Dissolvendo contradições

Apesar da notória evolução científica por que tem passado nosso planeta nos últimos séculos, somada à intensa melhoria das condições sanitárias e alimentares vivenciada por considerável parcela da sociedade, ter contribuído para o aumento da expectativa de vida dos seres humanos, deparamo-nos com estatísticas que apontam o crescimento dos distúrbios emocionais e psíquicos. Não obstante esse progresso científico e tecnológico, aumentam os casos de depressão, síndrome do pânico, ansiedade e outros transtornos congêneres. Por que isso ocorre? No intuito de responder a essa questão elaboramos a presente reflexão. 

Pode-se afirmar – e não é exagero fazê-lo – que os frutos do evidente avanço tecnológico, em vez de favorecer o desenvolvimento integral da pessoa, soem tolher-lhe a sensibilidade e a vocação natural para os valores do espírito.  Se é um fato histórico inegável que as conquistas materiais dos últimos séculos são surpreendentes, também se pode dizer que nem sempre elas vieram acompanhadas de um avanço ético e moral. Isso acontece precisamente pela ausência de um olhar mais integrado e sustentável, que só pode ser fornecido através do prisma da espiritualidade, como nos mostra o Racionalismo Cristão. 

A percepção da distonia entre o progresso exterior e o desenvolvimento ético já era clara no século XVIII. Para se ter uma ideia, Jean-Jacques Rousseau ganhou, em 1750, o prêmio de um concurso de ensaios com seu trabalho “Discurso sobre as ciências e as artes”, no qual defendia que o avanço das ciências e das artes havia corrompido a moral (DENT, 1996, p. 17). 

A resposta à questão levantada em nossa introdução, que se refere à contradição entre os avanços tecnológicos e sanitários e a multiplicidade de transtornos psíquicos que assolam o ser humano contemporâneo, tem relação direta com o conhecimento da realidade espiritual. Com certeza, para que o ser humano possa reagir adequadamente frente às instabilidades da vida moderna e a constante agitação que a caracteriza é condição sine qua non que ele: i) conheça a sua constituição astral e física, ii) entenda a razão de ser de sua existência, iii) saiba pensar com elevação e benevolência. 

A constituição do ser humano, simplificadamente, é tríplice: espírito, corpo fluídico e corpo físico. Essas dimensões não são estanques, mas possuem íntima relação umas com as outras, constituindo uma unidade indissociável – a compreensão deste enunciado é de máxima importância para a manutenção da saúde integral, pois, muitas vezes, os distúrbios psíquicos têm espaço quando uma dessas três dimensões é desprezada ou mesmo quando se pretende artificialmente separá-las, exteriorizando-se um comportamento contraditório aos valores do espírito, como preconiza o Racionalismo Cristão. As ações fundamentadas no entendimento da unidade Força e Matéria (espírito e corpo) produzem uma liberdade de autoexpressão tão significativa que se tornam fonte de saúde e bem-estar. 

A razão de ser da vida humana é o desenvolvimento e o aprimoramento dos atributos espirituais latentes. A vida é uma oportunidade de crescimento espiritual. Tal crescimento se dá quando aperfeiçoamos nossos talentos inatos, conduzindo-os em nosso benefício e, sobretudo, em benefício da coletividade.  

O individualismo, o egoísmo e o desprezo das próprias potencialidades geram desarmonia emocional e desequilíbrio psíquico, independentemente, da pessoa gozar das melhores condições materiais. Em sentido contrário, a expressão de amor constante e desinteressado, a adesão às disciplinas construtivas da vida e a laboriosidade trazem felicidade e paz interior ainda que a pessoa vivencie, do ponto de vista material, circunstâncias menos favoráveis. 

Afora as ideologias e convicções filosófico-religiosas, o bom senso e a racionalidade impõem o entendimento de que com uma conduta honesta e ética evitam-se muitos desgastes físicos e psíquicos e se pavimenta uma estrada que conduz à harmonia interior. Mas, o que fundamenta a boa conduta? Sem dúvida alguma, o pensamento positivo, valoroso, harmonizador e construtivo. A arte de bem pesar é, portanto, o alicerce da saúde, da paz e da felicidade.  

Registre-se que os estudos e abordagens nas áreas das ciências humanas experimentaram, nos últimos anos, um estímulo notadamente multidisciplinar, reconhecendo-se a importância dos aspectos transcendentes na estruturação da subjetividade do ser humano e em sua normalização psíquica. Esse avanço inegavelmente positivo traz a ideia de que é sempre preciso buscar soluções inovadoras e originais para o estabelecimento de resultados concretos. Não discordamos dessa ideia; apenas afirmamos que boa parte das soluções depende, em última análise, do reconhecimento dos princípios racionalistas cristãos enunciados na presente reflexão. 

O progresso material e o aprimoramento espiritual não são de forma alguma inconciliáveis ou opostos. O que é necessário para que o ser humano conquiste uma qualidade de vida que integre e harmonize os aspectos exteriores com suas demandas interiores é, como dissemos, a confluência de três fatores, quais sejam: a autoconsciência, a compreensão de sua missão na vida e o domínio dos pensamentos. O entendimento acerca da própria natureza, a assunção das responsabilidades e a emissão dos pensamentos devem elevar-se do nível superficial e imediato da materialidade ao abrangente campo da espiritualidade. Com certeza, isso se alcança com o uso da razão e com a convicção da realidade transcendente.  

Muito Obrigado!