Operosidade e aproveitamento

O campo da espiritualidade é o campo da realidade, composto de princípios que nos auxiliam diretamente nas situações concretas da vida, isto é, naquelas que surgem no cotidiano de todas as pessoas. Mediante essa verdade incontestável, consegue o ser humano diminuir consideravelmente o despotismo dos impulsos mais grosseiros, a desordem oriunda dos interesses mesquinhos e o tumulto dos pensamentos inadequados, que o desviam, quase sempre, das disciplinas construtivas da vida para arremessá-lo no terreno da materialidade desinteligente. Nessa perspectiva, cumpre estudarmos atentamente a dimensão espiritual dos conceitos de operosidade e aproveitamento, que devem ser traduzidos em uma existência positivamente dinâmica e capaz de valorizar os frutos desse dinamismo. 

Há que desenvolver a convicção de que valores como a disciplina, a honestidade, a operosidade, a organização, a economia e a parcimônia devem ser ressaltados e constantemente desenvolvidos. Sempre merecem, pois, alusão e exaltação, visto que não é preciso nenhum conhecimento específico, nenhuma formação acadêmica, nenhuma inteligência extraordinária para incorporá-los; basta que se nutra o sincero desejo de ser digno, valoroso, probo e íntegro, pondo em prática a força de vontade latente em todos os seres humanos, quer eles o creiam ou não. 

Ao falar sobre aproveitamento do tempo, não pretendemos ensinar os amigos a confeccionar uma agenda de prioridades ou coisa que o valha. Partimos do princípio de que nossos disciplinados estudiosos são mestres nesse assunto. Queremos, sim, suscitar a ideia de que devemos estar a todo momento abertos ao aprendizado e de que o melhor sentido de aproveitamento do tempo é a disposição constante de aprender – não para autopromover-nos ou incrementar nossa vaidade, mas para colocar-nos em condições de melhor ajudar nossos semelhantes. 

Ao discorrer sobre operosidade e aproveitamento, devemos admitir como pressuposto de nosso diálogo que, no trato de assuntos que têm por base um recorte espiritualista, destituído de condicionalismos e preconceitos, cabe-nos o papel essencial e indeclinável de abertura e ampliação do sentido daquilo que nos propomos a estudar. 

O conceito de “aproveitamento” ultrapassa sua significação etimológica mais provável para penetrar no campo do respeito e da reverência que todos devemos a nós mesmos e às gerações que nos antecederam. Ao falar de aproveitamento, referimo-nos à atitude inteligente de absorção dos conteúdos e exemplos profícuos produzidos por nossos ancestrais ou colhidos de nossas experiências pessoais. Tal atitude depende, sem dúvida, de diligência e empenho; logo, a operosidade se faz necessária para que efetivamente absorvamos e pratiquemos os conhecimentos acumulados. 

O olhar racionalista cristão nos oferece um referencial seguro para colher das gerações passadas o que de mais positivo elas nos legaram, sem incidir em atitudes descontextualizadas e antiquadas. Com certeza, é notório que, quando o ser humano rompe abruptamente com a tradição e a cultura, acaba por vivenciar um vazio no qual questões fundamentais passam a ser tratadas com um nível intelectual muito primário, tendendo, no mais das vezes, à superficialidade. 

O campo do pensamento é realmente admirável. Quanto mais o ser humano se conscientiza dessa realidade, ou seja, do valor do pensamento, da autorreflexão, da introspecção, tanto mais saberá aproveitar seu tempo e suas energias. Quantas pessoas chegam à madureza e à velhice sentindo um enorme vazio existencial? Se mais atentamente se tivessem posto a examinar o conteúdo de suas expressões mentais, se tivessem valorizado a dinâmica da atividade mental, absorvendo e aproveitando os conhecimentos proporcionados pela existência, ter-se-iam sentido, em todas as fases da vida, mais realizadas e fortalecidas. A operosidade e o aproveitamento concebidos de maneira ampliada e sem preconceitos dão ensejo a um viver intenso, ativo, saudável e frutífero, em que não há espaço para a angústia, a lamentação e a tristeza. 

A espiritualidade a que nos referimos ao longo desta reflexão não significa evasão da realidade, mas interiorização. É penetrando cada vez mais fundo dentro de nós mesmos que entramos em contato com a autêntica espiritualidade. Quando temos a coragem de reconhecer que a maioria dos insucessos que vivenciamos se dá por conta de nossa incapacidade em aproveitar nossos recursos espirituais, nosso tempo e os exemplos daqueles que nos antecederam, elevamo-nos espiritualmente.  

A vivência da espiritualidade autêntica difundida pelo Racionalismo Cristão permite à inteligência humana a imediata percepção da importância de uma conduta lapidar, da virtude de assimilar e incorporar lições e aprendizados, de empregar o tempo com inteligência e razoabilidade, de cultivar um estilo de vida reflexivo e ao mesmo tempo operoso, otimista e digno. Não nos esqueçamos: essas atitudes minimizam, quando não apagam, a presença e o relevo do sofrimento, do drama e da dor. 

Muito Obrigado!