Dúvidas, certezas e incertezas

O que dizem os dicionaristas sobre dúvida, certeza e incerteza? Sobre dúvida: é um estado de incerteza ou mesmo de hesitação em relação à realidade, ou ainda, um processo de hesitação nas escolhas que tivermos que fazer entre um ou mais fatos ou entre duas ou mais alternativas. Sobre a certeza: é estado de espírito que infunde confiança, acreditar que algo é verdade, é fato. Sobre a incerteza: é um estado de espírito caracterizado pela indecisão, pela dúvida, pela perplexidade e pela irresolução. (Dicionário Informal).

Introdução. René Descartes (1596-1650), nascido próximo de Tours (França), foi um divisor de águas no estudo da ciência por ter dado grande importância ao pensamento e ao raciocínio. Segundo ele, o pensamento e nossa existência seriam um ponto de partida inquestionável, uma certeza a partir da qual ele pôde edificar seu método filosófico-científico, que ficou sendo conhecido como Racionalismo Cartesiano ou simplesmente Racionalismo. Daí provém a famosa máxima cartesiana, o argumento do cogito: “Penso, logo existo”,  em latim, “Ego cogito ergo sum”.

Decorridos cerca de 400 anos, em 1910, Luiz de Mattos criou o Racionalismo Científico Cristão, hoje uma Filosofia para o nosso tempo, com o nome simplificado de Racionalismo Cristão. São de Luiz de Mattos essas palavras sobre o raciocínio, extraídas de uma orientação espiritual dele: “Quem raciocina prevê os acontecimentos, quase que adivinha o que poderá ocorrer, podemos assim dizer, tanto as coisas boas quanto as ruins. Quem raciocina está a par do que deve ou não fazer. Todos têm erros e fraquezas, mas repetir erros e reiterar fraquezas é demonstração de teimosia e, portanto, de falta de raciocínio”.

Dúvidas. Na abertura desse artigo definimos dúvida como sendo um processo de hesitação quando estamos avaliando ou julgando algo dentro da realidade que conhecemos. Nesse contexto, cabe, também, mencionarmos a expressão “sem dúvida”, que ao contrário da dúvida, significa certeza sobre alguma coisa. A expressão “por via das dúvidas” significa que devemos tomar precaução para algo que pode acontecer. Um excesso de dúvidas transforma-se em ceticismo, manifestado por quem tem dúvida de tudo.

A dúvida criada por Descartes é uma dúvida metódica, e é usada no exame de teorias como método racional de investigação e pesquisa. Ela consiste em uma atitude crítica de duvidar de tudo aquilo que é considerado como verdade e investigar sua validade. Essa dúvida é conhecida como dúvida hiperbólica. Para o cientista ou pesquisador, se a dúvida cessar pelo conhecimento experimental estará confirmada a verdade.

Certezas. No planeta-escola Terra não existem certezas absolutas. Precisamos estar sempre alertas para errar menos e acertar mais e não cairmos no ceticismo que é falta de certeza. Precisamos também nos acautelar contra o excesso de entusiasmo ou, ainda, não chegarmos a situações de pânico, que nos coloca num beco sem saída. Devemos, também, tomar cuidado para que algumas de nossas certezas não se tornem teimosia.

Há tantas coisas, em todas as áreas do conhecimento tidas como verdades absolutas que precisaram e foram mudadas ou desfeitas ao longo do tempo. Também as crendices precisam ser reconhecidas e enterradas de vez com pá de cal. Atualmente, fazem-se previsões do tempo com grande acerto em tempo de evitarem-se grandes catástrofes.

Quem tratou do assunto das certezas e incertezas com muita proficiência foi Norberto Bobio (1909-2004) em seu livro Elogio da serenidade, página 199. Ele considera que nenhum problema tem solução permanente, pois não se pode resolver um sem que suscite outro. É dele a expressão “A dimensão dos problemas é tal que a solução de um único deles produz apenas o efeito de uma gota no mar”.

Parece que, no fundo, psicologicamente falando, o que está por trás das incertezas é o medo em busca de segurança que, por sua vez, envolve a crença em certezas.  E a grande maioria das pessoas está hoje com muito medo da pandemia provocada pelo coronavírus ou de uma catástrofe global do mundo, seja devido às condições ambientais, seja devido ao rumo da economia global.

Para concluir este item transcrevemos uma frase de Jung: “Queremos ter certezas e não dúvidas, resultados e não experiências, mas nem mesmo percebemos que as certezas só podem surgir através das dúvidas e os resultados somente através das experiências”.

Incertezas. Segundo Heráclito de Éfeso (500 a. C. – 450 a. C.), filósofo pré-socrático, “nada é permanente, exceto a mudança”. Ou seja, o mundo e nós mesmos mudamos o tempo todo. De fato, é assim que acontece, a mudança é, por vezes, contundente. Nada permanece o mesmo, tudo está em contínua mutação. E, apesar desse conhecimento, continuamos sempre procurando por certezas. É bem conhecida sua expressão “um homem não se banha duas vezes no mesmo rio, pois a cada segundo o rio é outro e o homem também”. Segundo Maria Cottas, “na vida tudo passa!”

Qual a certeza de seus planos para o futuro diante de tantas variáveis? Quem cria cenários para o futuro sabe muito bem que boa parte de seus planos não se realiza, ainda que tenha aplicado muita perseverança e obstinação. Quase sempre as incertezas nos surpreendem com toda a sua força.

Por que será que temos horror às incertezas? O que procuramos? As verdades ou a segurança? Nossa primeira opção é sempre a segurança que está no âmago de todos nós. É o nosso vínculo com a evolução animal e isso é biologicamente hereditário. Estamos sempre à procura de estabilidade, ou seja, terra firme, zona de conforto, um lugar onde a escassez, a incerteza e a vulnerabilidade sejam mínimas. Por que queremos estar na nossa zona de conforto? Porque é o espaço onde acreditamos que tudo está sob o nosso controle. Considere sempre a incerteza com serenidade de ânimo. Faça autorreflexão sobre o que é a vida e aprenda a aceitar aquilo que você não pode mudar.

Conclusão. O mundo perfeito não existe, jamais esteve sob o controle total do ser humano. Precisamos amar a vida como ela é, sem rodeios e sem artifícios, enfrentando as incertezas de nosso cotidiano. Nós é que temos de mudar e nos adaptar às circunstâncias. Temos limites, temos muito menos controle sobre os acontecimentos e até da vida do que imaginamos. Por isso, devemos sempre considerar a incerteza em nossos planos para não nos decepcionarmos quando algo der errado.