Neste artigo vamos tratar da imanência e da transcendência, termos de uso frequente e diferenciado em filosofia, religião e espiritualidade vistos sob estas diferentes óticas. Não é uma tarefa fácil, pois são palavras que chamaram a atenção dos grandes filósofos, religiosos, espíritas e espiritualistas ao longo de todos os tempos.
Introdução. Conceitualmente, a palavra imanência diz respeito a algo que tem em si próprio o seu princípio e seu fim, isto é, não depende de nada mais a não ser de si próprio para existir. De outro lado, a transcendência refere-se a algo que possui um fim externo e superior a si mesmo.
A imanência está ligada à realidade material, apreendida imediatamente pelos sentidos do corpo humano, por isso mesmo tida como realidade sensorial. A transcendência está ligada à realidade imaterial, de uma natureza metafísica, mental e racional, por isso mesmo designada como realidade extrassensorial. Assim, ambos os termos encerram conceitos de amplo espectro na nossa vida material e espiritual.
Dito de outra forma, imanência significa a presença interior de algo ou uma qualidade como parte de um ser ou coisa. Transcendência significa ir além, caráter daquilo que transcende, é exterior e superior à essência de algo. Assim, a transcendência é algo visto fora do mundo.
Ao longo da estrada evolutiva do ser humano o conhecimento da imanência precedeu ao da transcendência. Daí porque a imanência é de ordem material e a transcendência é algo que só o conhecimento sobre a evolução espiritual dos seres humanos pode ser sentida e alcançada em sua plenitude.
O primeiro filósofo a reconhecer a profunda diferença entre o que é uma realidade imanente e uma realidade transcendente foi Platão (428 a.C. – 347 a.C. ). Sabemos que Platão, foi influenciado pelas teorias do filósofo Parmênides sobre o imobilismo, mas discordando de seus princípios fundou e adotou uma teoria própria – a teoria metafísica dualista, que divide o mundo em duas categorias: o mundo sensível e o mundo das ideias e das formas. Dito de outra forma, uma realidade material e sensível e outra realidade imaterial e suprassensível. Desde então, a Filosofia vem examinando esses dois conceitos antagônicos que suscitam a discussão acerca da validade de cada um ou da superioridade de um deles.
Mas, afinal o que é imanência e o que é transcendência? Como viver e conviver de forma séria com esses dois senhores do pensamento filosófico e seus desdobramentos na vida nossa de cada dia, sem nos tornamos escravos da dualidade terrena? Essas são questões que nos cabe examinar e responder. Vamos, então, nos aprofundar um pouco mais nessas questões.
Imanência. Primeiramente, vamos dar uma olhadela sobre o real significado de imanência levando-se em conta a perspectiva dos antigos filósofos – os pré-socráticos, isto é, anteriores à época de Sócrates (469 a.C. – 399 a.C.). Eles estavam preocupados apenas em entender a realidade que estava ao seu entorno e impressionava os sentidos físicos. De acordo com este raciocínio, eles consideravam cada uma das substâncias então conhecidas como essencial na composição de nosso mundo. Sabemos que naquela época quatro eram os elementos conhecidos e para os pré-socráticos tudo era feito a partir desses quatro elementos, que eram terra, água, ar e fogo, todos de natureza imanente. Para eles, tudo na vida apenas se fazia e se desfazia a partir desses quatro elementos substanciais. Daí foi surgindo a ideia de que tudo na vida se transforma, nada escapa, tudo permanece, nada é eterno, enfim, tudo flui. Essa foi a base para, muito mais tarde, o químico francês Antoine-Laurent Lavoisier (1743-1794) enunciar o famoso princípio “Na natureza nada se cria e nada se perde, tudo se transforma”, aplicável ao estudo da Química. Hoje, sabemos que, desde há muito tempo, mudaram os conceitos de substância e elemento e existem inumeráveis substâncias e são 118 os elementos químicos conhecidos. Conclusão: toda a matéria do Universo é de natureza imanente.
Transcendência. Repetimos a pergunta: afinal, o que é transcendência? A transcendência trata daquilo que está além do mundo material e refere-se aos fenômenos que são de natureza metafísica. Portanto, de uma forma geral e ampla, podemos dizer que alcançar a transcendência é estar em contato com o mundo espiritual a partir desse nosso mundo Terra. É a superação dos limites de nossos sentidos físicos pelo pensamento humano.
Do ponto de vista de muitas religiões, inclusive as reconhecidas como cristãs, entende-se que a busca pela transcendência tende a aproximar e relacionar o ser humano com os santos e Deus através da prática de boas ações e da oração. Para essas religiões, de certa forma, a transcendência implica reconhecer que somos seres mortais e que existe um caminho para permanecer no tempo e no espaço que está fora de nós próprios e alcançar a felicidade e a paz eterna quando morrermos.
Do ponto de vista do budismo, sua autoridade maior, o Dalai Lama, considera a transcendência como um processo que serve para impelir o conhecimento humano através da expansão da consciência. Assim, segundo ele, quando sentimos compaixão, gratidão, alegria e respeito pelos outros aumentamos nosso contato com a realidade, transcendemos as preocupações do nosso ego e encontramos significado para nossa existência em algo maior. Treinar a mente é treinar o processo de transcender, cultivamos nossa capacidade de alcançar certa espiritualidade e exercitarmos a alma.
Do ponto de vista da Filosofia Transpessoal, a transcendência está relacionada a uma pulsão psíquica que permite ao ser humano ir além dos estados de consciência restritos ao ego, não dependendo, portanto, de crenças religiosas. Assim, a transcendência deve ser entendida como um estado sutil de consciência que conecta o homem à totalidade das coisas e leis do Universo, permitindo ir além do seu conhecimento terreno. Trata-se de uma verdade psíquica e pessoal, que pelo fato de ser subjetiva não se torna menos importante. São vivências cheias de significados para a pessoa que a consegue atingir e ignorá-las seria desprezar um lado de sua própria personalidade que desempenha papel fundamental no desenvolvimento humano.
Finalmente, mas com toda a nossa ênfase, sob a ótica da espiritualidade, transcendência é o conhecimento da vida espiritual do ser humano e as leis universais que conduzem à evolução do espirito tanto na Terra como nos seus mundos de origem, principalmente no que respeita à lei de causa e efeito, à lei das múltiplas existências e à lei da atração do pensamento. Tomam parte especial no processo da transcendência os atributos e as faculdades do espírito que desencadeiam esses fenômenos, Aqui tem relevância especial a faculdade do livre-arbítrio, que dá ao ser humano o poder de escolha e a responsabilidade por seus atos. Esses são os objetivos dos conhecimentos explanados pela filosofia racionalista cristã desde 1910 em suas obras, nas casas racionalistas cristãs e através das mídias modernas.