Nosso propósito é fornecer subsídios para que o estudioso da filosofia racionalista cristã desenvolva uma visão mais ampliada acerca do tema espiritualização, fundada tanto na importância da prática de hábitos sadios e no consequente aprimoramento da própria personalidade quanto no valor da atitude, exteriorizada em gestos elevados e íntegros que promovam a espiritualização própria e coletiva, que se tornou imprescindível nos momentos delicados em que vive a humanidade.
Podemos dizer que o ato de promover a própria espiritualização consiste no desenvolvimento consciente dos atributos espirituais e no cultivo das virtudes morais e éticas, o que de maneira indireta, mas consistente, auxilia todo o conjunto humano a avançar rumo a uma realidade libertadora.
Não necessariamente o processo de espiritualização pressupõe o desprezo aos bens materiais, pois estes, de certa forma, são úteis nesse itinerário, desde que considerados como meio e não como fim. Tal compreensão torna-se imprescindível, mormente em nosso tempo, para a organização das prioridades na vida, para a estabilidade da conduta pessoal, enfim, para a construção, pelo ser humano contemporâneo, de um modo de viver alinhado com suas necessidades evolutivas.
O horizonte de atuação da pessoa comprometida com o aprimoramento da personalidade revela-se na ação refletida de abstrair-se das situações impróprias à expansão de suas qualidades e de criar, por meio do bom uso do livre-arbítrio, circunstâncias favoráveis que multipliquem as possibilidades de espiritualização do próprio ser.
A força de vontade concentrada no firme propósito de espiritualização faz com que o ser humano, aparelhado das melhores intuições, raciocine com clareza e retidão e, por conseguinte, se fortaleça para o enfrentamento dos inúmeros desafios com que se depara em sua trajetória. Os hábitos virtuosos e despojados de egoísmo revigoram os ânimos, restauram as forças, iluminam os pensamentos, expõem talentos e unem o ser humano com o transcendente, cuja beleza e elevação o estimulam a buscar cada vez mais a justiça e a solidariedade, a compreensão e a integridade.
Quando o ser humano em atitude de sinceridade interior e desapego da materialidade contempla a vida em seu aspecto mais amplo e pratica o bem desinteressadamente, cumprindo as responsabilidades assumidas com fidelidade e zelo e, tendo se excedido em algo, logo afasta de si os impulsos contrários à ampliação de seu caráter, retomando o domínio de si mesmo e aprendendo as lições inseridas nos eventuais reveses que experimenta, põe-se em condições de dizer que está no caminho certo, que é uma pessoa feliz.
Convém deixar nítido que, no que se refere ao processo de espiritualização, dentro dos moldes aqui expostos, não há espaço para as ideias fantasiosas, pois entendemos que se trata de um caminhar objetivo e consciente que traz à vida um novo sentido. Falar em espiritualização em um tempo marcado pela agitação de sentimentos incompatíveis e de tantas narrativas desencontradas que atrofiam até as mais pujantes inteligências tornou-se um imperativo de ordem moral. Nesse sentido, não nos furtaremos a incentivar a espiritualização do gênero humano, nem a espalhar conceitos que falam à alma e ideias que frutificam na mente de quem as pratica.
Por essa razão, destaca-se a firmeza na prática do bem e no respeito às diferenças que não surge de um raciocínio materializado e mecânico, estreito e vazio, senão da satisfação e da emoção do contato com os valores da espiritualidade difundidos pelo Racionalismo Cristão, que representam, em última análise, critérios seguros de orientação na vida. Uma vez assegurada essa lúcida compreensão, a pessoa que ampliou seu horizonte existencial por meio da vivência cotidiana de princípios elevados percebe que o ritmo e o compasso da vida se assentam em leis que transcendem os mecanismos humanos, sendo a espiritualidade o elemento que as unifica.
Para uma sociedade inclinada a relativizar cada vez mais a experiência da fraternidade e da solidariedade, obscurecendo valores fundamentais e exaltando o ter em detrimento do ser, esta pandemia tem ensinado muito, sobretudo o quanto dependemos uns dos outros e o quanto amadurecemos ao encarar com boa disposição os desafios da vida. Tal verdade deve ser interpretada como fonte de entusiasmo, esperança e renovação interior.
Se nutrirmos o intenso desejo de apoiar-nos na robusta rocha dos princípios racionalistas cristãos do amor ao próximo e da prática constante e desinteressada do bem nos depararemos a cada instante com magníficas oportunidades de desenvolvimento espiritual: agiremos com lisura em relação ao próximo, agradeceremos os favores recebidos, estaremos sempre disponíveis a ajudar quem realmente precisa e jamais nos fecharemos na moldura de nossos interesses, convencidos de que a experiência espiritualista conduz ao verdadeiro encontro com o semelhante e com nós mesmos.
Para que possamos encarar com dignidade a dramaticidade das circunstâncias atuais, é preciso, mais que o balbucio de inconsistentes frases prontas, um incremento de espiritualidade que nos faça desconstruir estereótipos e incluir na vida renovado sentido de esperança.
Portanto, trabalhemos nessa direção, todos juntos, irmanados por um só sentimento, que é o da espiritualização própria e coletiva. Empenhemo-nos em viver sob o influxo das mais sublimes e autênticas aspirações e, assim, fortaleceremos cada vez mais nosso espírito através da prática do bem.