Como lidar com relações estagnadas, afastando de nossas vidas o que não nos traz melhorias?

No campo de uma reflexão sobre relações estacionárias que pretenda indagar sobre a complexa teia de circunstâncias que lhes dão origem, faz-se necessário recorrer a um olhar despretensioso, sincero, honesto e humilde, enfim, um olhar transcendente, sem o qual a busca por soluções práticas perde significado e efetividade.

Confirma nosso asserto a experiência advinda do estudo da espiritualidade proposta pelo Racionalismo Cristão, que chama a atenção para uma infinidade de fatores que giram em torno dos relacionamentos, pois quando falamos em interação entre pessoas não nos referimos apenas aos fatores externos das personalidades daqueles que constituem os relacionamentos, mas admitimos a existência de determinados valores ou referenciais internos que, por sua persistência e continuidade, assinalam distintas formas de ação.

Procuraremos demonstrar na presente reflexão que na esfera dos relacionamentos, na imensa maioria das vezes, não há caminhos sem saída; o que há são desafios e oportunidades de crescimento e amadurecimento que o ser humano saberá aproveitar desde que se disponha a entender que o sucesso de seus relacionamentos tem relação direta com a qualidade de seus pensamentos, sentimentos e emoções.

Naturalmente, o ser humano desfrutará de muita paz e bem-estar ao afastar de si aquilo que não o eleva e dignifica. Contudo, os fatores que impedem sua felicidade e plenitude não se encontram, no mais das vezes, nas pessoas com as quais ele se relaciona, mas residem dentro dele mesmo. Ao manter-se cativo da vaidade e do amor-próprio, o ser tende a apontar os semelhantes como a razão dos insucessos que vivencia, ignorando ser ele próprio o responsável por tais infortúnios.

A eliminação do impulso de transferência de responsabilidade cria relações sólidas e afetuosas, pois permite que brote espontaneamente a virtude da compreensão. Esta é a essência das relações, o fator que as explica em seu sentido mais profundo.

Os relacionamentos saudáveis se fundamentam na empatia, na honestidade e na humildade, e seus desdobramentos serão tanto mais produtivos quanto maior for o empenho das pessoas envolvidas em corrigir em si mesmas aquilo que muitas vezes – e em vão – tentam corrigir nos demais.

Toda atitude malfazeja ultrapassa o círculo das relações. Não é dissolvendo relacionamentos que sentimentos maus e inadequados deixarão de existir. Estamos interligados, queiramos ou não. Se um órgão do corpo está enfermo, todo o organismo se ressente. Ninguém vive isolado, ninguém vive só para si, ninguém, insistindo no erro, prejudica somente a si próprio.

Essa reflexão permite que o ser humano compreenda que ao evitar enfrentar relacionamentos que se tornaram difíceis e tormentosos não estará resolvendo o problema. Resolvemos questões, amigos, encarando suas causas, cheios de boa vontade e capacidade de renúncia, procurando entender nossa responsabilidade no contexto, abrindo-nos ao diálogo, procurando ouvir mais e falar menos, com a consciência de que aquilo que ainda não corrigimos em nós devemos tolerar em nossos semelhantes. Todo esforço no sentido de dinamizar e revigorar as relações, para ser eficaz e frutuoso, deverá direcionar-se para uma reação enérgica contra o egocentrismo e suas múltiplas formas de manifestação.

Grande passo dá aquele que ama desinteressadamente, aquele que dá sem esperar reconhecimento. Essa disposição sincera e elevada permite que o ser humano se sintonize com seus semelhantes e estabeleça um intercâmbio emocional profundo e significativo. De fato, os relacionamentos existem em todos os níveis para que exercitemos nossas faculdades e ampliemos nossos atributos espirituais.

Não raramente algumas pessoas dizem que já não suportam seus cônjuges ou parceiros, amigos ou colegas, pois eles subverteram as próprias consciências, bloquearam a razão, tornaram-se desanimados, desesperançosos, relapsos ou muito rígidos e inoportunos. Porém, não consideram que essa realidade talvez seja muito propícia para o desenvolvimento de inúmeros aspectos de suas próprias personalidades.

Nessa linha de raciocínio, permitimo-nos perguntar: sem paciência e tolerância, qual será o valor de nossos méritos? Como viver uma experiência de vida fundada na espiritualidade, sem a disposição férrea de tirar bem do mal?

Ao remanchar dos relacionamentos lentos e estagnados deve-se contrapor uma fulgurante dose de afetuosidade e elevação, de compreensão e flexibilidade. Ao agir assim, o ser humano perceberá como essas relações lhe ofertam uma grande oportunidade de evolução e jamais impedem seu crescimento.

Com tudo o que acabamos de refletir nos permite concluir, entre outras coisas, que todos necessitamos uns dos outros. À medida que nos espiritualizamos, vamos adquirindo um senso de unidade, de universalidade, que nos faz sentir responsáveis por nós mesmos e por nossos semelhantes.

Travamos relacionamentos com diversas pessoas em todos os níveis e a todo instante. Se em algum momento uma dessas relações se torna mais íntima e depois de certo período estacionária, perdendo seu dinamismo inicial – porque a outra parte tornou-se sisuda, desordenada e solitária – que fazemos nós? Afastamo-nos desse intercâmbio com um desprazer feroz, quase que com repulsa?

Detenhamo-nos aqui um breve instante para assinalar que quem foge dos relacionamentos estagnados por não estar recebendo os benefícios de uma amizade recíproca demonstra imaturidade, quando não covardia. O olhar espiritualista, que, iluminado pelo amor ao próximo vê mais profundamente porque vê de uma perspectiva cristã e, portanto mais elevada, cabe-nos a dinamizar as relações com o motor da benevolência e a revigorá-las com a seiva do otimismo.

Definitivamente, não podemos desenvolver a tolerância, a paciência, a afeição, a afabilidade, a estima e o benquerer teórica e abstratamente com um mestre, guru, líder espiritual ou coisa que o valha. As virtudes não podem ser adquiridas, estimuladas ou praticadas sem que estabeleçamos relações humanas na prática, no dia a dia.

Nesse caminhar, encontramos muitas pessoas problemáticas, covardes, interesseiras e materialistas, e mesmo quando isso não acontece, outros fatores sobrevêm e algumas relações mostram-se estagnadas e improdutivas. Tanto em um como em outro caso, encontra o ser humano esclarecido pelo Racionalismo Cristão oportunidades de aprofundamento nos valores transcendentes, porque pensa com acerto que as experiências desagradáveis constituem tijolos com os quais ele é capaz de construir sua fortaleza interior.

Muito Obrigado!