A abrangência da solidariedade

Uma das expressões mais marcantes atualmente é a forte tendência ao individualismo. Daí resulta, em grande parte, a crise moral que vivenciamos atualmente. Tal situação somente poderá ser contornada quando a humanidade despertar para o real sentido da solidariedade. 

Aqueles que adotam a solidariedade como um dos princípios norteadores de suas vidas dão ao mundo uma poderosa demonstração de respeito aos semelhantes, inspirando outras pessoas a agir da mesma forma, ao mesmo tempo que bloqueiam em si os impulsos egoísticos que impedem a construção de sua própria felicidade.  

A solidariedade não é um mero conceito de valor retórico ou teórico. Ela incide intensamente na vida de cada pessoa, na medida em que é interpretada e assumida como uma atitude moral do mais alto valor. Como nossas reflexões têm por finalidade a expansão dos conceitos, a ampliação de pontos de vista e a promoção do conhecimento abrangente, é necessário que, ao analisarmos a solidariedade, invoquemos a moral, pois a conexão entre elas adquire, na visão racionalista cristã, máxima significação e importância. São conceitos que se interpelam, formando uma unidade indissociável. 

É no campo das relações humanas que a solidariedade mostra seu valor e sua primazia. É por meio de uma experiência de vida acolhedora e solidária que os membros de uma sociedade se elevam e aperfeiçoam suas faculdades e atributos espirituais, transformando-se em protagonistas da própria vida e articuladores de mudanças estruturais que humanizem as regras de mercado e o respeito à dignidade humana. Assim, a presente reflexão pretende destacar que a solidariedade deve ser tida como uma referência na vida de quem decide viver a espiritualidade de forma autêntica e plena, ou seja, para quem o bem comum é uma responsabilidade prioritária e improrrogável.  

Sabemos que a tecnologia permite, hoje em dia, que pessoas que vivem em diferentes ambientes e se encontram afastadas fisicamente teçam entre si relações cada vez mais facilitadas, o que é muito positivo e desejável, sobretudo quando tais ligações têm como fundamento a virtude da solidariedade. Quando indivíduos se associam, por exemplo, com o objetivo de disseminar notícias falsas, maliciosas, que prejudicam a vida dos semelhantes, a união apresenta um caráter contraditório e malfazejo, de que se conclui que a solidariedade é o fundamento que orienta o convívio respeitoso e fraterno. 

A espiritualidade confere à atitude solidária uma particular dignidade, de modo que esta pode ser considerada como uma importante virtude que enseja a ampliação do horizonte existencial. Logo, toda existência harmônica e frutuosa exige a aquiescência a um comportamento lastreado pela solidariedade, que, considerada em si mesma, pode ser definida, sinteticamente, como uma disposição nobre, qualificada, poderosa e responsável para a prática efetiva, constante e desinteressada do bem. Eis o sentido abrangente e autêntico da solidariedade. Faz-se necessário resgatá-lo, a fim de que ela não se reduza a uma atitude de doação e compartilhamento de bens materiais que, muitas vezes, são excedentes e obsoletos. 

As pessoas que trilham a senda da solidariedade se tornam artífices de uma sociedade mais justa e pacífica, fazendo de suas vidas uma fonte de inspiração. A virtude de que tratamos possui um valor excepcional; entretanto, para além de preciosa virtude, a solidariedade representa uma possibilidade, uma escolha, e nesse sentido afirmamos convictamente: ser solidário é a mais sublime e magnânima opção do ser humano, pois de que adianta uma pessoa possuir conhecimentos elevadíssimos se não partilha com aqueles que não os possuem? De que vale desenvolver virtudes importantes se estas não são comunicadas e exercidas? 

O equilíbrio e a liberdade humana, bem como a ascensão dos interesses materiais aos autênticos conteúdos éticos e morais, resultam, do ponto de vista racionalista cristão, da imersão na autêntica solidariedade e de sua vivência cotidiana. Ela oferece o caminho seguro que conduz o ser humano à identificação de sua própria essência e, como consequência, ao reconhecimento do semelhante como uma extensão de si mesmo. Tal é o âmago em torno do qual gravita uma experiência humana digna e enobrecedora. 

O respeito, a promoção da paz, a não violência e a solidariedade que os fundamenta são antídotos do egoísmo e devem inspirar todas as relações humanas pautadas na honestidade, na transparência e na reconciliação, pois são concepções capazes de transformar completamente o ser humano, estando para além das visões reducionistas e separatistas.  

Muito Obrigado!