Resignação e Apatia

Em todos os períodos e lugares, por mais remotos que sejam, o ser humano sempre buscou formas de evitar dores e sofrimentos, desde seu estágio mais rudimentar até seu nível atual de desenvolvimento. Em razão disso, consolidaram-se, em grande parte da sociedade, um pensamento simplista e uma mentalidade materialista, que coincidem em limitar a vida aos aspectos do sofrimento e da dor, como se ela se resumisse a isso. 

Para os simplistas, as exigências de uma vida íntegra e plena com os respectivos desafios que ela implica sufocariam a expressão de beleza, que, a priori, deveria constituir sua base; para os materialistas, por sua vez, as dores subordinadas à própria natureza vital seriam uma realidade totalitária e englobante. O resultado é o mesmo: ambos os grupos desconhecem a profundidade da vida, ignoram seu aspecto mais amplo e desprezam as lições que ela não cessa de oferecer. 

A experiência do ser humano esclarecido espiritualmente através do Racionalismo Cristão ensina-lhe que não existe sofrimento, por mais intenso que seja, que não traga subjacente um importante ensinamento, que em curto, médio ou longo prazo repercutirá em benefício próprio e muitas vezes coletivo, desde que assuma uma postura de resignação, abertura e convicção de que não existem punições ou castigos divinos. A resignação a que nos referimos deve ser potencializada pela confiança, sem a qual perde muito de seu valor e de sua utilidade prática. 

O mal em si mesmo não possui significação alguma; a ordenação do Universo, a beleza incomensurável presente tanto no micro quanto no macrocosmo atesta o bem que permeia todo o dinamismo universal, incitando tudo ao progresso e ao aperfeiçoamento, de onde podemos concluir que o verdadeiro ato de resignar-se exterioriza um gesto de inteligência e amadurecimento espiritual. 

A ausência de resignação e confiança pode levar a pessoa a um estado de indiferença, apatia e até mesmo ceticismo: seus gestos se tornam frios e tímidos, sua fisionomia denota profunda tristeza e a impassibilidade que a domina exterioriza os sentimentos de uma pessoa que não soube reagir positivamente aos desafios da vida, fechando-se em si mesma na inútil tentativa de se preservar. 

Hoje em dia, grande parte da sociedade critica a vida de forma constante e exagerada, o que acaba por fomentar a apatia. Essa crítica deve ser considerada com seriedade, e não simplesmente posta de lado sob a alegação de falta de compreensão. Ela não poderá ser anulada por meio do distanciamento daqueles que já se esclareceram, mas muito pelo contrário: é no intercâmbio fraterno que as tensões características da vida diminuirão e a compreensão dos fenômenos que a envolvem se ampliarão, fortalecendo a resiliência e a resignação. Antes de mais nada, é falta de realismo pensar que a postura desesperançosa por parte daqueles que sofrem ou mesmo a sede de conhecimento no sentido de como ultrapassar essas dores não tenha autenticidade, reduzindo-as, assim, a uma atitude egoísta e infantil. É preciso evitar simplificações. 

Os estudiosos do Racionalismo Cristão devem concentrar sua atenção nos princípios transcendentes que orientam uma vida sã, bem como nos próprios atributos e potencialidades, para que possam superar o medo e a hostilidade tão disseminados na sociedade contemporânea. Harmonia, serenidade, tranquilidade e confiança são, além de sentimentos, estados de espírito ao alcance do ser humano disciplinado, que busca sinceramente o autoaprimoramento; são eles que asseguram a vitória sobre a opressão e a apatia do mundo. 

Sabemos que a liberdade é nosso bem maior, a faculdade que nos distingue sobremaneira dos demais seres. Sejamos, portanto, confiantes e resignados a fim de poder exercer nossa liberdade com plenitude e, acima de tudo, valorizá-la, pois quando nos abstemos de praticá-la por medo ou a desprezamos por apatia, cometemos um ato de violência para com nós mesmos, comprometendo, por conseguinte, nosso equilíbrio psíquico. 

Muito Obrigado!