Prevenir custa caro, mas compensa

Em plena campanha de vacinação, neste abril outonal, lá vem a incerteza. Por que tomar vacina? Por que tão poucas vacinas para tantas doenças? Os benefícios superam possíveis riscos colaterais?

Jornalista da área cientifica, errando por 60 países e suas regiões mais desprovidas, Donald G. McNeil põe o dedo na ferida infectada: dinheiro é o obstáculo maior à fabricação de vacinas. Os cientistas tardam, mas não falham; só precisam de investimentos para pesquisas, tanto caras quanto prolongadas. Não se deixam burlar.

McNeil tem as vacinas em conta da mais engenhosa das invenções, ao lado dos antibióticos, água salubre e sistema de esgotos. Uma invenção bem sucedida. Contudo, 20 milhões de habitantes do planeta Terra, segundo a Organização Mundial de Saúde, ainda esperam a gotinha ou picada milagrosas – talvez porque lhes falte acesso.

De 24 a 30 de abril, a Semana Mundial da Imunização, usando o tema Proteger juntos: vacinas funcionam, tentará, por onde andar, incutir o senso de rotina. A campanha já ganhou alguns pontos. Desde 2010, 113 países usam novas e mais vacinas, em que pese a decepção de múltiplos surtos de sarampo, difteria e outras doenças “vacináveis”, há dois anos. A Semana lembra o quanto já foi erradicado, as conhecidas doenças clássicas, e o quanto ainda falta fazer.

Orin Levine, diretor do setor de distribuição de vacinas da Fundação Bill & Melinda Gates, indaga, em artigo recente: alguém já cogitou viver em mundo sem vacinas? Não mesmo. Sem vacinas, o mundo fica mais vulnerável. Elas têm, como função primordial, erradicar doenças. Todos vacinados em benefício de todos. Mesmo se as doenças voltam e se tornam epidêmicas, gerando pânico. Mas a culpa não é das vacinas. É outro capítulo da longa e dolorosa história das doenças, que recai na indústria farmacêutica, na falta ou mau uso de recursos públicos, na resistência a antibióticos, pelo abuso, nos conflitos e guerras.

Com a Semana, aflora o fantasma Alzheimer – causa de morte que ainda não se previne, menos ainda que se cura. Bastante raro, hoje, quem desconheça totalmente a doença ou não conheça alguém com os sintomas. São 44 milhões de pessoas, em todo o mundo (dados de 2018, segundo New York Times), possivelmente em triplo por volta de 2050, à medida que a população idosa cresce.

Nos Estados Unidos, são décadas de pesquisas, que seus cientistas lideram. A expectativa aumenta, parecem em vias de uma primeira vacina. Como a do dr. Roger Rosenberg, diretor-fundador do Centro de Doença Alzheimer em Dallas, Texas. Desde inícios dos anos 2000, estudos e testes em camundongos, ali, tiveram por fim introduzir anticorpos nas proteínas amiloides que formam as placas no cérebro associadas à doença, para reduzir sua progressão. Mas os testes em seres humanos causaram inflamação cerebral, em 6% dos participantes. Houve um recuo; a busca pela vacina continua, tentando desengatilhar a resposta das células responsáveis pela inflamação.

Também otimista e entusiasmado, o Grupo Tanzi (do dr. Rudy Tanzi, de Harvard) criou o modelo ‘Alzhmeier numa bandeja’: minicérebros formados com células nervosas humanas, germinado em uma bandeja rasa, coberta, a bandeja Petri, nome de um bacteriologista. Permite que a doença seja estudada como nunca antes. A ideia é reduzir a formação das placas, nos estágios primeiros da doença, com uma espécie de vacina “de contenção”.

Se a indústria privada contempla vacinas de maior preço, fundos de grupos terroristas fluem para bioarmas potenciais (antrax, raiva). Para prevenção geral, resta contar com investimento oficial e filantrópico. Crentes, os cientistas torcem para que, se o mundo se comprometer mais, mais vacinas possam surgir. Em Davos 2017, o Foro Mundial criou a Coligação para Inovação Preparatória de Epidemias, alguns bilhões de dólares no papel e 500 milhões iniciais, só a bem das vacinas. Acelerar seu tempo de produção, eis o motto. Os laboratórios e cientistas do presente dão continuidade ao passado, em preceitos, visão, fé, vontade – e amor ao próximo.