Entre os influxos históricos que propiciaram as mais diversas considerações a respeito da moral, ao lado das teses que surgiram na contemporaneidade, impõe-se a necessidade de nos remetermos à perspectiva da Filosofia Clássica, a fim de elaborarmos a nossa reflexão sobre esse tema.
Para Sócrates, a moral se liga à arte do dominar-se, do controlar-se, do governar-se; para esse filósofo, a virtude fundamental é o império sobre si mesmo. Nesse sentido, a moral relaciona-se diretamente com o atributo do autodomínio. Sem dúvida, trata-se de um conceito válido e coerente, mas, para o estudioso do Racionalismo Cristão, incompleto e reduzido.
Como nossos estudos têm por finalidade a expansão de conceitos, a ampliação de pontos de vista, a promoção do conhecimento abrangente e a busca por interpretações mais completas, é necessário que, ao analisarmos a moral à luz da espiritualidade defendida pelo Racionalismo Cristão, invoquemos a solidariedade, uma vez que sua conexão com a moral adquire, na visão filosófico-espiritualista que defendemos, máxima significação e importância.
No campo das análises humanas, abundam acepções, teses e teorias morais, bem como distintos modos de apreender e apresentar a moral; contudo, ao analisar o tema a partir de uma perspectiva transcendente, o ser esclarecido não se limita a compreendê-la como um feixe de regras de caráter abstrato e artificial, tampouco como um código rígido, estático e predeterminado. Sua percepção, ampliada pela vivência espiritualista, indica que a moral é uma exigência para o desenvolvimento da coletividade, que não se impõe ou determina, mas surge naturalmente do anseio coletivo de progresso e aprimoramento das relações entre as pessoas.
Reafirmamos: moral e solidariedade são conceitos que se interpelam, formando uma unidade indissociável. A moral, assim considerada, suscita sentimentos universais de união e fraternidade, ultrapassando, portanto, condicionalismos culturais, censuras descabidas e imposições dogmáticas, ao mesmo tempo que fortalece e unifica seres humanos para a edificação de uma sociedade mais justa e equilibrada, conscientizando-os de que da conjugação de seus esforços resultarão concepções mais estáveis, mais harmônicas e, por conseguinte, mas dignas do ser humano.
Na verdade, a essência da moralidade ou da atitude ética consiste na fidelidade e no dever que o ser humano tem de procurar o autoaperfeiçoamento de forma progressiva e dentro de um estilo de vida que respeite, em primeiro lugar, a si mesmo, mas também a família, as relações de amizade, as diferenças humanas, a natureza, enfim, que assegure igualmente o desenvolvimento de outras pessoas, pois o exercício da moral assume seu ápice no respeito aos semelhantes.
A espiritualidade confere ao convívio social uma particular dignidade, que nos permite considerá-lo como um importante veículo que enseja a ampliação de atributos e faculdades espirituais. Com certeza, todo convívio harmônico e sincero, profícuo e exitoso exige a aquiescência a um comportamento lastreado pela moral, que, considerada em si mesma, pode ser definida, sinteticamente, como um dispositivo poderoso, fecundo e inigualável para a prática efetiva, constante e desinteressada do bem. Eis o sentido abrangente e autêntico da moral. É preciso resgatá-lo, a fim de que esta não se reduza a uma ciência normativa da vida em sociedade.
A moral, concebida em seu aspecto genuíno e verdadeiro e analisada a partir de um amplo critério de imparcialidade, não objetiva a realização individual nem se reduz à esfera do interesse egoístico, mas tem por escopo a promoção do gênero humano, fundamentando as interações sadias e respeitosas e estimulando atitudes criativas, questionadoras, éticas, fraternas e dignas nos mais distintos povos e culturas que integram o tecido social. O caráter universal da moral é tão evidente que eminentes filósofos o atestaram ao longo da História. Kant, por exemplo, cuja envergadura é digna de nota, declarava que uma ação coletiva em desfavor da humanidade é sempre imoral.
A visão espiritualista acerca da sexualidade humana comporta um juízo muito positivo; porém, chama vigorosamente a atenção para o senso de responsabilidade que deve imperar nas relações íntimas entre duas pessoas. O sexo não deve ser interpretado como um componente que esteja fora do campo da moral, pois é sempre digno e legítimo quando praticado com respeito à liberdade. Tenha-se presente, todavia, que a permissividade dos costumes, que, não raro, enseja a promiscuidade, é sempre imoral, não porque tenha relação direta com a prática sexual, mas porque subtrai dignidade ao ser humano.
A profusão de desafios com que o ser humano se depara ao logo da vida e os ambientes conturbados e hostis com que muitas vezes entra em contato pelas mais variadas razões não devem, de forma alguma, anular o dever moral que cada um tem de agir com lisura, integridade e honestidade. As influências negativas, tão comuns e tão próprias deste planeta, conspiram, por assim dizer, contra o afloramento das qualidades e potencialidades humanas, encobrindo-as com a densa malha da preguiça e da pusilanimidade. Para que a pessoa possa se abstrair dessa influência obscura, é imperioso que ponha em atividade a força de vontade, escoimada de preconceitos, esclarecida pela experiência do bem e sem outros propósitos que não o de viver com ética, simplicidade e humildade. Esses são os pilares da moral, sustentáculos de inúmeras virtudes.
O caráter representa o somatório de virtudes imperecíveis e valores inconfundíveis que o ser humano desenvolve ao longo de sua trajetória, resultado de atitudes temperadas por critérios éticos e morais. É ingênuo o pensamento de que possa haver estabilidade emocional e tranquilidade de consciência quando o ser humano recusa toda e qualquer consideração aos aspectos genuinamente morais que sustentam a vida. A adesão consciente a uma vivência honrada e verdadeira acentua a imperiosa necessidade do cumprimento irrestrito dos compromissos assumidos, bem como da sinceridade, da decência e da empatia no trato com os semelhantes.
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