intelectual e espiritual.

Há uma metáfora que se refere perfeitamente ao âmago da questão: a rocha tem como maior inimigo não a marreta ou qualquer outro instrumento de grande impacto, mas o líquido que se infiltra, lenta e sutilmente, pingo a pingo, através de suas fissuras, até corromper sua densa estrutura. O grande inimigo da evolução individual é o desprezo à luta interior, íntima, cotidiana que todos devem empreender contra tudo que impeça o desenvolvimento das qualidades humanas: o ceticismo, a vaidade, o egoísmo, a mesquinhez e a superficialidade.

A positividade apoiada em sensatez permite que a pessoa tome decisões coerentes e acertadas, que ela desenvolva progressivamente o senso de responsabilidade. Assim sendo, a positividade, além de virtude, converter-se-á em um estilo de vida que exigirá um posicionamento maduro e uma grande responsabilidade para a edificação de um mundo melhor.

Muito Obrigado!